No túnel do tempo

Em 1983, após ser empossado governador de Pernambuco em solenidade na Assembleia Legislativa, Roberto Magalhães chega ao Palácio das Princesas em carro aberto. A foto é do arquivo do próprio Magalhães. Se você tem uma foto histórica no seu baú e deseja vê-la postada neste quadro, envie agora pelo WhatsApp: (81) 9.9994-4888

Mendonça Filho e Miguel Coelho

O ex-governador Mendonça Filho (UB) avisou há pouco que não será candidato ao Senado na chapa liderada pelo pré-candidato a governador, Miguel Coelho (UB). Apesar das especulações de que ele seria o indicado, Mendonça disse que não vai abrir mão da sua decisão de sair candidato a deputado federal pela legenda. As informações são do blog da Folha.

A informação foi dada na entrada do evento que Miguel promove para anunciar sua candidata a vice, a deputada estadual Alessandra Vieira. Sobre o fato de ele poder agregar os votos que tem na Região Metropolitana do Recife, Mendonça afirmou que “respeita as análises, mas meu caminho é deputado federal”, afirmou. Segundo ele, não houve qualquer convite para que ele ocupasse a vaga na majoritária.

Anderson e Gilson

Lideranças políticas e apoiadores das pré-candidaturas de Anderson Ferreira (PL) ao Governo do Estado, e de Gilson Machado Neto (PL) ao Senado Federal, prestigiaram, em Igarassu, na Região Metropolitana, mais uma edição do Simbora Mudar Pernambuco. Ao lado de pré-candidatos à Assembleia Legislativa (Alepe) e Câmara dos Deputados, o ex-prefeito do Jaboatão dos Guararapes e ex-ministro do Turismo ressaltaram o compromisso com valores éticos e princípios como a defesa da liberdade como pilares que têm norteado a pré-campanha.

“Essa eleição vai ser dividida por quem continua a perpetuar práticas da velha política como o festival de promessas e quem demonstra compromisso com a verdade e respeito ao eleitor. A população há muito se cansou desse papo de quem promete o mundo na tentativa de ser eleito sem nenhum tipo de responsabilidade para com a verdade. A nossa pré-candidatura tem base fincada em princípios éticos e que apresenta não falsas promessas, mas, sim, propostas”, disse Anderson durante o ato.

O pré-candidato lembrou que entre as propostas que integram o plano de governo estão três projetos de lei apresentados pela bancada do PL na Alepe para reduzir, em 2023, o valor do IPVA; incluir mais de dois milhões de pernambucanos na tarifa social da água a partir da migração automática dos inscritos no Cadastro Único (CadÚnico) no programa da Compesa; e resgatar a competitividade das empresas com o fim da prorrogação do Fundo Estadual de Equilíbrio Fiscal.

“É dessa forma que nós fazemos política, deixando claro que é possível fazer e como iremos mudar a realidade do nosso estado”, pontuou Anderson Ferreira.

Lula e Alckmin

Em jantar com empresários em São Paulo, o pré-candidato do PT à Presidência, Luiz Inácio Lula da Silva, aproveitou sua fala para reforçar sua proximidade com seu vice, Geraldo Alckmin (PSB). Disse que não existe existe governo Lula – e, sim, Lula-Alckmin.

A aliança com Alckmin tem sido o principal trunfo do PT para argumentar, junto a empresários, centro e mercado que um eventual novo governo de Lula não terá medidas “radicais” na economia.

A reunião aconteceu no apartamento do advogado Sergio Renault na noite de terça-feira (28), no bairro dos Jardins, em São Paulo.
“Aliança não é para ganhar, é para governar”, afirmou Lula, segundo relatos de participantes obtidos pelo blog- dizendo, ainda, que confia na habilidade de Alckmin para repactuar relação com Congresso.

O ex-presidente também disse que se sentia como se estivesse comemorando “bodas” com Geraldo Alckmin, como se fossem amigos há mais de 50 anos, e que “cotoveladas” do passado não comprometeram o respeito que eles têm um pelo outro.

Fontes que estavam no jantar disseram ao blog que ele elogiou o pessebista pelo menos quatro vezes e que ele disse estar mais animado agora para um eventual governo do que em 2003, quando tomou posse pela primeira vez.

Daniella Marques

A nova presidente da Caixa, Daniella Marques, já pediu à diretoria jurídica da Caixa documentos para analisar quais serão as primeiras mudanças que tomará assim que assumir o comando do banco. A prioridade dela será preservar a imagem do banco, assim como buscar fortalecer a governança do órgão.

Marques vai passar pelo comitê de elegibilidade do banco e, só depois, assume o comando da Caixa – o que deve acontecer na semana que vem. Daniella, convidada por Jair Bolsonaro (PL) depois da saída de Pedro Guimarães do cargo, quer revisar a governança da Caixa e, inclusive, já fez as primeiras consultas ao Tribunal de Contas da União (TCU) para que o órgão compartilhe um programa de prevenção de assédio com a Caixa.

A ideia de Marques é montar uma força-tarefa para apurar as denúncias de assédio no banco, como as feitas contra Guimarães e, comprovadas as acusações, fazer uma “limpa” em todos que estiverem envolvidos nos casos.

