Por Ângelo Castelo Branco*
Um episódio digno de figurar nas páginas do realismo fantástico latino-americano marcou a vida do renomado jornalista José de Souza Alencar, Alex, um ícone da crônica social no Brasil. Discreto, elegante e avesso à política, Alex se destacou tanto por suas colunas no Jornal do Commercio quanto pela apresentação do programa Hora do Coquetel, exibido nas tardes de domingo dos anos 60 pela TV Jornal do Commercio.
Neste espaço, entrevistava personalidades do cenário social e intelectual de Pernambuco. Em 1963, o general Humberto de Alencar Castello Branco, então comandante do IV Exército, e sua esposa, Dona Argentina, cultivavam amizade com Alex. Frequentavam juntos restaurantes do Recife, onde compartilhavam conversas sobre literatura brasileira e francesa.
Leia maisCastello Branco era um estudioso da obra de Machado de Assis. Naquela época, a saúde de Dona Argentina já inspirava preocupação. Apesar dos cuidados do renomado médico Ovídio Montenegro, sua deficiência cardíaca se agravou, culminando em seu falecimento em 23 de agosto de 1963.
Poucos meses depois, em março de 1964, Castello Branco assumiu a Presidência do Brasil. Nesse meio-tempo, circularam rumores de que o agora viúvo mantinha uma relação de amizade com uma professora da Universidade do Recife. Alex, sempre atento ao burburinho social, mencionou o fato em sua coluna, sugerindo que a primeira visita oficial do presidente poderia ter uma motivação afetiva.
A nota chegou ao Palácio do Planalto, e o introspectivo general ponderou entre duas estratégias: desmentir a informação ou ignorá-la para minimizar as especulações. No entanto, nos escalões militares locais do Recife, a matéria foi tratada de maneira abrupta e violenta, desencadeando um grotesco episódio que reverberou nas redações jornalísticas e chocou a cidade.
Na noite de 20 de maio de 1964, ao sair da redação do Jornal do Commercio, Alex foi sequestrado na calçada da Rua do Imperador. Um grupo de homens o forçou a entrar em uma caminhonete e, com os olhos vendados, ele foi levado a uma cela de quartel. Apavorado, acreditou que seria morto.
Em meio à tensão, permitiram-lhe telefonar para a mãe e alguns amigos, informando sua prisão. Na manhã seguinte, foi submetido a um interrogatório absurdo e, em seguida, liberado, ainda em estado de choque.
Semanas após o ocorrido, o presidente Castello Branco visitou o Recife. Na madrugada do evento, Alex recebeu uma inesperada ligação. Do outro lado da linha, ouviu a voz do marechal:
— Gostaria de vê-lo no almoço que me será oferecido no Clube Português.
Alex aceitou o convite e, ao comparecer à recepção, fez questão de encarar os militares que haviam ordenado sua violenta prisão. Em um gesto de coragem, relatou, em voz alta e diante de convidados, os detalhes da conversa que tivera com o presidente sobre o lamentável episódio, constrangendo os responsáveis.
Alex faleceu em 24 de janeiro de 2015, aos 88 anos, após mais de três décadas assinando a coluna social do Jornal do Commercio e deixando um legado indissociável da história jornalística pernambucana.
*Jornalista
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