Amorim confraternizando com Vladimir Putin, da Rússia, Kim Jong-un, ditador da Coreia do Norte, e Masoud Pezeshkian, presidente do Irã, em evento no qual as armas nucleares foram as estrelas, é o retrato das cores e alta definição desta nova era. Trump, com sua diplomacia de porrete, vai empurrando aliados históricos dos EUA para a esfera de influência da China e da Rússia.
Usa a Magnitsky para fazer barulho, mas no fundo seu efeito não é tão grande assim. Em 1º de dezembro de 2022, o repórter David Batty, do jornal inglês Guardian, publicou reportagem mostrando como as sanções da Magnitsky tinham mais furos que um queijo suíço.
Ele acessou estudo produzido pelas universidades de Cambridge e do Texas com 5.000 bancos e 7.000 intermediários financeiros de 273 países e jurisdições financeiras de 2020 a 2021. Eles enviaram e-mails para essas instituições a fim de testar a conformidade com as regras destinadas ao combate a lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo, evasão fiscal e aplicação da Lei Magnitsky, a qual permitiu sanções impostas a centenas de pessoas.
Os resultados são surpreendentes: 1 em cada 30 bancos não cumpriu as regras e, descontando os que não responderam aos e-mails, a proporção sobe para 1 em cada 10. De cada 20 intermediários financeiros, 1 não cumpriu. Descontando os que não responderam aos e-mails, a proporção cresce para 1 a cada 6.
O estudo revela a disposição de muitos bancos e financeiras em ajudar clientes a driblar as duras regras da Magnitsky. Alguns agentes financeiros até se propuseram a criar empresas de fachada para facilitar a vida dos futuros clientes. Mesmo depois do início da guerra na Ucrânia, as coisas mudaram pouco. De acordo com o estudo, as instituições financeiras falharam em discriminar clientes de alto e baixo risco.
Jason Sharman, da Universidade de Cambridge, concluiu que a eficácia das sanções é produto da guerra, não da lei. Até a guerra começar, as pessoas de alto risco não eram incomodadas. É óbvio que os punidos vão adquirindo anticorpos, e quanto mais essa lei for aplicada, mais gente irá aprender como escapar. A montanha, mostra o estudo, pariu um rato.
Se olharmos para os países sancionados, percebemos que nada mudou, seja Rússia, Nicarágua, Venezuela ou qualquer outro. Os mesmos atores políticos seguem mandando, sem retorno à normalidade democrática. A oposição vai sendo moída e o melhor exemplo é o da Venezuela, com Edmundo Gonzales, diplomata veterano e candidato permitido, vencedor do pleito, mas impedido de assumir por Maduro, por cuja cabeça Trump promete uma recompensa de US$ 50 milhões.
No Brasil, o ministro Alexandre de Moraes permanece focado no julgamento de Bolsonaro e o STF (Supremo Tribunal Federal) idem. Até agora, o único resultado prático das sanções de Trump foi dar a Lula de presente um discurso nacionalista e um inimigo externo. Vamos sendo segregados enquanto a Argentina negocia o fim do visto para os EUA. Mas essa situação dos hermanos pode durar pouco, até a próxima eleição, se Milei derrapar.
Nada indica que no curto prazo esse cenário será alterado e tudo indica que estamos prestes a ser apresentados a um novo sistema financeiro internacional controlado pelos países onde a Magnitsky não é aceita.
A China já testou com sucesso seu canal financeiro com os Emirados Árabes, quase tão veloz quanto nosso Pix. Mais um pouco e teremos, além dos carros e do e-commerce, cartões de crédito e bancos chineses. E não será só no Brasil, mas em Peru, Chile, Uruguai e outros países onde os chineses se estabeleceram com sua força econômica.
Tudo caminha para a manutenção do nosso atual status quo, com a polarização acesa e tratada como ativo político, tanto pelo governo quanto pela oposição. Com as sanções, ficou difícil qualquer iniciativa de negociação com o STF, porque o tribunal agora terá de dar alguma coisa. Como não pretende ceder, segue negando qualquer iniciativa que possa pacificar o país.
O governador Tarcísio de Freitas deu um passo na direção da anistia. Tenta negociar com o Congresso e resgatar a conciliação tão ausente do nosso dia a dia há pelo menos uma década. Dificilmente ele conseguirá chegar a um bom termo, porque não tem apoio do Executivo e do Judiciário. Como mostrou a votação do IOF, com o governo perdendo por esmagadora maioria na Câmara e no Senado, o STF dará a palavra final.
Da mesma forma que a decisão do Congresso sobre o IOF foi para o lixo, o destino será o mesmo para uma lei de anistia ampla, geral e irrestrita. Um indulto para Bolsonaro terá o mesmo caminho, como já se passou com o presidente Michel Temer em 2018.
Nós não caminhamos para um impasse institucional; já estamos dentro dele. E, dada a ausência de estadistas e líderes conciliadores, vamos ficar neste charco mais tempo do que gostaríamos.
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