Segundo integrantes do Palácio do Planalto, foi garantido a Marques “carta branca” para fazer mudanças no banco. Ela chegou ao cargo por indicação de Paulo Guedes, de quem foi sócia no mercado financeiro. Ela é nome de confiança do ministro da Economia – que se fortalece com mais uma indicação para um cargo importante nas últimas semanas. Antes, ele emplacou Caio Paes de Andrade na Petrobras.

No governo, Daniella tem um programa nacional de empreendedorismo feminino com iniciativas em prol das mulheres. Na Caixa, quer se colocar como uma aliada das funcionárias assim que assumir.

Violência doméstica – Nos bastidores, Daniella Marques repete que a “luta da mulher não é de esquerda nem de direita”. Daniella tem um histórico de vítima da violência contra a mulher também.

Em 2019, ela foi alvo de violência doméstica por um ex-companheiro – e entrou na Justiça pedindo medidas protetivas. No entanto, o inquérito foi arquivado pela Justiça e, em 2020, o ex-marido entrou com uma petição sigilosa contra Daniella. O blog da Andreia Sadi procurou a defesa de Daniella, que disse que “hoje, então, Daniella é alvo de um inquérito que investiga fatos do qual foi vítima, renovando a violência contra a mulher”.

Marco Maciel

Capítulo 16

Tão logo tomou posse, forçado pelas circunstâncias dramáticas e que comoveram profundamente o Brasil, a morte de Tancredo Neves, em 21 de abril de 1985, o então vice-presidente José Sarney, transformado no presidente da chamada transição democrática, convocou e escalou Marco Maciel para a missão de cuidar da educação no Brasil.

Desde a juventude, Marco Maciel já era envolvido com a temática educacional. Exerceu grande liderança estudantil. Em 1963, foi eleito presidente da União Metropolitana dos Estudantes de Pernambuco e mais tarde passou a lecionar. Foi Professor de Direito Internacional Público na Universidade Católica de Pernambuco.

Antes disso, estudou para ser um professor eficiente. Fez diversos cursos, entre eles, “Introdução ao Estudo de Problemas Internacionais do Brasil”, ministrado pelo sociólogo Gilberto Freyre, “Instituições Americanas”, na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, em 1962, “Direito”, na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, em 1963, “Aperfeiçoamento em História Contemporânea”, na Universidade Católica de Pernambuco e “As Nações Unidas”, realizado no Instituto Rio Branco, Ministério das Relações Exteriores, em 1970.

Estava, portanto, talhado para o grande desafio. Mas a grande vocação de Marco Maciel foi a arte da política da conciliação e por isso mesmo Sarney teve que recorrer aos seus préstimos na Casa Civil. No Ministério da Educação, o “Marco de Pernambuco”, como era conhecido, demorou pouco mais de um ano. Assumiu em 15 de março de 1985 e da pasta se despediu em 14 de fevereiro de 1986.

Não deu tempo para fazer profundas mudanças no sistema educacional brasileiro, o qual, na sua visão, sempre foi visto como uma pirâmide de cabeça para baixo por diversas razões, entre as quais destacou o “peso especial a demagogia de palanque – “as autoridades sempre deram mais atenção à ponta do que à base dessa pirâmide”.

Como ministro da Educação foi no principal foco: o acesso de todos ao ensino básico como exigência inafastável, termo usado por ele. “O acesso, dizia ele, a partir da pré-escola, à educação – e de boa qualidade. Com isso, é possível assegurar cidadania plena, que não se obtém senão quando se assegurar a todos os cidadãos o pleno domínio dos códigos básicos da sociedade em que ele vive”.

Mais tarde, em discurso já na condição de vice-presidente da República, Marco Maciel voltou a tocar na questão e fez uma mea-culpa. Disse que a educação continuava sendo o grande problema estrutural brasileiro não resolvido, por causa, segundo ele, do baixo processo de desenvolvimento com origem nas deficiências educacionais históricas.

“Aliás, no Governo do presidente Fernando Henrique Cardoso muito foi feito, valendo citar entre relevantes iniciativas a criação do Fundef, o Fundo de Desenvolvimento da Educação, que teve um significativo papel no alavancamento do ensino fundamental”, disse, após ressaltar que isso só foi possível porque a educação foi tocada por apenas um ministro, em oito anos de gestão, Paulo Renato.

Paulo Renato conseguiu, segundo Maciel, o que ele projetava quando Sarney o nomeou ministro da Educação: a universalização do ensino fundamental. Na condição de ex-ministro da Educação, o pernambucano Cristovam Buarque, que foi também governador do Distrito Federal e senador, afirma que o grande papel de Marco Maciel na pasta foi devolver tranquilidade ao ensino superior.

“Ele pacificou as universidades, especialmente a Universidade de Brasília (UNB), que encontrou em pé de guerra”, diz Cristovam, reportando-se ao convite que recebeu de Maciel para assumir a Reitoria da UNB, tão logo nomeado ministro da Educação. Escolhido nos últimos dias da ditadura, o antecessor de Cristovam era ponto pacífico: os universitários não o queriam mais na função. “Chegaram até a ensaiar uma greve, mas o primeiro ato do ministro foi destituir o reitor José Carlos Azevedo”, lembra o jornalista Ângelo Castelo Branco.

Como ministro da Educação, Maciel teve papel fundamental na restauração e reafirmação da UNE – a União Nacional dos Estudantes.  Em março de 1985, ele recebeu, depois de 21 anos, a diretoria da UNE, que solicitou o apoio, junto à Câmara dos Deputados, para a votação do projeto de legalização da entidade, de autoria do então deputado federal pelo PMDB de Goiás e ex-presidente da UNE, Aldo Arantes.

