Por Marcelo Tognozzi
Colunista do Poder360
Lula fez um movimento para dentro. Quer Gleisi Hoffmann ministra cuidando da articulação política, está resgatando o PSB do prefeito do Recife João Campos, hoje a liderança mais representativa da renovação política. Sinalizou desejar Tabata Amaral no governo, trocou Nísia Trindade por Alexandre Padilha. No fundo, esse mexe remexe não significa nada de novo. A realidade pouco mudou.
O presidente pastoreia à esquerda. Pensa em levar Guilherme Boulos para o ministério. O centro e a direita civilizada torcem o nariz para Gleisi e Boulos. Neste Lula 3, onde tudo parece dar errado, inflação dos alimentos correndo solta, aumento da rejeição entre os mais pobres e um mundo se transformando velozmente, o movimento do presidente sinaliza o esvaziamento da sua base política no Congresso.
A reforma ministerial durará um ano. No início de 2026, haverá revoada de ministros rumo às campanhas e, novamente, o presidente terá de preencher seus 38 ministérios ou a maioria deles, desta vez com gente sem futuro político.
Leia maisO Centrão, que é governo não importe quem governe, já emitiu sinais. Não falo do senador Ciro Nogueira (PP-PI), ex-ministro de Bolsonaro e que não apoiou Lula nem depois da posse. Ciro é do Nordeste, região conhecida por votar maciçamente em Lula. Ele, assim como outro líder importante do PP como o paraibano Agnaldo Ribeiro, sabe que dificilmente Lula conseguirá reverter este momento ruim com mais do mesmo.
O governo Lula 3 é a cara do presidente, do PT e do Supremo, seu principal aliado. Sem Supremo, o governo Lula estaria de cadeira de rodas. Até as pedras da Praça dos Três Poderes sabem disso. Ele agora age como se estivesse em busca do tempo perdido. Mas parece não ter pressa.
Faltando menos de dois anos para a eleição presidencial, Lula perdeu o timing da reforma ministerial e conseguiu até aqui um resultado pior do que outros governos que caíram em desgraça e tentaram se salvar mudando o ministério, como os de Fernando Collor e Dilma Rousseff. Quanto mais o presidente mexe, quanto mais ele fala, quanto mais solta as rédeas do seu marketing político, pior fica.
A pior coisa que pode acontecer a um governante é exercer o poder num tempo que não é mais o seu. Desconectado. Vivemos isso com Getúlio Vargas nos anos 1950. O tempo de Lula passou e ele parece não ter se dado conta, mas o eleitor sabe muito bem o que se passa quando registra nas pesquisas que tanto o governo como o desempenho do presidente são ruins.
Um presidente que conseguiu perder o protagonismo internacional para ele mesmo, sem ter sido obscurecido por ninguém a não ser sua diplomacia confusa e perdida, como se ela também não pertencesse a este tempo, mas a outro que ficou lá atrás, 30, 40 anos. Erraram ao atacar Israel e xingar Elon Musk, hoje um dos principais ministros de Donald Trump. Erram ao abraçar terroristas e governos sem o menor apreço pelos valores da nossa sociedade cristã, maioria do eleitorado, gostemos ou não.
Lula é o político mais velho em atividade, mas não é o mais sábio. Isso está claro para o eleitor comum, especialmente pela diferença da agenda que separa o presidente e seus companheiros mais próximos daquela desejada pela população. O cabo de guerra com o Banco Central, pura teimosia, acabou criando mais inflação e quando a passagem sobe, a comida sobe e o salário não sobe, a raiva cresce.
O governo erra quando não admite ouvir falar em anistia para os presos do 8 de Janeiro. Este governo aí está graças a anistia de 1979, a qual trouxe de volta ao Brasil políticos como José Dirceu e tirou da cadeia pessoas como José Genoino e Dilma Rousseff. Eles participaram da luta armada, enquanto os vândalos do 8 de Janeiro nem armas tinham.
Por que a anistia foi boa para uns e não pode ser para outros? Este tipo de atitude só serve para dividir mais o país, aprofundar a polarização, estimular o confronto, quando a aposta deveria ser na pacificação.
A polarização só beneficia Bolsonaro e seu grupo. Bolsonaro, por sinal, cada vez mais napoleônico, criando uma dinastia com filhos e parentes, porque se não for Bolsonaro não serve para manter vivo o bolsonarismo. Napoleão também nomeou a parentada toda, até o irmão virou rei da Espanha, e o fim desta história todo mundo conhece, aconteceu em Waterloo, nos campos da Bélgica. Todo Napoleão tem sua Waterloo e todo Getúlio Vargas tem seu Gregório Fortunato.
As pesquisas mostram piora na vida para a maioria das pessoas. Questões como educação, segurança e saúde foram pessimamente administradas neste governo de salvação nacional. Magno Martins, campeão de audiência no sertão, mostrou a volta dos linchamentos, da justiça feita pelas próprias mãos de um povo cansado da insegurança, descrente na Justiça. Os linchamentos são um sintoma da revolta popular.
No início dos anos 1990, quando eu dirigia a sucursal de Salvador do Jornal do Brasil, produzi com a repórter Marcia Gomes uma reportagem na qual entrevistamos um homem que escapara do linchamento e populares que o lincharam. Nunca esqueci da raiva e da revolta pela falta de justiça. A reportagem ganhou repercussão internacional.
Lula está se fechando nele mesmo, no PT e na esquerda. Seus apoiadores são 30% do eleitorado, se muito. Este caminho de ciscar para dentro não provou ser uma boa estratégia, por excludente. Lula e o PT ainda têm pelo menos 18 meses até as campanhas ganharem as ruas. Esta é uma agenda inadiável, repleta de imponderável e a realidade, dizia Marcel Proust, é a mais hábil das inimigas.
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