Por Rayanderson Guerra
Do Estadão
Inelegível até 2030, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) mantém a narrativa de que será candidato à Presidência da República em 2026. Aliados do ex-chefe do Executivo dizem que Bolsonaro aposta na mudança de composição no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no próximo ano para reverter a inelegibilidade e reaver os direitos políticos a tempo do próximo pleito. A tese é avaliada como improvável por especialistas em Direito Eleitoral consultados pelo Estadão.
Em 2026, o tribunal eleitoral será presidido pelo ministro Kassio Nunes Marques, do Supremo Tribunal Federal (STF), com André Mendonça na vice-presidência – indicados pelo ex-presidente da República.
Os ministros indicados por Bolsonaro integram a “ala conservadora” do TSE, que conta ainda com a ministra Isabel Gallotti. Formado por, no mínimo, sete ministros – três do STF, dois do STJ e dois juristas provenientes da advocacia – o tribunal eleitoral contará, em 2026, com Dias Toffoli, na terceira vaga reservada ao Supremo, Antonio Carlos Ferreira e Villas Bôas Cueva, do STJ, e dois nomes indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
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Mudança de composição no TSE
As mudanças no TSE vêm sendo mencionadas pelo ex-presidente Bolsonaro desde o ano passado. No evento de direita que ocorreu em Balneário Camboriú (SC), em julho, Bolsonaro expressou ter esperança que a nova composição do Tribunal o beneficie e disse que assim será possível “fazer uma história melhor para todos nós”. No evento da cúpula direitista, o ex-chefe do Executivo também sinalizou que não desistirá de disputar as eleições de 2026, mesmo inelegível no momento.
O sistema de escolha entre os ministros do STF e do STJ é de rodízio. Assume a vaga no TSE o ministro mais antigo que ainda não integrou a corte eleitoral. O mandato é de dois anos, renováveis por mais dois. No caso de ministros do STJ, o mandato é de apenas um ano.
O advogado Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral, avalia como pouco provável uma reversão das condenações impostas ao ex-presidente pelo TSE. Segundo Rollo, um dos únicos caminhos possíveis para Bolsonaro é o recurso em tramitação no STF, apesar de uma vitória improvável na Suprema Corte.
“Já há a condenação no TSE em dois processos. Nesses processos, cabe recurso ao STF. O que significa que, para efeito de TSE, nesses dois processos já não não dá para fazer nada, porque o processo já foi julgado. Então sobra só o STF, o recurso extraordinário. Lembrando que são 11 ministros no STF, sendo que três já votaram no TSE. Em tese, ele (Bolsonaro) já sai no STF e perdendo de 2 a 1. Sobram oito votos. Dá para ganhar no STF? Matematicamente, sim, mas juridicamente, acho muito difícil”, afirma Rollo.
Recursos ao STF
Bolsonaro foi condenado pelo TSE em três ocasiões, e duas sentenças seguem em vigor. Uma delas foi cancelada porque o colegiado já havia decidido sobre o mesmo fato. Não há soma no tempo das condenações, portanto, pela lei, as penalidades impedem que o ex-presidente volte a concorrer a cargos eletivos até 2030.
Em junho de 2023, a Corte Eleitoral condenou Bolsonaro por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, pela reunião com embaixadores em que ele atacou o sistema eleitoral do País, sem apresentar nenhuma prova. Em outubro do mesmo ano, foi condenado mais uma vez, por abuso de poder político durante o feriado do 7 de Setembro em 2022, por usar a data para fazer campanha eleitoral, segundo o entendimento dos magistrados.
O ex-presidente recorreu primeiro ao TSE, que manteve a condenação. O recurso no Supremo Tribunal Federal é a última chance de anular o julgamento. A perspectiva de vitória, no entanto, é considerada remota. Dois ministros que votaram para cassar seus direitos políticos – Cármen Lúcia e Alexandre de Moraes – compõem também o plenário do STF. Além disso, historicamente, o Supremo tem sido deferente aos julgamentos da Justiça Eleitoral.
Ação rescisória no TSE
Uma possibilidade teórica de reversão das condenações no TSE é a apresentação pela defesa de Bolsonaro de uma ação rescisória ao tribunal eleitoral. A ação é prevista no artigo 22 do Código Eleitoral. “Compete ao Tribunal Superior: I – Processar e julgar originariamente: j) a ação rescisória, nos casos de inelegibilidade, desde que intentada dentro de cento e vinte dias de decisão irrecorrível, possibilitando-se o exercício do mandato eletivo até o seu trânsito em julgado”.
A ação permitiria rever a condenação transitada em julgado, quando não há mais recursos possíveis. A aplicação no caso de Bolsonaro, no entanto, é vista como “improvável”.
“Eu não vejo nenhuma possibilidade jurídica disso acontecer, a menos que o TSE modifique completamente a sua própria jurisprudência. Bolsonaro foi condenado pelo plenário. É ilusório e pura retórica eleitoral considerá-lo como candidato. E como a última palavra em direito eleitoral é dada pelo TSE, restaram apenas argumentos genéricos ao ex-presidente no recurso ao STF, razão pela qual não vejo como factível uma reversão naquela Corte”, diz Renato Ribeiro, coordenador acadêmico da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep).
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