O projeto foi aprovado em setembro pela Câmara e Senado e sancionado pelo presidente da República José Sarney. Já na gestão do pernambucano Renildo Calheiros, a UNE promoveu dois seminários, um no Rio, no qual Marco Maciel foi aplaudido de pé pela contribuição dada à legalização da instituição, e outro em São Paulo, IV Seminário Nacional de Reforma Universitária.

“Construir uma nação, com instituições sólidas e regime democrático como expressão de estrutura política, começa pela educação e se sedimenta, em definitivo, na educação”, dizia Marco Maciel, que gostava também de lembrar que educação não era despesa, mas investimento. “Educação, para mim, é uma verdadeira interiorização da razão”, disse em outra ocasião, desta feita em discurso como imortal na Academia Brasileira de Letras.

Já a passagem de Marco Maciel por outro Ministério, o da Casa Civil, também no Governo Sarney, foi marcada pelo exercício quotidiano da sua maior vocação: bombeiro, apagador de incêndios políticos. Com Sarney, era a Arena que estava no poder. O temor tomava conta da população, que via a retomada do regime militar como uma possibilidade. Maciel teve papel fundamental em ajudar Sarney a dar continuidade à transição do regime militar para um governo civil e democrático, sem traumas.

Desde seu início, o trabalho do Governo José Sarney era, corriqueiramente, conter a inflação. Inúmeros programas econômicos foram sucedidos para tentar conter a crise inflacionária. No entanto, todas foram um fracasso, agravando exponencialmente a crise da inflação no País. Em alguns períodos do Governo José Sarney, como durante o Projeto Verão, a inflação atingiu a casa dos quase 2000%.

Mas, aos trancos e barrancos, tudo foi vencido com entendimento. Maciel fazia a travessia entre o Palácio do Planalto, o Congresso e o Judiciário com muita habilidade, arte que aprendeu com olho no retrovisor. “Se olharmos a história do País, vamos verificar que conseguimos resolver tensões agudas por meio do entendimento. Por exemplo, no Império houve o chamado Gabinete da Conciliação, que foi resultado de um trabalho muito bem feito de Honório Hermeto Carneiro Leão, o Marquês de Paraná”, disse Marco Maciel, numa entrevista à Folha de São Paulo.

Na mesma entrevista, destacou: “Poderia também citar, entre muitos outros exemplos na República, um episódio que está ainda bem presente em nossa memória. Falo de um grande acordo que se realizou entre 1984 e 1995, que Tancredo Neves denominou de “Nova República”. Conseguimos retomar o Estado democrático de direito sem traumas, em grande movimento de entendimento de contrários, que permitiu a convocação de uma Constituinte que deu ao País a necessária estabilidade política”.

“Marco Maciel é um homem honestíssimo. Merece participar de tudo que se passa neste país”, disse Oscar Niemeyer ao ser provocado, em entrevista à revista Veja, a falar sobre o papel que o político exerceu na consolidação da democracia. “Marco Maciel é um trator. Quem está na frente, ele derruba, e quem está atrás ele puxa”, brincou Ulysses Guimarães, que concedeu o título de “Político-Operário-Padrão” ao trator Marco Maciel.

Dona Ruth, esposa de Fernando Henrique Cardoso, tinha ouvido falar muito pouco sobre Marco Maciel e quando seu marido o escolheu candidato a vice procurou um amigo, o imortal Joaquim de Arruda Falcão e quis dele colher mais informações de quem se tratava. Com maestria, Falcão disse e depois relembrou em um artigo no jornal O Globo:

“Pensei, repensei e respondi. Dona Ruth, quando o presidente Fernando Henrique estiver pressionado a tomar uma decisão que ainda não esteja na hora e que ele não esteja confortável, pede para o presidente passar no escritório de Marco Maciel. Conversarem. Dialogarem um pouco”.

Para Arruda Falcão, o tempo era um dos vetores, senhor mesmo, conveniência e oportunidade, do diálogo político de Marco Maciel. “Era um especialista em se conectar com a oportunidade do tempo. Como dizem os americanos, tinha a noção do timing”.

Veja amanhã:

O sentimento que movia Marco Maciel: a pernambucanidade

Marco Maciel

Capítulo 15 

No Governo Marco Maciel (79-82), os jardins do Palácio do Campo das Princesas, que abrem de vista um belo horizonte em direção ao Rio Capibaribe, o Cão sem plumas, como batizou o imortal João Cabral de Melo Neto, ganharam uma modelagem diferente que logo passou a chamar a atenção dos visitantes.

Era um ônibus, pintado com as cores da bandeira de Pernambuco em forma de um arco-íris: azul, branco e amarelo. O azul simboliza a grandeza do céu pernambucano; o branco, a paz; o arco-íris, o início de uma nova era, a união de todos os pernambucanos. Já a estrela amarela caracteriza Pernambuco como parte do País. O sol, enfim, remete à força e à energia.

Só por isso mesmo e pela altura também, já enchia os olhos de qualquer um curioso que botasse os pés no suntuoso Palácio das Princesas, que tem nas vizinhanças o belíssimo Teatro Santa Isabel, onde Joaquim Nabuco, inspiração da vida pública de Marco Maciel, foi ovacionado na sua histórica volta a Pernambuco depois da Abolição da Escravatura. 

