O senhor foi presidente da Câmara há 20 anos. Como avalia os debates de hoje e da atual geração de parlamentares?
Não vou julgar os deputados, vou julgar o debate como acontece. Antigamente, você tinha um debate econômico com muitas diferenças, muitas divergências, mas com muito respeito. O que vejo hoje é que não se consegue discutir cinco minutos no Congresso sem ameaça de agressão física, sem o nível do debate ser rebaixado até tornar-se quase insuportável. Eu acho que isso descredencia, não apenas a Câmara dos Deputados, mas o poder político.
Tem como mudar isso?
A política vem perdendo credibilidade junto à população, porque não discutem em nível elevado, não tratam dos temas de interesse da população. É cada um com o celular querendo três minutos para publicar numa rede social. Eu acho que isso é o que deve mudar no Congresso Nacional. Tem que recuperar o trabalho das comissões, o debate, os temas. Hoje as pessoas não querem debater, querem uma promoção rápida, uma visibilidade nas redes sociais. Isso só reduz a autoridade da política e eleva a autoridade daqueles que disputam com a política o destino humano.
Isso motiva o Poder Judiciário a legislar, como acusa uma parcela de parlamentares?
Se a política renuncia a discutir o destino da sociedade, entrega a uma corporação, que é o Judiciário, principalmente ao STF, essa atribuição. E o Supremo não está preparado para isso, porque não é poder político, não está interessado em ouvir ninguém, em fazer audiência pública. São onze pessoas, que deveriam estar decidindo aquilo que é constitucional ou não. Mas o Supremo entrou na política e ganhou muita autoridade em função da perda de prestígio da própria política.
Recentemente foi divulgado um atrito entre o senhor e o ministro Alexandre de Moraes. Teve receio de sair preso dali?
Não tive receio, assim como não tive quando era oposição e fazia passeata contra o governo militar. Eu estava fazendo uma interpretação da língua portuguesa, houve uma certa provocação (por parte do ministro) e eu disse que não ia admitir censura. Isso não caracteriza uma afronta ao Supremo, mas é o país que temos hoje. Então você tem que recolocar em outro padrão a relação entre os poderes, porque senão isso não vai terminar bem.
O senhor tem dirigido algumas críticas à ministra Marina Silva. Ela atrapalha o governo?
A Marina atrapalha desde o primeiro governo Lula. Quando eu era ministro, o presidente queixou-se da demora nos licenciamentos para obras em Rondônia. Eu falei que não saíam porque quem mandava no Ministério do Meio Ambiente era um comitê de 50 ONGs. Dias depois, Marina pediu demissão. Agora ela diz que a Amazônia é um paraíso, só que ela não quis ficar nele. Ela foi atrás do conforto de São Paulo, abandonou o paraíso, assim como fez Eva (risos). E fazendo o jogo das ONGs.
Como assim?
Convivendo confortavelmente com aquelas madames da Faria Lima, as ricaças que ajudam ela nas eleições, enquanto a população da Amazônia vive sem poder criar uma vaca, sem recurso nenhum, acumulando os piores indicadores sociais do país. Isso é uma coisa absurda.
E por que o presidente a mantém?
Por causa dos acordos internacionais que permitiram que ele ganhasse a eleição. Partido Democrata, Emmanuel Macron, os ambientalistas europeus… O Lula é muito pragmático. Ele diz que se o preço que tem que pagar para se eleger é engolir sapo, então está tudo bem, não tem problema nenhum. Porque ele sempre fez isso.
E quanto à COP-30 no Brasil, qual sua visão?
É uma armadilha contra o Brasil. Se tivesse essa importância toda, você acha que o país mais poderoso do Mundo ia se retirar do Acordo de Paris? Os Estados Unidos só se retiram de algo que não tem importância. Quando tem, eles tiram os outros para ficarem sozinhos. Isso mostra que essa agenda é voltada contra o Brasil. Nenhum país no mundo está disposto a cumprir as metas das reduções de gases de efeito estufa. Eles querem convencer o Brasil a transformar a Amazônia na reserva mundial de crédito de carbono, para sequestrar o carbono emitido pelos ricos, condenando a nossa população à pobreza.
