Desde a juventude, Marco Maciel já era envolvido com a temática educacional. Exerceu grande liderança estudantil. Em 1963, foi eleito presidente da União Metropolitana dos Estudantes de Pernambuco e mais tarde passou a lecionar. Foi Professor de Direito Internacional Público na Universidade Católica de Pernambuco.
Antes disso, estudou para ser um professor eficiente. Fez diversos cursos, entre eles, “Introdução ao Estudo de Problemas Internacionais do Brasil”, ministrado pelo sociólogo Gilberto Freyre, “Instituições Americanas”, na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, em 1962, “Direito”, na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, em 1963, “Aperfeiçoamento em História Contemporânea”, na Universidade Católica de Pernambuco e “As Nações Unidas”, realizado no Instituto Rio Branco, Ministério das Relações Exteriores, em 1970.
Estava, portanto, talhado para o grande desafio. Mas a grande vocação de Marco Maciel foi a arte da política da conciliação e por isso mesmo Sarney teve que recorrer aos seus préstimos na Casa Civil. No Ministério da Educação, o “Marco de Pernambuco”, como era conhecido, demorou pouco mais de um ano. Assumiu em 15 de março de 1985 e da pasta se despediu em 14 de fevereiro de 1986.
Não deu tempo para fazer profundas mudanças no sistema educacional brasileiro, o qual, na sua visão, sempre foi visto como uma pirâmide de cabeça para baixo por diversas razões, entre as quais destacou o “peso especial a demagogia de palanque – “as autoridades sempre deram mais atenção à ponta do que à base dessa pirâmide”.
Como ministro da Educação foi no principal foco: o acesso de todos ao ensino básico como exigência inafastável, termo usado por ele. “O acesso, dizia ele, a partir da pré-escola, à educação – e de boa qualidade. Com isso, é possível assegurar cidadania plena, que não se obtém senão quando se assegurar a todos os cidadãos o pleno domínio dos códigos básicos da sociedade em que ele vive”.
Mais tarde, em discurso já na condição de vice-presidente da República, Marco Maciel voltou a tocar na questão e fez uma mea-culpa. Disse que a educação continuava sendo o grande problema estrutural brasileiro não resolvido, por causa, segundo ele, do baixo processo de desenvolvimento com origem nas deficiências educacionais históricas.
“Aliás, no Governo do presidente Fernando Henrique Cardoso muito foi feito, valendo citar entre relevantes iniciativas a criação do Fundef, o Fundo de Desenvolvimento da Educação, que teve um significativo papel no alavancamento do ensino fundamental”, disse, após ressaltar que isso só foi possível porque a educação foi tocada por apenas um ministro, em oito anos de gestão, Paulo Renato.
Paulo Renato conseguiu, segundo Maciel, o que ele projetava quando Sarney o nomeou ministro da Educação: a universalização do ensino fundamental. Na condição de ex-ministro da Educação, o pernambucano Cristovam Buarque, que foi também governador do Distrito Federal e senador, afirma que o grande papel de Marco Maciel na pasta foi devolver tranquilidade ao ensino superior.
“Ele pacificou as universidades, especialmente a Universidade de Brasília (UNB), que encontrou em pé de guerra”, diz Cristovam, reportando-se ao convite que recebeu de Maciel para assumir a Reitoria da UNB, tão logo nomeado ministro da Educação. Escolhido nos últimos dias da ditadura, o antecessor de Cristovam era ponto pacífico: os universitários não o queriam mais na função. “Chegaram até a ensaiar uma greve, mas o primeiro ato do ministro foi destituir o reitor José Carlos Azevedo”, lembra o jornalista Ângelo Castelo Branco.
Como ministro da Educação, Maciel teve papel fundamental na restauração e reafirmação da UNE – a União Nacional dos Estudantes. Em março de 1985, ele recebeu, depois de 21 anos, a diretoria da UNE, que solicitou o apoio, junto à Câmara dos Deputados, para a votação do projeto de legalização da entidade, de autoria do então deputado federal pelo PMDB de Goiás e ex-presidente da UNE, Aldo Arantes.