Adaptado para viagens longas numa espécie de montadora genuinamente pernambucana no Cabo, Região Metropolitana do Recife, o ônibus ganhou até nome. Foi batizado de “Asa Branca”, porque, de tanto viajar, alcançar lugares ermos e distantes na rotina de trabalho do então governador Marco Maciel, parecia ter asas como o pássaro imortalizado na canção de Luiz Gonzaga.

Também Asa Branca, em homenagem ao Rei do Baião, ficou conhecido o projeto de perenização dos rios sertanejos na era Maciel, que acabou, por erro de engenharia, não dando certo. Para não perder tempo nem enfrentar estradas esburacadas, chefes de Estado andam de avião. No tempo de Marco Maciel e até o final do Governo de Joaquim Francisco, o Estado tinha uma frota própria.

Nas emergências, Marco Maciel usava dois tipos de aviões: Bandeirante e Sêneca, o primeiro um pouco maior e mais veloz, o segundo, com apenas dois lugares, pousava em qualquer campo de aviação das pequenas e longínquas cidades do Sertão. O ônibus, entretanto, passou a ser o maior equipamento de deslocamento de Maciel e sua equipe para o Interior.

“Cruzamos o Estado inteiro no Asa Branca”, relembra Joel de Hollanda, ex-secretário de Educação no Governo Marco Maciel. Segundo ele, o ônibus era usado principalmente nos finais de semana, quando o incansável governador levava o Secretariado para vistoriar e inaugurar obras. “Além de banheiro e ar-condicionado, o ônibus contava com uma mesa redonda. Era nela que Maciel despachava para matar o tempo das longas distâncias nas viagens”, diz Joel.

Subchefe da Casa Civil, Silvio Amorim era também presença frequente na comitiva. Cuidava de toda a logística, ao lado da chefe, a secretária da Casa Civil, Margarida Cantarelli. Segundo Amorim, entre os secretários convocados todos os fins de semana, sem direito a lazer, havia um personagem que despertava atenção e ao mesmo tempo divertia, quebrando o estresse do desconforto em estradas vicinais, verdadeiras tábuas de pirulito.

Chamava-se João Maurício, de apenas 12 anos na época, o único filho homem de Marco Maciel com Anna Maria, que nunca quis saber de política, sendo hoje advogado bem-sucedido em Brasília. “Certa vez, pegamos uma estrada vicinal sem a mínima conservação, repleta de buracos que mais pareciam crateras. Com os solavancos, chegamos a bater com a cabeça no neto”, lembra Joel de Hollanda.

Diante de tanto desconforto, segundo Joel, João Maurício olhou para Maciel e sapecou, como todo menino atrevido e esperto: “Papai, eu já sei o que o povo vai pedir ao senhor quando a gente chegar na próxima cidade”. “O que é? perguntou o curioso pai. “Estrada boa”, respondeu João Maurício, levando o secretariado a dar uma boa gargalhada.

Ao longo dos quatro anos de mandato de Maciel, cujo Governo estampava o slogan “Desenvolvimento com Participação”, o ônibus quase bateu o motor de tanto viajar. Além de secretários, transportou também ministros de Estado e até o presidente Geisel numa visita ao Porto de Suape. Conduziu também gente famosa, entre as quais, o ator Gian Franco Corsi Zeffirelli, mais conhecido como Franco Zeffirelli.

Celebridade no mundo inteiro, Zeffirelli, diretor italiano e produtor de óperas, filmes e televisão, também foi senador de 1994 até 2001 pelo partido italiano de centro-direita Forza Italia. Veio a Pernambuco conhecer o espetáculo da Paixão de Cristo no maior teatro ao ar livre do mundo, em Fazenda Nova, distrito de Brejo da Madre de Deus, no Agreste Meridional.

“Perdi as contas que fomos de ônibus para Nova Jerusalém. Foi Marco Maciel que sugeriu a Plínio Pacheco, idealizador do espetáculo e criador do teatro, a criar um dia específico para autoridades e jornalistas”, recorda Silvio Amorim. “O Asa Branca acabou se constituindo num grande equipamento de trabalho”, relata Margarida Cantarelli, presença assídua nas viagens.

Outro famoso passageiro do ônibus foi Adolpho Bloch, um dos mais importantes empresários da imprensa e televisão brasileira. Fundador do grupo de mídia que levava seu sobrenome, foi o criador da revista semanal Manchete, em 1952, e fundador, em 1983, da Rede Manchete, hoje extinta. Era primo do escritor Pedro Bloch, tio-avô do ator Jonas Bloch e tio-bisavô da atriz Débora Bloch.

Como Zeffirelli, seu destino foi a Paixão de Cristo, em Nova Jerusalém. Passou a viagem falando da sua vida a Marco Maciel. O fato de a família Bloch ser de origem judaica fez com que seus descendentes se envolvessem em muitos problemas em 1917, na época da Revolução Russa. Um desses problemas, segundo ele contou ao então governador e anfitrião, foi a fome. 

Relatou que junto com dezessete parentes, foi forçado a deixar sua localidade natal, Jitomir, para morar em Kiev. Em 1921, também deixou a Ucrânia definitivamente, chegando a morar 9 meses em Nápoles, na Itália. Somente em 1922, os Bloch chegaram ao Rio de Janeiro.

