Até o ator Franco Zeffirelli andou no ônibus que Marco Maciel adaptou para percorrer o Estado como governador

Marco Maciel

Capítulo 15 

No Governo Marco Maciel (79-82), os jardins do Palácio do Campo das Princesas, que abrem de vista um belo horizonte em direção ao Rio Capibaribe, o Cão sem plumas, como batizou o imortal João Cabral de Melo Neto, ganharam uma modelagem diferente que logo passou a chamar a atenção dos visitantes.

Era um ônibus, pintado com as cores da bandeira de Pernambuco em forma de um arco-íris: azul, branco e amarelo. O azul simboliza a grandeza do céu pernambucano; o branco, a paz; o arco-íris, o início de uma nova era, a união de todos os pernambucanos. Já a estrela amarela caracteriza Pernambuco como parte do País. O sol, enfim, remete à força e à energia.

Só por isso mesmo e pela altura também, já enchia os olhos de qualquer um curioso que botasse os pés no suntuoso Palácio das Princesas, que tem nas vizinhanças o belíssimo Teatro Santa Isabel, onde Joaquim Nabuco, inspiração da vida pública de Marco Maciel, foi ovacionado na sua histórica volta a Pernambuco depois da Abolição da Escravatura. 

Adaptado para viagens longas numa espécie de montadora genuinamente pernambucana no Cabo, Região Metropolitana do Recife, o ônibus ganhou até nome. Foi batizado de “Asa Branca”, porque, de tanto viajar, alcançar lugares ermos e distantes na rotina de trabalho do então governador Marco Maciel, parecia ter asas como o pássaro imortalizado na canção de Luiz Gonzaga.

Também Asa Branca, em homenagem ao Rei do Baião, ficou conhecido o projeto de perenização dos rios sertanejos na era Maciel, que acabou, por erro de engenharia, não dando certo. Para não perder tempo nem enfrentar estradas esburacadas, chefes de Estado andam de avião. No tempo de Marco Maciel e até o final do Governo de Joaquim Francisco, o Estado tinha uma frota própria.

Nas emergências, Marco Maciel usava dois tipos de aviões: Bandeirante e Sêneca, o primeiro um pouco maior e mais veloz, o segundo, com apenas dois lugares, pousava em qualquer campo de aviação das pequenas e longínquas cidades do Sertão. O ônibus, entretanto, passou a ser o maior equipamento de deslocamento de Maciel e sua equipe para o Interior.

“Cruzamos o Estado inteiro no Asa Branca”, relembra Joel de Hollanda, ex-secretário de Educação no Governo Marco Maciel. Segundo ele, o ônibus era usado principalmente nos finais de semana, quando o incansável governador levava o Secretariado para vistoriar e inaugurar obras. “Além de banheiro e ar-condicionado, o ônibus contava com uma mesa redonda. Era nela que Maciel despachava para matar o tempo das longas distâncias nas viagens”, diz Joel.

Subchefe da Casa Civil, Silvio Amorim era também presença frequente na comitiva. Cuidava de toda a logística, ao lado da chefe, a secretária da Casa Civil, Margarida Cantarelli. Segundo Amorim, entre os secretários convocados todos os fins de semana, sem direito a lazer, havia um personagem que despertava atenção e ao mesmo tempo divertia, quebrando o estresse do desconforto em estradas vicinais, verdadeiras tábuas de pirulito.

Chamava-se João Maurício, de apenas 12 anos na época, o único filho homem de Marco Maciel com Anna Maria, que nunca quis saber de política, sendo hoje advogado bem-sucedido em Brasília. “Certa vez, pegamos uma estrada vicinal sem a mínima conservação, repleta de buracos que mais pareciam crateras. Com os solavancos, chegamos a bater com a cabeça no neto”, lembra Joel de Hollanda.

