Como foi o início da sua carreira de jornalista?
Eu ganhei um concurso literário no colégio Americano Batista e quando o diretor foi me entregar o prêmio, falou que eu tinha muito jeito para ser jornalista. Foi a primeira pessoa que me despertou o interesse pelo jornalismo, mas a minha paixão era pelo esporte, principalmente pelo futebol e foi isso que me levou para o jornalismo. No Jornal do Commercio tinha um vespertino chamado Diário da Noite, que era dedicado aos esportes. Eu corrigi uma estatística errada do Campeonato Pernambucano de Futebol, que tinha mais de vinte erros e mandei uma carta desaforada para o jornal. O editor de esporte, chamado Aramis Trindade, tinha uma crônica diária na resenha esportiva, da Rádio Jornal do Commercio e durante o programa, ele chamou: “O leitor que corrigiu a estatística do campeonato, por favor venha à redação,” mas, eu não fui. Pensei, ele deve estar querendo me devolver os desaforos que eu disse (risos), porém, no dia seguinte, chamou de novo no programa e eu fui. Ele me pediu para ficar fazendo a estatística do Campeonato Pernambucano, até que um dia, o repórter que cobria o Náutico adoeceu e Aramis me pediu para ficar no lugar dele. Na época, não tinha o curso de jornalismo, eu sofri muito pra aprender na prática, a redação foi minha universidade.
Você já cobriu seis Copas do Mundo e duas Olimpíadas, o que mais te marcou na cobertura esportiva?
O que mais me marcou foi acompanhar o Náutico na época do hexacampeonato. Era um time maravilhoso, jogadores extraordinários e um sistema de jogo diferente, eu já vi ganhar do Santos, com Pelé, na Vila Belmiro era um super time.
Ganhei um sorteio para cobrir a minha primeira Copa do Mundo em 1966, no ano que entrei para o Jornal do Commercio. Na Copa do Mundo de 1970, no México, ganhei um concurso de reportagem, também pelo Jornal do Commercio. Foram catorze dias de treino de manhã e de tarde em Guanajuato, nesse período, Zagalo formou talvez a melhor seleção brasileira de todos os tempos. Tive oportunidade de acompanhar tudo, naquela época não tinha treino secreto, eu tinha acesso à concentração e jogávamos futebol com a comissão técnica. Havia um entrosamento muito grande e isso para um jovem como eu, convivendo com Pelé, Rivelino, Zagallo era uma gratificação e me fez apaixonar ainda mais pelo esporte. Nas Olimpíadas, acompanhei Joaquim Cruz (no atletismo), quando ganhou a medalha de ouro para o Brasil.
Como foi sua experiência na área da publicidade?
Quando o Jornal do Commercio faliu, antes do João Carlos Paes Mendonça comprar, minha filha mais velha tinha apenas três meses de idade e estavam pagando em vale. Então, fui trabalhar numa agência de publicidade que chamava Abaeté Propaganda, com o Seu Queiroz, que atualmente é a Ampla. Fiquei lá por um tempo, como eu cobria o Banorte, o banco acertou com a agência de publicidade para eu ir trabalhar como gerente de marketing no Banorte. Eles investiram em mim, fiz curso de especialização em marketing e fiquei ainda dois anos como gerente de marketing do sistema financeiro Banorte, foi quando veio o convite da Globo e deixei o banco. Estava num cargo muito bom, mas a minha vocação era o jornalismo, tanto que fui ganhar em salário na Globo, a metade do que ganhava como gerente no banco, mas eu achava que tendo oportunidade na Globo, conseguiria vencer nessa profissão.
Suas imagens mergulhando junto aos tubarões são impressionantes, como é a sua relação com o mar?
Comecei a mergulhar com Dr. Nelson Caldas, otorrino, que mergulhava em naufrágios. Ele localizou o Trafalgar, um naufrágio com uns canhões de bronze, ligou para o Jornal do Commercio e falou comigo para fazer a reportagem. Comecei a mergulhar assim, por acaso, fazendo reportagens. Eu fazia caça submarina, mas depois achei que era uma covardia ficar atirando nos peixes lá embaixo e passei a ser um defensor da natureza. Jacques Cousteau (cineasta e oceanógrafo francês) fez uma relação dos dez principais pontos de mergulho do mundo, já fui aos dez, onde tinha um lugar bom de mergulho, eu dava um jeito de ir. Mergulhei muito com tubarões, já fui procurar os tubarões que atacam aqui (no litoral de Pernambuco). Eu fui pras Bahamas, na época estava proibido levar mergulhadores pra área que fica ao lado do abismo das Bahamas, porque os tubarões dali tinham matado um turista alemão e o governo proibiu o mergulho naquele local, mas a Globo conseguiu uma autorização pra fazer a reportagem. Então eu e o cinegrafista que foi comigo assinamos um termo de responsabilidade pela própria vida. Você tem que ficar preparado, não deixar o tubarão vir por trás, eles vieram cinco vezes pra cima de mim, na quinta vez quando ele abriu a boca eu filmei dentro da boca do bicho e tem vídeo pra comprovar.
Qual trabalho você considera o mais marcante de toda sua carreira?