Na volta dos longos e intermináveis percursos, já no domingo de noite ou segunda pela manhã, Marco Maciel costumava promover reuniões com todo o secretariado a bordo do ônibus. “Ele era muito organizado, disciplinado. Nunca reclamou do desconforto nas viagens, nem mesmo quando a buraqueira aparecia como obstáculo para alcançar o nosso destino ou havia tomado poeira na cara”, diz o jornalista Ângelo Castelo Branco, ex-secretário de Imprensa.

O Governo Marco Maciel alcançou alguns feitos que ficaram marcados na literatura administrativa do Estado. Criou e executou o maior programa habitacional, com a entrega de 100 mil casas. Na educação, foram criadas 167 mil novas vagas na rede pública de ensino. Ele usava o prestígio que tinha nacionalmente para fazer com que Pernambuco se beneficiasse”, explica o deputado federal André de Paula (PSD), um dos herdeiros políticos de Maciel.

Na gestão de Maciel, o Complexo Industrial Portuário de Suape teve sua implantação efetivamente iniciada. O Metrô do Recife foi viabilizado financeiramente e sua construção saiu do papel também sob sua gestão. Na Saúde, Maciel foi pioneiro no País ao pagar pensão para portadores de hanseníase. O abastecimento de água, carência recorrente do Estado, foi estendido para 70 cidades, distritos e vilas pernambucanas.

Veja amanhã

A passagem de Marco Maciel pelos Ministérios da Educação e Casa Civil 

Escola Macielista

Capítulo 14 

Um dos clichês mais presentes no debate político é que o Brasil virou um deserto de bons líderes. Dos bons líderes não dependem apenas as boas e práticas políticas públicas, mas também a capacidade de montar seus exércitos de seguidores para vencer a guerra e os desafios da gestão pública. Há políticos que formam quadros e deles nunca mais abrem mão da sua presença, da sua colaboração.

Há quem crie quadros, há quem faça escola com discípulos fiéis. Governador também biônico, como Marco Maciel, que o sucedeu, nomeado igualmente por Ernesto Geisel na ditadura, Moura Cavalcanti ganhou fama na literatura política de Pernambuco por ter gestado quadros de futuro promissor, dentre eles, três ocuparam funções as mais relevantes depois de trabalharem no Governo Moura: Gustavo Krause, José Jorge de Vasconcelos e Joaquim Francisco.

Krause foi prefeito do Recife, governador, deputado federal e ministro de Estado. José Jorge também foi ministro, deputado federal e senador, enquanto Joaquim Francisco, como Krause, foi prefeito do Recife, governador de Pernambuco e ministro de Estado. Enquanto Moura soube descobrir talentos, Marco Maciel, além de jogar o anzol da pescaria de quadros promissores para a vida pública, avançou muito mais. Criou uma escola, a escola macielista.

“Formou uma equipe de jovens auxiliares destinados a revolucionar a história de Pernambuco, que marcaram época e fizeram história”, resume o jornalista Anchieta Hélcias, que também trabalhou na equipe de Moura, mas com o tempo se embriagou pela doutrina macielista. Entre os macielistas, há de se destacar também o ex-presidente da Assembleia, José Ramos, que cumpriu um papel importante: assumiu o Governo por 11 meses, substituindo Marco Maciel, para que Roberto Magalhães, o vice, pudesse ser candidato a governador. 

“Mais que um estilo, Marco criou uma Escola pelo zelo e respeito à Coisa Pública. Criou o que denominei de “preâmbulo da gentileza”, revela o ex-ministro Gustavo Krause, sobrinho de Moura. Como bem observou o agora imortal José Paulo Cavalcanti Filho, em discurso de posse na Academia Brasileira de Letras, Marco Maciel fez uma administração inovadora em Pernambuco. 

“Montou uma equipe com jovens e competentes técnicos trazidos do IPEA, como Aluízio Sotero, Everardo Maciel, Joel de Hollanda e Jorge Cavalcanti. A estes, juntou outros importantes nomes, como o de Margarida Cantarelli, Silvio Amorim e Gustavo Krause”, diz Joel de Hollanda, um dos mais fervorosos discípulos de Maciel, a quem serviu como secretário de Educação e a quem substituiu no Senado quando Marco eleito vice-presidente da República.

Quando governou Pernambuco, Marco Maciel confiou a uma mulher, a professora Margarida Cantarelli, a gestão da Casa Civil, uma das pastas mais importantes de uma gestão. Antes de ingressar na vida pública, Margarida já era amiga de Maciel, contemporânea dele na Faculdade de Direito da UFPE e aliada na política estudantil e depois partidária. Foi, também, assistente de Marco Maciel na disciplina Direito Internacional, na UNICAP, em 1967. 

Os ensinamentos macielistas, na convivência do dia a dia com ele, viraram uma prática diária no seu viver do corretamente político até hoje. “Nunca vi um gesto de Maciel que considerasse inadequado ou que, em situação semelhante, eu não fosse capaz de repetir. Das quatro operações, ele só fazia duas: somar e multiplicar. Diminuir, nunca, dividir, jamais. Ainda hoje repito aos amigos e colaboradores os seus ensinamentos: nunca passe recibo por uma crítica recebida, nem responda imediata ou diretamente. O silêncio incomoda muito mais o ofensor. Deixe passar um tempo, depois apresente um fato positivo. Sábios ensinamentos, evitam polêmicas”, destaca Margarida, para acrescentar:

“Trabalhar com Marco Maciel era um aprendizado permanente. Em cada gesto, decisão ou projeto era possível identificar um administrador ético, competente, compromissado com seus ideais e com uma capacidade de trabalho ilimitada. Tornava-se fácil lidar com ele porque tinha equilíbrio e gentileza no trato. Portanto, era previsível no que lhe agradava ou no que era preciso mudar”. Para a professora, Maciel faz muita falta ao Brasil nesse tempo de uma polarização quase que insana e burra.

