Por Rinaldo Remígio*
Lendo “Os Leões do Norte” pude ver os detalhes descritos pelo autor, o jornalista Magno Martins, contemporâneo desde a adolescência, que, como ele próprio diz, fugiu da seca em pau de arara para estudar na capital pernambucana.
Ao concluir a graduação em Jornalismo, ganhou o mundo em um voo sem volta, ou melhor, uma volta apenas ao Pajeú das Flores, para visitar os familiares e gozar suas férias.
Leia maisFoi dessa vivência, sertaneja na essência e cosmopolita na experiência, que nasceu a sensibilidade para resgatar com fidelidade e brilho a história política de Pernambuco e de seus grandes homens públicos no seu mais recente dos 14 livros já editados em sua trajetória como jornalista, escritor e poeta.
No Sertão de Petrolina, banhado pelas águas generosas do Velho Chico, marcado pela luta contra a seca, nasceu em 2 de novembro de 1920 um menino chamado Nilo de Souza Coelho. Seu destino parecia estar escrito antes mesmo de vir ao mundo: era herdeiro de uma família que transformou adversidade em bonança, tendo à frente o lendário Coronel Quelê, patriarca de um clã que ajudou a moldar o futuro do Nordeste.
Médico, formado pela Faculdade de Medicina da Bahia, Nilo retornou cedo à sua terra natal. Ali, a medicina dividiu espaço com a política, vocação herdada das raízes familiares. Em 1947, foi eleito deputado estadual, pouco depois deputado federal, já mostrando que sua atuação não se limitaria às fronteiras de Petrolina.
Mas seria em 1966, quando o presidente Castelo Branco o nomeou governador de Pernambuco, que Nilo Coelho escreveria as páginas mais luminosas de sua trajetória. Eram tempos duros, de chumbo e silêncio, mas o governador sertanejo soube imprimir um estilo próprio: leve no trato, firme nas decisões, ousado na visão.
Sua gestão, de 1967 a 1971, rompeu uma tradição secular: a de governar Pernambuco de costas para o Sertão. Nilo virou o mapa e, com ele, virou a história. O Sertão virou mar pelas suas mãos, como profetizara Antônio Conselheiro, um mar que traduziu em desenvolvimento, integração e esperança.
A estrada que liga Petrolina ao Recife – setecentos quilômetros pavimentados – foi mais que uma obra de engenharia. Foi símbolo de pertencimento. O sertanejo, antes isolado, pode, enfim, sentir-se parte de um Pernambuco inteiro, conectado, vivo e latente.
Ao lado disso, levou energia elétrica a mais de duzentos distritos, implantou políticas de irrigação que transformariam o Vale do São Francisco em celeiro de frutas, diversificou a produção agrícola e lançou bases sólidas para o crescimento de uma região antes esquecida.
Sob sua gestão nasceram instituições como o Lafepe e a Fiam, que marcaram a modernização do Estado. Mas Nilo não era apenas o gestor visionário. Era também o homem de coração aberto, que surpreendia famílias ao aparecer de madrugada, sozinho, para alertar sobre riscos em tempos de perseguição política.
Um liberal no meio da ditadura, protegeu muitos que corriam perigo por suas ideias. E sempre encontrava tempo para o convívio humano: de humor leve, gostava de conversar à mesa, de ouvir e de contar histórias.
Foi também o estadista que acreditou nos sonhos culturais. Ao apoiar Plínio Pacheco, bancou a construção da Nova Jerusalém, o maior teatro ao ar livre do mundo, tornando realidade um projeto que hoje é orgulho de Pernambuco e do Brasil.
Encerrado o governo, Nilo não se recolheu. Como senador, mostrou coragem rara ao enfrentar seu próprio partido e o regime militar, defendendo a investigação da explosão do Riocentro. Do alto da tribuna, imortalizou sua independência ao dizer: “Não sou presidente do Congresso do PDS. Sou presidente do Congresso do Brasil.”
Infelizmente, partiu cedo, em 9 de novembro de 1983, vítima de um infarto fulminante. Tinha apenas 66 anos. Mas deixou gravada na memória do povo a marca de um homem que não se acovardou, que não se acomodou, que ousou sonhar e realizar. E realizou muito em favor de uma gente que pulsava no seu coração o tempo todo, a toda hora, a humilde e sofrida gente sertaneja.
Para o sobrinho e ex-senador Fernando Bezerra Coelho, seu tio Nilo foi incansável em criar condições para o desenvolvimento sustentável do Sertão. De fato, sua maior obra foi fazer do acesso à água o motor do progresso, transformando o Vale do São Francisco em referência mundial de fruticultura irrigada.
Hoje, ao evocarmos sua memória, trazida a público em boa hora no livro de Magno, não falamos apenas de um ex-governador ou ex-senador. Falamos de um símbolo da força sertaneja, de um homem que ousou fazer diferente, que levou dignidade, desenvolvimento e esperança a uma terra antes esquecida.
Nilo Coelho permanece como exemplo raro na política brasileira: um líder que governou com o coração e a mente, que acreditou no Sertão, que provou que nele também pode nascer o futuro.
Nesse sentido, o jornalista Magno Martins, sertanejo como Nilo Coelho, ainda que filho do Pajeú, revela-se extremamente feliz e oportuno ao resgatar, em sua obra, parte fundamental da história política de Pernambuco. Seu trabalho não apenas preserva a memória de líderes que transformaram o Estado, mas também oferece às novas e futuras gerações um referencial sólido para compreender o papel de Pernambuco na formação política e social do Brasil.
Considerando a riqueza de informações, a densidade histórica e a relevância social contidas no livro, é recomendável que ele seja adotado como material de leitura em escolas públicas e privadas, bem como em universidades.
Trata-se, sem dúvida, de uma fonte de pesquisa valiosa e indispensável para aqueles que desejam compreender, em profundidade, os caminhos que fizeram de Pernambuco um Estado de vocação política e de contribuição decisiva para o país e o mundo.
Em tempo: a partir de hoje, Magno começa uma nova incursão ao Interior, levando conhecimento sobre a história de Pernambuco. No roteiro, Toritama, São Caetano, Caruaru e Vertentes.
Ele quer o livro em todas as escolas do Estado. Em nossa Petrolina, o lançamento vai se transformar numa grande homenagem a Nilo Coelho, no dia 2 de outubro, na Fundação Nilo Coelho, presidida pelo ex-prefeito Miguel Coelho.
Árvore frutífera da nova geração pública dos Coelho, o jovem Miguel, que já deu prova da sua vocação para gestor ao governar nossa Petrolina, dá sequência ao legado do grande e inesquecível estadista Nilo de Souza Coelho.
*Professor universitário, memorialista, pajeuzeiro e cidadão petrolinense.
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