Caso o Supremo decida por retroagir, perdem o mandato imediatamente os deputados Augusto Pupio (MDB-AP), Gilvan Máximo (Republicanos-DF), Lázaro Botelho (PP-TO), Lebrão (União Brasil-RO), Professora Goreth (PDT-AP), Silvia Waiãpi (PL-AP) e Sonize Barbosa (PL-AP). Quatro deles são do Amapá de Alcolumbre.
Nesse caso, eles seriam substituídos por aliados do presidente do Senado, que ampliaria seu domínio sobre a bancada e o tabuleiro político local.
A possibilidade de os parlamentares perderem o cargo preocupa o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), que tem feito uma peregrinação pelos gabinetes dos ministros do STF para convencê-los a preservar o mandato dos colegas, e não interferir na composição da Câmara, definida em eleição ocorrida em 2022.
O cálculo da discórdia
A controvérsia no Supremo gira em torno das sobras eleitorais, que são as vagas que restam depois da divisão pelo quociente eleitoral — um índice que é calculado a partir do número de votos recebidos e das vagas disponíveis. Uma lei de 2021 estabeleceu que só pode disputar as sobras o partido que tiver ao menos 80% do quociente eleitoral, e os candidatos que tenham obtido votos de ao menos 20% desse quociente.
Em 2022, três partidos – Rede, PSB e Podemos – alegaram ao Supremo que a mudança na regra feriu o pluralismo político e a igualdade de chances. O STF concordou com o argumento das siglas e invalidou as regras, por 7 a 4, em julgamento concluído em fevereiro do ano passado. Para a Corte, todas as legendas podem participar da divisão das sobras.
Em uma segunda votação naquele mesmo julgamento, com placar mais apertado (6 a 5), a Corte decidiu que o entendimento só deveria valer a partir de 2024, o que preservaria o mandato dos atuais parlamentares. Ou seja: a regra que os beneficiou foi anulada, mas eles seriam “poupados” porque a decisão do STF não teria efeitos retroativos – esse ponto da decisão contrariou Alcolumbre.
O julgamento opôs a atual presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Cármen Lúcia, e o seu antecessor no comando da Corte Eleitoral, Alexandre de Moraes – enquanto Cármen votou para preservar o mandato dos sete parlamentares ameaçados, Moraes defendeu a anulação da posse deles.
Reviravolta
Agora, o plenário do Supremo volta a se reunir para discutir um recurso dos partidos que moveram as ações, que tem o objetivo de garantir a aplicação imediata da decisão da Corte. Na prática, isso levaria à perda do mandato dos sete parlamentares beneficiados pela regra que já foi considerada inconstitucional pelo STF.
A peça-chave do novo julgamento é o ministro Cristiano Zanin Martins, indicado ao cargo pelo presidente Lula, que vai votar no lugar do antigo relator do caso, Ricardo Lewandowski.
Atual ministro da Justiça de Lula, Lewandowski votou a favor de a decisão do STF só valer a partir de 2024, posição que acabou prevalecendo por maioria apertada – mas, na análise do recurso, Zanin já sinalizou que defende a aplicação imediata do entendimento da Corte, o que abre caminho para uma reviravolta no caso.
Isso porque o julgamento do recurso das legendas foi iniciado em junho de 2024 no plenário virtual da Corte, uma plataforma digital que permite a análise de casos sem que os ministros precisem se reunir presencialmente – e longe das transmissões ao vivo da TV Justiça.
Na ocasião, Zanin e outros cinco ministros – Moraes, Flávio Dino e três integrantes da ala chamada “Centrão do STF”, Gilmar Mendes, Kassio Nunes Marques e Dias Toffoli – votaram a favor da aplicação imediata da decisão do STF e da anulação da eleição dos sete deputados federais, indicando uma maioria a favor da mudança na composição da Câmara.
Mas a análise acabou interrompida à época por um pedido de destaque de André Mendonça, que tirou o caso do ambiente online e trouxe a discussão para o plenário físico da Corte, onde o julgamento do recurso será reiniciado do zero. Mendonça foi indicado ao STF por Jair Bolsonaro, cujo partido, o PL, corre o risco de perder duas cadeiras.
‘Precedente perigoso’
No memorial entregue aos ministros do STF, obtido pelo blog, a equipe jurídica dos parlamentares ameaçados afirma que a aplicação imediata da decisão abre um “precedente perigoso” e alega que o recurso das legendas tem “a nítida pretensão de rediscutir o mérito” de uma questão já julgada pelo STF.
“Toda e qualquer alteração do processo eleitoral, ainda que, em tese, venha para aperfeiçoá-lo, está submetida à cláusula da anualidade, precisamente em atenção à segurança jurídica eleitoral qualificada e à proteção de legítimas expectativas dos participantes do pleito”, diz o texto.
Para um influente interlocutor de Motta ouvido reservadamente pela equipe da coluna, “não dá para mexer com a regra do jogo, com o jogo concluído pela Justiça Eleitoral”. “A regra é a de que toda alteração eleitoral só vale para o futuro, justamente para evitar alterações casuísticas.”
Do outro lado, o PSB sustenta que o Supremo, para preservar o mandato dos atuais parlamentares, seriam necessários, no mínimo, oito votos para “modular” os efeitos da decisão, ou seja, para não retroagir.
“Isso porque o art. 27 da Lei nº. 9.868/1999 (que trata do julgamento de ação direta de inconstitucionalidade pelo STF) exige quórum qualificado de 2/3 (dois terços) para a modulação dos efeitos de decisões que declarem inconstitucionalidade em sede de controle concentrado, o que não foi observado”, sustenta a sigla, que seria diretamente beneficiada com a perda do mandato dos sete parlamentares.
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