Além de chefiar o Gabinete Civil, Margarida foi levada por Maciel para trabalhar com ele no Ministério da Educação, na Casa Civil da Presidência da República e dela não se afastou em nenhuma das campanhas políticas. “Só parei quando ingressei na magistratura”, diz a professora, agora desembargadora do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Mesmo não estando na mesma atividade, Margarida nunca se afastou dele. “Fomos duplamente compadres. Ele e Anna Maria são padrinhos da minha filha Anna e eu sou madrinha de Gizela. Um cristão verdadeiro”, disse. 

“Uma coisa inédita: quando governador, todos os seus secretários iniciaram e terminaram o seu mandato com ele, que formou um grupo perene, sólido e solidário. Nunca vi uma palavra dele denegrindo alguém. Nem dos adversários. Sempre olhava o que as pessoas tinham de melhor. Muito bem-humorado, não perdia uma boa história. Ednaldo Alves, seu cunhado, que o diga”, atesta, por sua vez, Silvio Amorim, braço direito de Margarida Cantarelli no Gabinete Civil.

Para Amorim, Marco Maciel é imortal “pelo seu legado de repercussão social inimaginável, resultado do seu trabalho Político, com “P” maiúsculo”, diz, acrescentando: 

“Estar ao lado de Marco Maciel no exercício da vida pública e tê-lo como amigo foi um aprendizado. Homem conciliador e de bons propósitos, tinha a confiança não só dos correligionários, mas também dos adversários”. 

Marco Maciel, segundo Gustavo Krause, no trabalho com a equipe ouvia mais do que falava, mas ao falar reforçava o rumo estratégico da ação política. “Como prefeito, percebi que o governador MM era um ator fundamental na redemocratização do Brasil. O tempo histórico confirmou”, disse. Por 13 anos, Vandenbergue Sobreira Machado foi secretário de Marco Maciel, cuidava de tudo, especialmente da agenda.

Quando ministro da Educação, Maciel reservava um dia por semana para atender políticos em audiências. Certa vez, um deputado federal do Acre pediu para ser recebido por ele. Maciel autorizou Vandenbergue a marcar a conversa para as duas da madrugada. “Quando foi por volta das duas e meia da manhã, Marco me perguntou pelo deputado. Eu respondi que não havia aparecido. No dia seguinte, às 14 horas, o parlamentar chega ao gabinete. Eu tive que ser sincero. Deputado, a audiência era de duas da madrugada e não da tarde. Ele não acreditou e só nos restou uma boa gargalhada”, relembra.

“Marco Maciel foi um exemplo para toda classe política brasileira. Sabia como ninguém escolher seus auxiliares e era rigoroso no trato com a coisa pública. Nunca misturou assuntos do seu interesse, que era a política, com familiares. Era um exemplo. Aos seus auxiliares sabia cativar. Sempre procurava em seus despachos colocar “parabéns pelo trabalho”. Sabia respeitar e era respeitado por todos. Não só tinha fama de trabalhador e de quem comia pouco. Isso era verdade porque eu acompanhei de perto. Trabalhava muito e comia pouco”, conta Vandenbergue. 

Na política, um dos herdeiros de Maciel é o deputado federal André de Paula Filho, filho do empresário André de Paula, que no Governo Maciel presidiu o Bandepe. Pelas mãos do ex-governador, André Filho ocupou vários cargos e dirigiu o PFL. “Nos 17 anos em que presidi o partido, que tinha nele a sua maior liderança, aprendi, na análise cuidadosa, que ele sempre fazia, a identificar e valorizar as características de cada município e a importância da política na resolução dos problemas do nosso Estado”, disse.

Para André, participar da elaboração das estratégias e dividir as decisões do partido ao lado de Maciel foi um aprendizado que levará para sempre na sua vida pública. “Agradeço a Deus, todos os dias, pelo privilégio que tive de conviver intensamente com Marco Maciel, e de tê-lo como professor e fonte permanente de inspiração”, testemunha André.

André conheceu Marco Maciel quando ele era governador de Pernambuco e o seu pai André de Paula era o seu presidente no Bandepe. “Um político diferenciado, o principal incentivador do meu ingresso na vida pública, que sempre apostou na renovação dos quadros do partido. Sinônimo de trabalho, espírito público e de política feita com ética e com P maiúsculo, Dr. Marco foi um homem público com extrema capacidade de diálogo e que nos deixou lições valiosas de honradez e decência”, afirmou. 

Macielista convicto, o engenheiro Aloízio Sotero tomou um susto quando o então governador Marco Maciel o convidou para a pasta de Agricultura. “Governador, eu não distingo um pé de feijão de um pé de soja”, reagiu Sotero, que mais tarde virou, mesma na área que dizia não conhecer, um dos mais eficientes auxiliares do primeiro escalão macielista.

