Capítulo 34
Após quase 40 dias de agonia e comoção nacional, o ex-presidente Tancredo Neves morreu em São Paulo em 21 de abril de 1985, sem nunca assumir o cargo para o qual foi eleito. Não resistiu a várias cirurgias para combater uma infecção provocada por diverticulite. Houve cortejo com o seu corpo na capital, autoridades e parentes de Tancredo. Como Tancredo, outros nomes famosos e de veneração nacional da política foram enterrados em sua pátria natal, a exemplo do ex-governador de São Paulo, Mário Covas, em sua paulista Santos
Leia maisArtífice do processo da transição democrática que girou em torno da figura de Tancredo, ocupante dos mais diversos cargos públicos que um político almeja, de deputado estadual a presidente da República, mesmo que interino, por 85 vezes, Marco Maciel morreu sem cortejo, sem homenagem popular e sem o direito dos pernambucanos darem o último adeus a ele.
Marco Maciel encerrou sua missão na terra na madrugada do dia 12 de junho de 2021, aos 81 anos. Era um sábado de névoa seca em Brasília. Vítima das consequências do Mal de Alzheimer, estava internado em um hospital particular do Distrito Federal desde o dia 30 de março do mesmo ano. Segundo os médicos, faleceu em decorrência de um “quadro infeccioso respiratório”.
Foi velado no Salão Negro do Senado numa cerimônia fechada para familiares e amigos. Seu corpo chegou em um carro funerário acompanhado de coroas de flores por volta das 14h30. As honras ao ex-presidente foram feitas pelos soldados dos Dragões da Independência, que subiram a rampa carregando o caixão em marcha fúnebre até o Salão Negro do Senado Federal.
O Brasil perdia um exemplo de homem público, importante voz de tolerância e sabedoria, virtudes tão em falta atualmente. Os pernambucanos, especialmente, perderam o “Marco de Pernambuco”, como ficou conhecido em razão da marca do governo desenvolvimentista que empreendeu e por todos os cargos aos quais sua maior causa era Pernambuco sem nunca ter seu nome envolvido em escândalos, como acontece com a maioria dos políticos brasileiros.
Ele deixou a mulher Anna Maria Maciel e três filhos – Gisela, Cristiana e João Maurício. FHC expressou pesar pela morte do companheiro de chapa. Seu velório durou apenas duas horas, das 14h30 às 16h30. O sepultamento ocorreu no final da tarde, na Ala dos Pioneiros do Cemitério Campo da Esperança, em Brasília. Poderia ter sido no seu amado Recife, onde nasceu e conquistou o coração de muitos pernambucanos.
Mas a família não quis, também não houve pedido dele, em nenhum momento, para ser enterrado no Estado que governou de 1979 a 1982 e por ele emplacou todos os mandatos de deputado estadual, deputado federal e senador da República. No calor da emoção, Anna Maria fez uma reunião com os filhos e tomou a decisão de fazer os funerais e enterro em Brasília.
“As circunstâncias eram muito adversas para fazer o enterro em Pernambuco porque estávamos em plena pandemia”, justifica a viúva, entendimento geral também dos filhos. Além disso, pesou também uma razão pessoal de Anna Maria. “No Recife, seu corpo iria para um jazigo do pai e da mãe, da sua família, sem lugar para mim. Eu moro em Brasília, quase não tenho mais parentes em Pernambuco, apenas uma relação afetiva”, justificou.
Os filhos e a própria Anna desmancham também a versão surgida na época de que Marco Maciel não fora enterrado em Pernambuco porque ele e a família ficaram desgostosos da derrota dele, a única em 60 anos de vida pública, na corrida para o Senado em 2010. Provavelmente, em decorrência da depressão gerada pela derrota, Maciel tenha desenvolvido o Mal de Alzheimer, segundo médicos e pessoas que o conheciam de perto.
“Não houve da parte dele e não há de nossa parte também nenhuma mágoa por ele não ter sido eleito novamente em Pernambuco, nada disso. Teve uma reunião familiar, e eu disse que ele seria sepultado aqui, assim como eu também serei. Foram mais de 50 anos de convivência e eu queria ser sepultada no mesmo lugar dele. E não me arrependo”, desabafou Anna Maria.
Para acrescentar: “Foi um enterro lindo, fazendo jus a um chefe de Estado. Foi velado no Salão Negro do Senado, sua casa, a casa dele era o Senado. Então, gostei muito da homenagem que ele recebeu. A ida a Pernambuco não ia alterar em nada a devoção dele e nossa pelo Estado”. Para Gisela, filha primogênita, a mãe tomou a melhor decisão. “Mamãe não pretende sair mais de Brasília. Quando morrer, ela quer ser enterrada do mesmo jazigo do meu pai, assim a gente entendeu”, declarou.
Diante da minha insistência, no longo depoimento que colhi de Anna Maria sobre a trajetória, agonia e morte de Marco Maciel, quanto ao fato de que os pernambucanos não alimentavam o desejo de velar o corpo do seu ex-governador, respondeu: “Sinceramente, não sei. Seria mais doloroso para mim ainda. Ele iria ter que ser preparado, seu corpo embalsamado. Então, eu, em comum acordo com os filhos, quis simplificar e assim foi. Seu corpo está no Campo da Esperança, no lugar destinado às autoridades, um lugar bonito. Eu vou lá uma vez por semana. A gente mantém essas tradições”.
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Na última eleição que disputou e perdeu, a do Senado, em 2010, Marco Maciel preparou dois discursos para a coletiva pós resultado, o da derrota e o da vitória.
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