O mundo do meio ambiente é dominado por ONGs?
É um cartel das ONGs. A agenda é delas e o Brasil está no alvo. Nunca vi tanta ONG e tantos bilhões de financiamento para elas. E para bloquear principalmente a Amazônia brasileira.
O governo tem tentado uma aproximação com o agronegócio, que tem sido muito crítico. Qual é a dificuldade?
No primeiro governo do presidente Lula, o ministro da Agricultura era uma grande liderança da agropecuária, da agroindústria, que era Roberto Rodrigues. Não havia dificuldade na relação. Fizemos juntos o projeto de lei que legalizou a pesquisa, a comercialização de organismo geneticamente modificado, a Lei dos Estrangeiros da qual fui relator. Ainda no governo da presidente Dilma, fizemos o Código Florestal. Havia uma tensão, mas havia diálogo. Depois houve apenas hostilidade. A ministra (Marina) vai ao Senado e chama o agro de ‘ogro’.
Não havia essa questão antes?
Não, isso é agora, neste governo, com orientação do Ministério do Meio Ambiente e do Ministério dos Povos Indígenas. A palavra certa é ‘desantropizar’, deixar uma Amazônia desabitada, que não tenha gente, um deserto humano, porque as pessoas já têm dificuldade de sobreviver ali e começa uma hostilidade. O governo está transformando a agricultura e a criação em atividade criminosa. Só vai restar uma atividade verdadeiramente criminosa, que é o narcotráfico e que já está começando a predominar em várias áreas, principalmente de fronteira.
O senhor passou muitos anos no PCdoB, uma sigla mais dogmática, e hoje está no MDB. Como é estar num partido que consegue ser governo, oposição e independente ao mesmo tempo?
Eu fico do lado do MDB. O partido é muito heterogêneo. Claro que tenho muitas críticas ao governo, principalmente a esse setor ambientalista que para o país. O MDB vai procurar um caminho para 2026. Que já procurou em 2022, quando apresentou candidatura própria. Porque de fato é difícil reunir uma maioria dentro do partido, seja para apoiar ou fazer oposição a um governo.
Há alternativas além da direita e de Lula?
Creio que sim, que o país vai sendo tomado por um sentimento de rejeição a essa polarização. Ela não resolve nada. Você vai dividir o país entre esquerda e direita? A população nem sabe direito o que é isso. Você tem conflitos, tem contradições que precisam ser administradas, mas os problemas unem o país. Minha impressão, viajando pelo Brasil inteiro, é que há um cansaço e as pessoas vão procurar quem trate da solução. Quem é responsável pela confusão já esgotou o arsenal e os argumentos.
O ex-comunista Aldo Rebelo é hoje um homem de direita?
Eu não tenho nenhum arrependimento do meu passado, fui coerente em tudo aquilo que fiz. Defendi os interesses nacionais, a democracia, os direitos sociais, dos trabalhadores e a liberdade. Eu defendia a anistia no passado e defendo no presente. Só que hoje os que defenderam no passado acham que aquela era justa e que a de hoje não é. Fui contra a censura no passado e continuo sendo contra. Então quem mudou na verdade foram aqueles que conviveram comigo na esquerda, que abandonaram o nacionalismo, a defesa dos mais pobres, para defender grupos sociais específicos.
A esquerda argumenta que a anistia ao 8 de janeiro abriria caminho para uma futura tentativa de golpe. Discorda desse argumento?
Vamos para a história. Nós tivemos anistia em momentos cruciais da vida do país. Anistiamos o golpe inteiro de 1964. E ali não foi uma tentativa fracassada, foi um golpe vitorioso. Quem foi punido pelo golpe de 1964? Todos foram anistiados. O PT diz que a queda da Dilma foi um golpe, sustenta até hoje. Quem foi punido, se foi um golpe? Eu acho que não foi, mas o PT acha que foi. Os golpistas vitoriosos se juntaram para punir os golpistas derrotados? Isso é conversa, é uma narrativa tola.
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