“Tive o privilégio de conviver e trabalhar com um homem extraordinário e político exemplar. Aprendi que a política se faz construindo pontes de entendimento e consensos. Ele foi um grande construtor da passagem para a democracia que vivemos. Seus ensinamentos muitas vezes pautaram os meus caminhos. A ele, a minha Gratidão. Tenho na minha memória dezenas de exemplos “Quem tem prazo não tem pressa”, “Não dou status de inimigo a qualquer pessoa. Se for caso, eu escolho os meus”, “Quem briga, não ganha”, “Sempre coloque o sinal de somar”, entre outros”, disse Sotero. 

Jornalista, Otávio Veríssimo foi assessor de Imprensa de Marco Maciel no Senado e na Vice-Presidência, uma relação que durou 13 anos. Ele guarda na memória momentos importantes que presenciou e que revelam a enorme capacidade de articulação do ex-senador. “Em 2007, durante tumultuada sessão para discussão da PEC que prorrogava a vigência da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), líderes empresariais tentavam, por meio de uma ação midiática, invadir o plenário da CCJ com carrinhos de supermercado abarrotados de folhas de um abaixo-assinado contrário à manutenção do tributo”, relembra Veríssimo.

E acrescenta: “Em meio aos protestos de representantes do governo e da oposição, o então presidente da Comissão de Constituição e Justiça, Marco Maciel, usou de sua experiência e bom humor para apaziguar os ânimos, levar todos às gargalhadas e restabelecer a ordem dos trabalhos. Com suavidade, ligou seu microfone e alertou: o óbvio não é tão simples de ser enxergado. Lembrem-se das palavras do Conselheiro Acácio, personagem da obra O Primo Basílio, de Eça de Queirós: “As consequências sempre vêm depois”. 

Para ele, essa passagem resume bem o que foi trabalhar por 13 anos ao lado de Marco Maciel. “Foi e continua sendo um exercício diário de buscar sempre o entendimento com humildade, simplicidade, equilíbrio, respeito, serenidade e dedicação no servir ao povo”, afirmou. 

Já Roberto Pereira, secretário de Educação no governo Joaquim Francisco em subistituição a José Jorge, revela que trabalhar com Marco Maciel, além de ser uma honraria, foi um prazer porque ele era um aglutinador e motivador das ações realizadas por sua equipe. “A sua conduta ética e moral era o nosso orgulho. Ele foi um missionário do bem público, este o seu legado”, disse Pereira, que foi assessor especial de MM durante seus 8 anos na vice-presidência da República. 

No resumo da ópera, Marco Maciel, conforme atesta Gustavo Krause, um dos mais fiéis discípulos da escola macielista, foi um ser humano quase perfeito. “Foi o menos imperfeito que conheci em toda minha vida”, disse.

Veja amanhã

Governador, Marco Maciel andava de ônibus e não de avião pelo Interior 

Miguel Arraes

Capítulo 13 

Durante o regime militar que dirigiu o Brasil de 1964 a 1985 havia o clamor pela volta de líderes forçados a buscar exílio no Exterior. Com a Lei da Anistia, finalmente sancionada em agosto de 1979, personagens que tiveram seus direitos políticos cassados pela Revolução puderam retornar ao País. Em Pernambuco, Miguel Arraes, que havia governado o Estado, cassado no golpe de 64, era um deles.

Foi exilado na Argélia, depois de ser rejeitado na França e uma tentativa frustrada de ida ao Chile – que também viveria um golpe de Estado em 1973. Na Argélia, no norte da África, chegou em 1965 e ali permaneceu por 14 anos. Quando regressou ao País em 79, poucos dias após a anistia, encontrou o Estado sendo governado por Marco Maciel, nomeado por Ernesto Geisel, o antepenúltimo presidente da Ditadura Militar. 

Fora do poder e antes de buscar asilo político, Arraes foi preso, primeiramente, em uma cela do IV Exército, em Recife. Depois, ficou confinado por onze meses na Ilha de Fernando de Noronha e, ainda, na Fortaleza de Santa Cruz, no Rio. Amparado por um habeas-corpus do Supremo Tribunal Federal, conseguiu refúgio político. Acusado de subversão, foi condenado à revelia pela Justiça Militar pernambucana. 

Durante o período de exílio, continuou sendo vítima dos abusos da ditadura no Brasil. Teve a casa invadida por civis armados à procura de seus documentos pessoais e, mesmo em outro continente, foi condenado à revelia, pela Justiça brasileira pelo crime de “subversão”, em março de 1967. A pena prevista era de 23 anos de prisão.

Miguel Arraes nasceu no dia 15 de dezembro de 1916, em Araripe, Ceará, onde frequentou os primeiros anos de escola. Em 1932, concluiu o curso secundário no Colégio Diocesano, no Crato, e em seguida mudou-se para o Recife. Em Recife, prestou concurso público para o IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), onde conheceu Barbosa Lima Sobrinho, antigo presidente do IAA, que o levou para a vida pública.

Sua vida pública foi iniciada de fato em 1948 como secretário estadual da Fazenda na gestão do então governador de Pernambuco, Barbosa Lima Sobrinho. Disputou sua primeira eleição em 1950, quando se elegeu suplente de deputado estadual. Foi só em 1958 que conquistou uma vaga de titular na Assembléia Legislativa de Pernambuco. Foi secretário da Fazenda no Governo Cid Sampaio em 1959, mesmo ano em que se elegeu prefeito do Recife. 