O projeto foi aprovado em setembro pela Câmara e Senado e sancionado pelo presidente da República José Sarney. Já na gestão do pernambucano Renildo Calheiros, a UNE promoveu dois seminários, um no Rio, no qual Marco Maciel foi aplaudido de pé pela contribuição dada à legalização da instituição, e outro em São Paulo, IV Seminário Nacional de Reforma Universitária.
“Construir uma nação, com instituições sólidas e regime democrático como expressão de estrutura política, começa pela educação e se sedimenta, em definitivo, na educação”, dizia Marco Maciel, que gostava também de lembrar que educação não era despesa, mas investimento. “Educação, para mim, é uma verdadeira interiorização da razão”, disse em outra ocasião, desta feita em discurso como imortal na Academia Brasileira de Letras.
Já a passagem de Marco Maciel por outro Ministério, o da Casa Civil, também no Governo Sarney, foi marcada pelo exercício quotidiano da sua maior vocação: bombeiro, apagador de incêndios políticos. Com Sarney, era a Arena que estava no poder. O temor tomava conta da população, que via a retomada do regime militar como uma possibilidade. Maciel teve papel fundamental em ajudar Sarney a dar continuidade à transição do regime militar para um governo civil e democrático, sem traumas.
Desde seu início, o trabalho do Governo José Sarney era, corriqueiramente, conter a inflação. Inúmeros programas econômicos foram sucedidos para tentar conter a crise inflacionária. No entanto, todas foram um fracasso, agravando exponencialmente a crise da inflação no País. Em alguns períodos do Governo José Sarney, como durante o Projeto Verão, a inflação atingiu a casa dos quase 2000%.
Mas, aos trancos e barrancos, tudo foi vencido com entendimento. Maciel fazia a travessia entre o Palácio do Planalto, o Congresso e o Judiciário com muita habilidade, arte que aprendeu com olho no retrovisor. “Se olharmos a história do País, vamos verificar que conseguimos resolver tensões agudas por meio do entendimento. Por exemplo, no Império houve o chamado Gabinete da Conciliação, que foi resultado de um trabalho muito bem feito de Honório Hermeto Carneiro Leão, o Marquês de Paraná”, disse Marco Maciel, numa entrevista à Folha de São Paulo.
Na mesma entrevista, destacou: “Poderia também citar, entre muitos outros exemplos na República, um episódio que está ainda bem presente em nossa memória. Falo de um grande acordo que se realizou entre 1984 e 1995, que Tancredo Neves denominou de “Nova República”. Conseguimos retomar o Estado democrático de direito sem traumas, em grande movimento de entendimento de contrários, que permitiu a convocação de uma Constituinte que deu ao País a necessária estabilidade política”.
“Marco Maciel é um homem honestíssimo. Merece participar de tudo que se passa neste país”, disse Oscar Niemeyer ao ser provocado, em entrevista à revista Veja, a falar sobre o papel que o político exerceu na consolidação da democracia. “Marco Maciel é um trator. Quem está na frente, ele derruba, e quem está atrás ele puxa”, brincou Ulysses Guimarães, que concedeu o título de “Político-Operário-Padrão” ao trator Marco Maciel.
Dona Ruth, esposa de Fernando Henrique Cardoso, tinha ouvido falar muito pouco sobre Marco Maciel e quando seu marido o escolheu candidato a vice procurou um amigo, o imortal Joaquim de Arruda Falcão e quis dele colher mais informações de quem se tratava. Com maestria, Falcão disse e depois relembrou em um artigo no jornal O Globo:
“Pensei, repensei e respondi. Dona Ruth, quando o presidente Fernando Henrique estiver pressionado a tomar uma decisão que ainda não esteja na hora e que ele não esteja confortável, pede para o presidente passar no escritório de Marco Maciel. Conversarem. Dialogarem um pouco”.
Para Arruda Falcão, o tempo era um dos vetores, senhor mesmo, conveniência e oportunidade, do diálogo político de Marco Maciel. “Era um especialista em se conectar com a oportunidade do tempo. Como dizem os americanos, tinha a noção do timing”.
Veja amanhã:
O sentimento que movia Marco Maciel: a pernambucanidade
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