Diante de tanto desconforto, segundo Joel, João Maurício olhou para Maciel e sapecou, como todo menino atrevido e esperto: “Papai, eu já sei o que o povo vai pedir ao senhor quando a gente chegar na próxima cidade”. “O que é? perguntou o curioso pai. “Estrada boa”, respondeu João Maurício, levando o secretariado a dar uma boa gargalhada.

Ao longo dos quatro anos de mandato de Maciel, cujo Governo estampava o slogan “Desenvolvimento com Participação”, o ônibus quase bateu o motor de tanto viajar. Além de secretários, transportou também ministros de Estado e até o presidente Geisel numa visita ao Porto de Suape. Conduziu também gente famosa, entre as quais, o ator Gian Franco Corsi Zeffirelli, mais conhecido como Franco Zeffirelli.

Celebridade no mundo inteiro, Zeffirelli, diretor italiano e produtor de óperas, filmes e televisão, também foi senador de 1994 até 2001 pelo partido italiano de centro-direita Forza Italia. Veio a Pernambuco conhecer o espetáculo da Paixão de Cristo no maior teatro ao ar livre do mundo, em Fazenda Nova, distrito de Brejo da Madre de Deus, no Agreste Meridional.

“Perdi as contas que fomos de ônibus para Nova Jerusalém. Foi Marco Maciel que sugeriu a Plínio Pacheco, idealizador do espetáculo e criador do teatro, a criar um dia específico para autoridades e jornalistas”, recorda Silvio Amorim. “O Asa Branca acabou se constituindo num grande equipamento de trabalho”, relata Margarida Cantarelli, presença assídua nas viagens.

Outro famoso passageiro do ônibus foi Adolpho Bloch, um dos mais importantes empresários da imprensa e televisão brasileira. Fundador do grupo de mídia que levava seu sobrenome, foi o criador da revista semanal Manchete, em 1952, e fundador, em 1983, da Rede Manchete, hoje extinta. Era primo do escritor Pedro Bloch, tio-avô do ator Jonas Bloch e tio-bisavô da atriz Débora Bloch.

Como Zeffirelli, seu destino foi a Paixão de Cristo, em Nova Jerusalém. Passou a viagem falando da sua vida a Marco Maciel. O fato de a família Bloch ser de origem judaica fez com que seus descendentes se envolvessem em muitos problemas em 1917, na época da Revolução Russa. Um desses problemas, segundo ele contou ao então governador e anfitrião, foi a fome. 

Relatou que junto com dezessete parentes, foi forçado a deixar sua localidade natal, Jitomir, para morar em Kiev. Em 1921, também deixou a Ucrânia definitivamente, chegando a morar 9 meses em Nápoles, na Itália. Somente em 1922, os Bloch chegaram ao Rio de Janeiro.

Na volta dos longos e intermináveis percursos, já no domingo de noite ou segunda pela manhã, Marco Maciel costumava promover reuniões com todo o secretariado a bordo do ônibus. “Ele era muito organizado, disciplinado. Nunca reclamou do desconforto nas viagens, nem mesmo quando a buraqueira aparecia como obstáculo para alcançar o nosso destino ou havia tomado poeira na cara”, diz o jornalista Ângelo Castelo Branco, ex-secretário de Imprensa.

O Governo Marco Maciel alcançou alguns feitos que ficaram marcados na literatura administrativa do Estado. Criou e executou o maior programa habitacional, com a entrega de 100 mil casas. Na educação, foram criadas 167 mil novas vagas na rede pública de ensino. Ele usava o prestígio que tinha nacionalmente para fazer com que Pernambuco se beneficiasse”, explica o deputado federal André de Paula (PSD), um dos herdeiros políticos de Maciel.

Na gestão de Maciel, o Complexo Industrial Portuário de Suape teve sua implantação efetivamente iniciada. O Metrô do Recife foi viabilizado financeiramente e sua construção saiu do papel também sob sua gestão. Na Saúde, Maciel foi pioneiro no País ao pagar pensão para portadores de hanseníase. O abastecimento de água, carência recorrente do Estado, foi estendido para 70 cidades, distritos e vilas pernambucanas.

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