Em 1962, Arraes foi eleito pela primeira vez governador de Pernambuco com 47,98% dos votos, pelo Partido Social Trabalhista (PST), apoiado pelo Partido Comunista Brasileiro (PCB) e setores do Partido Social Democrático (PSD), derrotando João Cleofas (UDN) – representante das oligarquias canavieiras de Pernambuco. 

“Nunca me preocupei com rótulos. O rótulo de radical, conciliador, não tem nenhum sentido para mim, como não tinha sentido me chamarem de comunista no passado. O que importa é a prática política; o que importa são os posicionamentos que se tomam ao lado de determinadas camadas sociais em defesa de teses que interessam à nação como um todo”, disse Arraes numa entrevista em 1983. 

Seu governo foi considerado de esquerda, pois forçou usineiros e donos de engenho da Zona da Mata do Estado a estenderem o pagamento do salário mínimo aos trabalhadores rurais (o Acordo do campo) e deu forte apoio à criação de sindicatos, associações comunitárias e às ligas camponesas. Miguel Arraes desencadeou um programa nacionalista, com ações voltadas para os trabalhadores rurais. Seu governo foi marcado também pelo apoio à população mais pobre e enfrentamento aos abusos trabalhistas de usineiros na região. 

Em agosto de 1979, o general João Figueiredo, que havia substituído Ernesto Geisel, assinou a Lei da Anistia. Abriram-se as portas para a volta de milhares de brasileiros que tiveram de buscar asilo em outros países durante o regime militar. Ao lado de Arraes figuravam na lista políticos renomados, como Fernando Henrique Cardoso, Leonel Brizola e José Serra, além de muita gente conhecida, como o sociólogo Betinho, o irmão do Henfil, e o economista Celso Furtado, além do jornalista Fernando Gabeira.

Arraes foi recebido com uma grande festa. Em seu desembarque, uma multidão gritava “Arraes taí!”. Representava os novos tempos da democracia. Para retomar a vida pública, doutor Miguel Arraes de Alencar fez várias viagens pelo país, fixou novamente residência em Recife e, sobretudo, manteve contato com líderes da oposição. Embora tenha construído sua carreira política em Pernambuco e se tornado um dos maiores expoentes da esquerda brasileira, Arraes não constava na Galeria dos Governadores, exposição pública, no Palácio das Princesas.

Tão logo tomou posse como governador biônico, indicado por Geisel e aprovado pela Assembleia Legislativa, Marco Maciel percebeu um espaço em branco, sem retrato, na Galeria dos Ex-governadores, o de Miguel Arraes, cassado pela ditadura em 1964. Então secretária da Casa Civil, a professora Margarida Cantarelli recebeu de Maciel a missão de providenciar o quadro de Arraes, num gesto que ficou marcado como grandeza política e amplitude de um político que estava do outro lado do balcão de Arraes.

Pintado pelo holandês Roberto Ploeg, o quadro de Arraes fez o maior sucesso e corrigiu uma omissão daqueles que no passado travaram uma luta odienta entre direita x esquerda. “Marco decidiu: ponham o retrato de Miguel Arraes na sucessão histórica e vamos ver o que acontece amanhã. E não aconteceu nada, só uma grande aprovação da imprensa e da opinião pública”, relatou o acadêmico José Paulo Cavalcanti no discurso de posse na Academia Brasileira de Letras.

Para o ex-senador Cristovam Buarque, o pequeno e simbólico gesto revela o respeito de Marco Maciel à história, seu caráter e honra. “A vida de Marco foi marcada pela ética”, disse Buarque, que mais tarde foi eleito governador do Distrito Federal e depois escolhido ministro da Educação. Maciel via, na política, uma arte do entendimento. A partir das pessoas. Fosse pouco, não tinha nenhum preconceito. 

“Como se vê quando, em 1979, Jorge Cavalcante convidou o economista Clemente Rosas Ribeiro para o cargo de secretário-adjunto de Planejamento. Levou o ato de nomeação, para ser assinado, e Maciel comentou: “Clemente é irmão de Nelson. É uma família de caráter”. Só depois vindo a saber, Cavalcante, que Maciel e Nelson haviam militado, na política estudantil, em lados opostos”, relembra o acadêmico José Paulo Cavalcanti. 

Em 1986, ainda pelo PMDB, Miguel Arraes foi eleito pela segunda vez governador de Pernambuco. Em 1990, já pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB), do qual foi fundador e presidente nacional, Arraes foi eleito, novamente, deputado federal. E em 1994 foi eleito pela terceira vez governador de Pernambuco, derrotando Gustavo Krause (PFL) por uma diferença de mais de 300 mil votos.

Em 1998, ainda no cargo de governador, Arraes decidiu disputar a reeleição contra Jarbas Vasconcelos, seu antigo aliado, mas foi derrotado. Em 2002, mais uma vez elegeu-se deputado federal. Arraes morreu em 2005, aos 88 anos, no exercício de seu último mandato político. Três anos depois, em 2008, sua viúva Magdalena Arraes criou o Instituto Miguel Arraes com o objetivo de preservar a memória do ex-governador. 

Lá, há um quadro dele com a seguinte frase: “Minha vida todo mundo pode saber, pois nunca gostei de dinheiro pra ter muito dinheiro. Gosto de dinheiro pra gastar. Pra gastar, todo mundo gosta. Mas, pra ter dinheiro… Dinheiro é uma coisa perigosa. Na mão de um homem público é um desastre”.

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