A troca de e-mails entre assessores do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e auxiliares do secretário do Tesouro norte-americano, Scott Bessent, mostra que a reunião virtual entre os dois foi cancelada algumas horas após o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) dar uma entrevista ao jornal “O Globo”, prometendo radicalizar suas ações nos Estados Unidos.
Ontem (11), Haddad afirmou, em entrevista ao Estúdio I, da Globonews, que a reunião foi cancelada em função de uma articulação da extrema-direita, sem citar nomes. As informações são do g1.
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As mensagens trocadas não podem ser divulgadas por tratar-se de uma comunicação sigilosa entre dois países, mas o blog teve acesso aos -emails.
Na tarde da segunda-feira (4), o assessor especial de Haddad, Mathias Alencastro, envia um e-mail a três auxiliares do Tesouro americano, pedindo uma reunião naquela semana, no horário mais adequado a Bessent.
Na noite do mesmo dia, um integrante da equipe de Bessent pergunta a Alencastro se Haddad poderia fazer a reunião na quinta-feira (7), entre 16h e 16h20.
Na terça-feira (5), uma auxiliar de Bessent entra em contato para informar que o secretário não poderia fazer a reunião na data confirmada por conflito de agenda e pede que a conversa seja remarcada para quarta-feira (13) desta semana, entre 17h e 17h30. Alencastro informa que Haddad tem disponibilidade para o novo horário.
Na sequência, as equipes alinham aspectos operacionais da conversa. Assessores de Bessent enviam um link do aplicativo Zoom para a reunião virtual, às 19h08 daquele dia.
No dia seguinte, quarta-feira (6), às 10h17 da manhã, a auxiliar de Bessent envia a mensagem abaixo:
“Bom dia! É com grande pesar que informo que a agenda do Secretário não pode acomodar este encontro no momento. O secretário gostaria de remarcar no futuro, quando a agenda dele estiver melhor alinhada. Agradecemos sinceramente a sua compreensão. Obrigada!”
Desde então, não houve nenhuma sinalização da equipe de Bessent para agendar a reunião.
A entrevista de Eduardo Bolsonaro à jornalista Bela Megale, do jornal “O Globo”, foi publicada às 4h da manhã daquele mesmo dia. O deputado afirmou que está levando a prisão domiciliar de Jair Bolsonaro ao conhecimento das autoridades americanas e diz esperar que haja uma reação.
“Não é da tradição do governo Trump receber essa dobrada de aposta do Alexandre de Moraes e nada fazer. O que eles vão fazer, eu não sei. Não sei se isso vai passar pela mesa do Trump ou pelo secretário de Estado dos EUA, Marco Rubio. Espero que haja uma reação nos próximos momentos”, afirmou o parlamentar na entrevista.
A jornalista Maria Cristina Fernandes, comentarista da Globonews, informou, em um artigo desta terça-feira (12) no jornal “Valor”, que uma fonte do Tesouro americano confirmou que havia interesse de Bessent na conversa com Haddad, mas que um “bando de obcecados de extrema-direita” fizeram o secretário mudar de ideia.
Na avaliação do governo brasileiro, construída a partir do diálogo com a equipe do Tesouro, havia disposição de Bessent em negociar. Ele é visto como um “homem de negócios”, mais pragmático do que a média do governo Trump. Além disso, sofre pressão interna dos importadores para que as tarifas que atingem o Brasil sejam revistas.
O secretário foi apresentado por Haddad pelo ex-ministro da Fazenda Armínio Fraga, com quem Bessent tem relação de amizade. Os dois trabalharam juntos no fundo de investimentos do George Soros.
Fontes do governo Lula avaliam que nomes que estão no entorno de Bessent, com perfil ideológico e que foram indicados diretamente por Trump – como o chefe de gabinete, Daniel Katz – podem ter atuado para melar a conversa com Haddad.
Ou seja, na visão do governo, ainda que Eduardo Bolsonaro não tenha influência direta na agenda do secretário do Tesouro, a interlocução da direita bolsonarista com as figuras mais ideológicas do governo Trump é um fator que bloqueia a abertura de negociações.
O fato de Eduardo Bolsonaro ter mandato parlamentar é visto como um elemento que confere certa legitimidade à atuação dele junto à Casa Branca para dificultar as tratativas entre os países.
Há um entendimento consolidado hoje no Palácio do Planalto e no Itamaraty de que não há ninguém habilitado por Trump para negociar e que todas as decisões estão concentradas em apenas um lugar: no salão oval da Casa Branca.
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