É de pai para filho, diz uma canção de Luiz Gonzaga que virou tema de uma superprodução cinematográfica. O contexto é artístico e musical, mas bem que poderia retratar costumes. No Sertão que me criei — e Gonzagão também retrata em suas canções — os costumes eram uma das fontes mais fortes da moral. Eram mais poderosos que as leis.
Fui criado no costume, por exemplo, de pedir a benção aos meus pais, avós, tias e padrinhos. Acordar ou dormir sem levantar as mãos em direção aos meus pais para pedir a benção era imperdoável, inconcebível. Li que a tradição da benção surgiu com Abraão no início da caminhada do povo de Deus. O Senhor pediu a Abraão que abençoasse o seu povo.
Católica fervorosa, mamãe Margarida dizia que quando pedimos benção aos pais, Deus dá a oportunidade de estar bem próximo dele. Quando a gente — são nove filhos — ia dormir no casarão de Afogados da Ingazeira sem pedir a benção, ela chegava de mansinho no quarto e dizia: “Vocês não têm vergonha de dormir sem pedir a benção? Levantem-se e vão pedir a benção ao pai!”
Leia maisPara os que têm fé, e mamãe era uma mulher abençoada, a benção abre um olhar espiritual sobre a realidade. Fui criado com o dogma de que pedir a benção aos pais e às pessoas idosas é muito mais valioso do que pedir algo material.
Com o tempo, compreendi que a benção vinda dos pais é a própria graça de Deus sobre seus filhos. Arraigada nesta cultura, criada no Sertão como eu, minha Nayla nunca perdeu o costume de pedir a benção. Até hoje quando fala com os pais ou tios, até mesmo ao telefone, observo que ela nunca deixa de iniciar a conversa pedindo a benção. Acho lindo, me emociono!
Tradição católica, ser abençoado por pais, tios, padrinhos e avós traz harmonia, paz e proteção. Pena que este costume antigo está por um triz. Resiste apenas nos rincões nordestinos, transmitido de geração em geração, uma tradição valorosa. A benção dos pais é um sinal de graça de Deus sobre os filhos. É uma forma de louvar a Deus e pedir a sua proteção.
Eu me criei — e a minha Nayla também — pedindo a benção ao acordar, antes de dormir, antes de sair de casa, para pedir proteção, para pedir que os filhos tomem decisões sábias e para pedir que os filhos sejam rodeados de pessoas que os incentivem a viver bem. Os tempos mudam, é verdade, mas era tão lindo e harmonioso esse passado saudoso!
Nada melhor do que ter uma família unida e abençoada pelos pais, através da fé em Deus e na sua benção. Sem a benção, o amor sucumbe. Sem amor, uma família acaba acolhendo os piores sentimentos, entre eles a discórdia, a falta de perdão, intrigas, fofocas, maledicências, ou seja, tudo que possa provocar uma desunião entre os familiares.
Amar é a benção das bênçãos. Não é possível amar pouco ou muito. Ou a pessoa ama ou não ama. Quem ama, ama de coração aberto, com a alma transparente e todos os sentidos em plena floração de vida. Hoje, agradeço por ter sido criado num imenso universo que me abençoou muito e me guiou a cada momento.
O que se vê hoje, infelizmente, é irmãos que não falam com irmãos. Filhos afastados, que se esquecem da mãe, que não pedem uma benção. Famílias que brigam como se tudo fosse uma grande concorrência! Isso tudo é muito ruim. A família é sinônimo de refúgio, de lar, de porto seguro, e não de brigas e desavenças.
Tem uma canção de uma dupla sertaneja paulista que fiz questão de compartilhar ao final como lição à nova geração. Dois trechinhos dizem assim:
“Bença pai, bença mãe/ Me conta dos cabelos brancos/ Quando eu saí não eram tantos/ Uô, uô, uô/ Bença pai, bença mãe/ A casa tá tão diferente/ Mas o amor é o de sempre”.
Depois do dom da vida, a família é o maior presente que Deus nos deu.
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