O que mais me marcou foi a seca, quando comecei na Globo eu era repórter esportivo. Fui o primeiro apresentador do Globo Esporte em Pernambuco e com o tempo, passei a fazer reportagens gerais. Nessa época só entrava no Jornal Nacional repórter do Rio, São Paulo e Brasília, fui o primeiro a entrar fora dessas três praças. Eu entrei em 1976 e em 1978 começou a grande seca que durou até 1982. Morriam as pessoas, os animais e morriam principalmente as crianças desnutridas. O Nordeste era recordista mundial de mortalidade infantil, não havia assistência médica no Sertão, só Ouricuri, Salgueiro, Serra Talhada e Petrolina tinham hospitais, era muito difícil pra população, aquilo me emocionava demais. A BR 232 nem era asfaltada, o governo não ia lá, depois inventaram carro pipa pra ganhar voto e eu denunciei tudo isso: o voto do carro pipa, o voto de cabresto, compra de voto, entrei na fila pra comprar votos em Salgueiro, então eu fazia todas essas reportagens do interior.
Como se sentiu sendo finalista do prêmio Emmy Internacional em 2013?
Eu estava na primeira fila do teatro Lincoln Center, em Nova Iorque e me senti como se estivesse no Oscar, foi muito marcante pra mim. A matéria foi sobre a cultura dos índios Enawenês Nawês, que passam sete meses do ano fazendo rituais e oferendas para o espírito do mal não castigarem eles. Eu morei trinta e dois dias dentro da selva, convivendo com eles e fomos muito bem recebidos, o filho do cacique era meu intérprete e falava português. Teve um acidente com a filha do cacique, um galho de uma árvore caiu na cabeça da menina e ela ficou em coma por dois dias. Eles fazendo dança e pajelança ao lado dela, tinha um funcionário da Funai com um barco para levar a menina pro hospital, mas eles não deixavam, então eu tomei a iniciativa de falar com o cacique e o filho traduzindo, que a filha dele ia morrer, se não fosse para um hospital e ele deixou. No dia seguinte, o filho dele me acordou de madrugada e me levou para falar com o cacique que estava bravo porque o hospital não tratava da menina, ele disse que branco não gostava de índio. A realidade é que só tinha uma ginecologista e um clínico geral e ela precisava de um neurologista. Eu liguei para o Secretário de Saúde de Mato Grosso e disse que ele precisava mandar um avião com neurologista a bordo para tratar da menina já no avião. Ele ficou botando dificuldade, então eu disse: Tenho dois finais para o Globo Repórter; tem a abertura mostrando o drama dessa menina e dois finais para o senhor escolher um. No primeiro, ela foi salva porque o senhor mandou o avião com o neurologista a bordo, foi operada e voltou, o outro é que ela morreu porque o senhor não deu atenção. Ele disse: Vou mandar buscar agora mesmo. O final do Globo Repórter foi a menina tomando banho de rio, ela ficou boa.
Você conhece bem a Amazônia, já dava para antecipar que teríamos os atuais problemas climáticos?
Cobri a Amazônia durante quase vinte anos, eu era o repórter da Amazônia, tinha sala na TV Amazonas, em Manaus. Fiz os grandes rios da Amazônia, percorri todas as estradas, que são os rios, porque não tem estrada pela selva, então eu fiz o Rio Negro, Solimões, Tapajós, fiz o rio Amazonas desde a nascente na Cordilheira dos Andes e tive muito contato com indígenas. Nessa época, não havia ainda o avanço da agricultura e a coisa mais maléfica que existe é o garimpo. Denunciei várias vezes o garimpo ilegal na terra dos Ianomâmis, que se repetiu no governo passado e a Sônia Bridi fez um trabalho extraordinário, para o Fantástico. Naquela época não havia tanto desmatamento, se você andar hoje pelo município de Santarém, no Pará, vai ver que é tudo plantio de soja, sementes. Eu voltei ao Jalapão dezenove anos depois e quase não reconheci, porque onde havia cerrado tinha se transformado em plantio de eucalipto, soja, avançaram demais com fazendas de gado, tem muitos casos também de grilagem de terra e a gente está vendo as consequências agora.
Como estão os projetos profissionais atualmente?
Sai da Globo depois de 46 anos, aliás todos saíram, eu fui um dos últimos a sair, depois que estava demitido, ainda me deram oportunidade para fazer um Globo Repórter e escolhi fazer o Atol das Rocas e Fernando de Noronha e fui curtir a vida, mas começaram a surgir as propostas. No Jornal do Commercio, na CBN, TV Tribuna, surgiram boas oportunidades, mas não era isso que eu queria. Eu trabalho para uma agência chamada Caséfala, de Regina Casé e ela me manda para o Brasil inteiro fazendo palestras, então eu conto as minhas histórias e é isso que quero fazer. Mais recentemente fiz uma série de seis documentários para a Petrobrás “Um Brasil de Energia”, sobre transições energéticas.
Você decidiu comemorar seus 80 anos, com um mergulho na Corveta Ipiranga, naufragada em Noronha, como foi essa comemoração?
Eu decidi que ia comemorar os 80 anos do meu jeito, fazendo um dos mergulhos mais radicais do país, em Fernando de Noronha. Fui pra ilha no dia 29 de abril, dois dias antes do meu aniversário, com um grupo grande de amigos e família, mas só quem foi comigo pro barco de mergulho foi a minha filha, Mariane Brito, que é jornalista e mora na Espanha, porque o mergulho é um pouco afastado da ilha e se não tiver experiência de barco termina enjoando. Ela me filmou pulando na água, lá embaixo fui até o fundo e botei o computador na areia pra mostrar que estava a 62 metros de profundidade, tudo registrado pela minha amiga fotógrafa, Zaira Matheus e pelo cinegrafista que sempre viaja comigo, Fábio Borges. Fiz o mergulho pra mandar uma mensagem para os velhinhos, que como eu, chegaram aos 80 anos de idade: Isso não significa o fim da vida, reaja, lute, procure continuar vivendo, a vida é bela, você tem que aproveitar o seu tempo com a família e com os amigos. (O vídeo do mergulho está no insta @chicojosedebrito).
Leia menos