Por José Adalbertovsky Ribeiro*
MONTANHAS DA JAQUEIRA – Pintará uma química na cabeça dos donos do Brazil para ser decretado um cessar-fogo na Faixa de Gaza em Brasília? Os conservadores aguardam a abertura do mar vermelho no Congresso Nacional da Palestina para receber ajuda humanitária da anistia.
As forças de defesa de Israel, aliás, as forças de defesa da democracia relativa lançam ogivas nucleares contra os combatentes da anistia irrestrita, no entendimento de que os pichadores da estátua da liberdade relativa e vândalos que invadiram os santuários da democracia relativa devem ser exterminados ou condenados à prisão perpétua com tornozeleiras high-tech e sem colher de chá.
Leia maisNevermore, nunca mais, eis a sentença do corvo no poema de Edgar Alan Põe, enquanto o poeta enlutado chora a perda de sua amada Lenore. Os donos do poder repetem hoje as palavras do corvo em alusão à anistia ampla, geral e irrestrita como sendo uma visão do passado retida nas névoas da memória. Carlos Lacerda era chamado de corvo, o bicho que atormentava o presidente Getúlio Vargas na década de 1950. Elvis vive, os corvos também estão vivos.
Nevermore anistia, dizem os novos corvos, porque crimes dos que invadiram os santuários democráticos não podem ser perdoados jamais. Onde está escrito sobre esses crimes perpétuos? Mistérios do além. Painho perdeu o dedo mindinho, foi perdoado, indenizado e glorificado antes de ser mumificado. O dedo mindinho (até tu, bruto!) hoje contesta as indulgências concedidas aos presos condenados, aos cassados e exilados políticos concedidas pelos generais Geisel e Figueiredo em 1979. Os devotos da seita vermelha seguem na mesma toada.
Nos tempos de antanho, promover guerrilhas, tipo do Araguaia, sequestrar embaixadores, roubar armas nos quartéis e entrar na luta armada para a tomada de poder, isto sim era considerado atos em defesa da democracia. Rodou a catraca do tempo, o barão vermelho assumiu o poder, e acabou-se o que era doce.
Eu sou você ontem, dizem os conservadores. Eles estavam operando no modo analógico, do passado. Foram submetidos a um exame de densitometria óssea. Você está padecendo de osteoporose. Seus ossos estão se desmilinguindo, se dissolvendo feito sorvete, disseram. Não seja por isso. A direita produziu um sorvete para refrescar a memória da geração Y, a geração digital, e das esquerdas beneficiárias do perdão político no passado.
De tal modo os sorveteiros vermelhos recomendam o tratamento da dosimetria, em doses homeopáticas, em substituição ao sorvete da direita. Seria uma receita homeopática.
A anistia homeopática faz lembrar os reclames das “Pílulas de vida do Dr. Ross, pequeninas, mas resolvem”, nas décadas de 1940 e 1950, eram indicadas para prisão de ventre, nó nas tripas, depuração do sangue, lombrigas, mau olhado e dor na coluna. Curava até dor de cotovelo. Saudades das pílulas do Dr. Ross! O Brazil padece da síndrome do coração partido (takotsubo, no jargão dos cardiologistas). As pílulas de vida do Dr. Ross, sabor anis, seriam um santo remédio.
*Periodista, escritor e quase poeta
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