Tão logo cheguei do meu refúgio carnavalesco, entre Bonito e Arcoverde, peguei meus filhos e corri para o cinema. Ver One Love, que trata da trajetória de Bob Marley, foi emocionante. Todas as minhas expectativas foram superadas. Não conhecia bem a história deste grande intérprete do reggae. Saí do cinema implorando: que o mundo todo possa conhecer a história de Bob Marley.
Me convenci também que Bob Marley, que morreu tão precocemente, com apenas 36 anos, usou a música e o seu talento para pacificar a humanidade, especialmente a sua Jamaica, que viveu terríveis conflitos armados. Usou o reggae para protestar também contra as injustiças sociais. Acabou mundialmente celebrado como a voz dos pobres e oprimidos, considerado um símbolo de resistência negra.
Leia maisVendeu mais de 75 milhões de discos e, em 1978, três anos após a sua morte, foi condecorado pela ONU como a “Medalha da Paz do Terceiro Mundo”. Bob tinha espiritualidade, defendia os direitos humanos e lutou de forma incansável por justiça social. Suas músicas denunciam o racismo, a desigualdade social, o colonialismo e a guerra. O filme mostra tudo isso e sua devoção pelo movimento religioso rastafári. Sua vida e obra foram profundamente influenciadas por sua fé.
Triste pelo abandono do seu pai, sofrendo sob a dura realidade de uma Jamaica colonizada, One Love inicia-se com um letreiro que nos insere na Jamaica de 1976, quando hits como “I Shot the Sheriff” ou “No Woman, No Cry” já existiam. O filme traz uma sensação de inovação imediata por sua recusa a seguir os passos de um verbete de enciclopédia.
One Love se passa quase inteiramente entre 1976 e 1978, período de conflitos armados na Jamaica, mas mostra relances do passado, através das memórias de seu protagonista. É um período frutífero para isso: em um quase exílio por causa de um atentado contra sua vida na Jamaica, o artista passa o tempo em Londres refletindo sobre as mensagens de sua música, a sua infância e o início de seu relacionamento com Rita Anderson e do seu envolvimento com o movimento rastafari.
One Love não despreza a importância da ausência da figura paterna de Bob. Na realidade, ele encontra uma maneira singela de retratar isso, que funciona em níveis variados de sucesso.
Nada disso seria convincente sem a performance meticulosa de Kingsley Ben-Adir, que carrega com delicadeza um papel que poderia muito facilmente pesar ao caricato. A ideia de One Love, de ir além da imagem icônica de Bob Marley, e cavar o que há por trás de um homem que se tornou um símbolo, ajuda a atuação: Ben-Adir aborda Bob como um sujeito falho, comum, mas não por isso menos marcante.
Em uma das cenas mais bonitas de One Love, quando Bob Marley encara o atirador que está prestes a atentar contra sua vida, é o brilho de hesitação em seu olhar que carrega toda a cena – e Marcus Green sabe muito bem como prolongar aquele relance para transmitir o peso de um momento que durou segundos.
Leia menos