Capítulo final
Ao longo dos últimos dois meses, intercalando a estressante rotina de editar um blog e ancorar um programa de rádio pela Rede Nordeste de Rádio, o Frente a Frente, queimei as pestanas na história de Marco Maciel. Em seu Estado natal, ele passou à história como o Marco de Pernambuco, em razão do governo desenvolvimentista que empreendeu entre 1979 a 1982.
No País, políticos dos mais diversos matizes ideológicos o batizaram de “Maestro da transição”, pela formidável contribuição que deu, como articulador político, para levar o Brasil ao reencontro com a democracia. Não apenas li muito, fui atrás também de personagens que conviveram com Marco Maciel por muito tempo, desde a sua família – Anna Maria, a viúva e os filhos Gisela, Cristiane e João Maurício – aos amigos mais próximos que construiu ao longo de uma vida pública de mais de meio século, sem nenhum arranhão em sua biografia.
Leia maisEntrevistei o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, de quem Marco Maciel foi vice em dois mandatos; o ex-presidente Sarney, que assumiu o País numa circunstância dramática, a morte de Tancredo Neves, num processo liderado por Maciel, Ulysses Guimarães e Fernando Lyra; o ex-ministro Jorge Bornhausen, um dos amigos mais fiéis do ex-senador, que o sucedeu no MEC e na presidência do PFL; Vilmar Rocha, ex-deputado federal por Goiás, outro grande amigo dele, além de personalidades de esquerda, como o ex-governador do DF, Cristovam Buarque.
Também fui no encalço de muita gente que trabalhou com Maciel no seu governo e em Brasília, entre os quais Margarida Cantarelli, Silvio Amorim, Aloisio Sotero, Joel de Hollanda, Gustavo Krause, Roberto Pereira, Anchieta Hélcias, Creusa Aragão, Roberto Parreira, Otávio Veríssimo, Ângelo Castelo Branco, Jorge Cavalcanti, José Jorge, dentre outros. Cada um ajudou no que esteve ao seu alcance na remontagem de fatos e episódios que marcaram fortemente a trajetória de um homem que, segundo Gustavo Krause, era a quase perfeição do gênero humano.
Entre todas as portas que bati, a mais preciosa, sem dúvida, foi a da socióloga Anna Maria Maciel, viúva de Marco Maciel. Aos 81 anos, um ano mais jovem que o grande amor da sua vida, com quem viveu 54 anos, entre amizade, namoro, noivado e casamento, Anna guardou tudo que foi possível dele: fotos, bilhetes, vídeos, reportagens e até a sua coleção de selos, talvez o único hobby de um homem que fez política por vocação e que abraçou a vida pública com elevado temor pelos maus feitos.
Anna guardou, sobretudo, as histórias de Marco Maciel na memória. Causos muito mais da relação de amor e família do que muito do que ele viveu na política, porque nem a ela, a quem confiava cegamente, o maestro da transição revelava seus segredos de Estado. Mas os estadistas são assim: levam os segredos para o túmulo. “E ele levou muitos, porque se você tivesse uma conversa com Marco Antônio se encerrava ali, ninguém tomava conhecimento. Nem a mim ele contava”, diz ela.
Anna Maria gravou um longo depoimento sobre a dor, agonia e morte de Marco Maciel. Como se trata de algo muito valioso e impactante, resolvi fazer a sua reprodução apenas no livro “O estilo Marco Maciel”, resultado deste trabalho em cima do resgate da história do personagem. Durante longos dez anos, de 2011, quando Maciel foi diagnosticado com o mal de Alzheimer, até 2021, ano da morte dele, Anna viu o mundo desabar em sua vida.
Foi, ao mesmo tempo, esposa, mãe e cuidadora. Nas horas da agonia, virou enfermeira. A doença fez Marco Maciel perder tudo: a boa memória, a capacidade de se locomover e a fala. “Sofri muito para aprender a lidar com os efeitos da enfermidade. Foi doloroso ver um homem que se expressava tão bem silenciar de uma hora para outra, e quando tentava falar, não ser compreensível”, relatou.
Anna largou tudo para se dedicar ao marido, desta feita como um paciente que exigia os melhores cuidados, todas as atenções ao longo das 24 horas do dia. Buscou saídas que pudessem minimizar o sofrimento do marido, como uma cadeira de rodas mais confortável. Recorreu aos melhores médicos especialistas na enfermidade.
Perdeu seguidas noites de sono em hospitais numa frequência de internações que pareciam intermináveis até o dia em que viu o marido entrar numa UTI e nunca mais voltar para casa, depois de 90 dias de agonia. “As fases iam se alternando de mal para pior. Nunca vi uma doença tão terrível”, desabafou. O resto, eu conto no livro, que sairá em breve, com prefácio de Jorge Bornhausen e orelha do jornalista Marcelo Tognozzi, de Brasília.
O mal de Alzheimer é uma doença de lenta e progressiva evolução, que destrói as funções mentais importantes, levando o paciente à demência, um termo usado para indicar que o indivíduo perdeu suas capacidades de raciocínio, julgamento e memória, tornando-o dependente de apoio nas suas atividades diárias.
Na doença de Alzheimer, os neurônios e suas conexões se degeneram e morrem, causando atrofia cerebral e declínio global na função mental. Apesar de já ter diversos fatores de risco conhecidos, a exata causa do mal de Alzheimer ainda é um mistério. Acredita-se que o acúmulo nos neurônios de uma proteína chamada beta amiloide e de outra chamada tau seja o fator responsável pelo desencadeamento da doença.
Segundo a literatura médica, o porquê destas substâncias se acumularem em umas pessoas e não em outras ainda precisa ser elucidado. Como não há cura para a doença de Alzheimer, o diagnóstico precoce é importante para se tentar preservar ao máximo as capacidades intelectuais e prolongar a qualidade de vida do paciente e de seus cuidadores.
Além da idade avançada, outro fator de risco importante é a história familiar. Pessoas com familiares de primeiro grau com Alzheimer apresentam maior risco de também tê-lo, evidenciando um papel importante da carga genética. O mal de Alzheimer é duas vezes mais comum em negros do que em brancos; também é mais comum em mulheres do que em homens.
Alguns outros fatores também parecem aumentar os riscos de desenvolvimento do Alzheimer, entre eles sedentarismo, tabagismo, hipertensão arterial, colesterol elevado, diabetes mellitus e depressão após os 50 anos de idade.
Leia menos