O Serviço Geológico do Brasil (SGB) identificou concentrações industriais de fosfato (P₂O₅), urânio (U) e elementos terras raras (ETRs) na Formação Longá, situada na borda oriental da Bacia do Parnaíba, no estado do Piauí. Os dados constam do Informe Técnico nº 28, publicado em novembro de 2025, resultado de mapeamentos e análises laboratoriais conduzidos entre os municípios de Santa Cruz dos Milagres, Valença do Piauí e Picos.
As amostras coletadas apresentam teores de P₂O₅ de até 26,08%, urânio de até 1.268 ppm e ítrio com até 2.188 ppm, além de elevados índices de disprósio, érbio, itérbio e outros ETR pesados. Os valores superam, em muitos casos, os registrados em depósitos sedimentares clássicos, como a Formação Phosphoria (EUA) e as argilas iônicas do sul da China. As informações são do Movimento Econômico.
Leia maisA Formação Longá, de idade Devoniana Superior, compõe parte do Grupo Canindé e é formada por folhelhos silto-argilosos laminados, siltitos e arenitos muito finos. Esses depósitos se desenvolveram em plataforma marinha rasa sob influência de episódios anóxicos, favorecendo a precipitação autigênica de fosfatos e a concentração de metais estratégicos, como urânio e ETRs.
As ocorrências foram identificadas a partir de anomalias radiométricas detectadas com gamaespectrômetro portátil e associadas a horizontes fosfáticos discretos, com espessura inferior a um metro. A equipe técnica detectou continuidade lateral expressiva desses níveis mineralizados, que chegam a se estender por cerca de 3 km e são visíveis inclusive por satélite.
Segundo a geóloga Carolina Reis, do SGB, os dados representam um avanço no conhecimento geológico da região. “A publicação reúne análises detalhadas em múltiplas escalas de ocorrências inéditas de fosforitos associadas a concentrações notáveis de urânio e elementos terras raras (ETRs) na borda leste da Bacia do Parnaíba. Esses dados ampliam o conhecimento sobre o potencial fosfático da região e sugerem viabilidade econômica para essas ocorrências”, afirmou.
Composição mineral e dados geoquímicos da Bacia do Parnaíba
As análises laboratoriais revelaram uma matriz fosfática de colofana (fluorapatita), com presença de concreções uraníferas e óxidos de ferro framboidais. A técnica de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) identificou concreções com até 13% de urânio e teores significativos de zircônio. Os elementos ocorrem integrados à matriz ou concentrados em estruturas concrecionárias.
As amostras apresentam assinaturas geoquímicas de ambientes subóxicos a anóxicos, com índices U/Th superiores a 1,25 e V/Cr acima de 4,25, reforçando o modelo de fosfogênese autigênica sob alta produtividade biológica e baixa diluição terrígena. A colofana observada possui razão Ca/P entre 2,1 e 2,4, compatível com o padrão da fluorapatita economicamente viável.
A geometria estratiforme da ocorrência e a espessura total da Formação Longá — que pode atingir até 200 metros — sustentam a possibilidade de mineralizações repetidas ao longo da coluna estratigráfica. A presença de blocos fosfáticos retrabalhados em diferentes pontos da área reforça essa hipótese. O relatório recomenda sondagens adicionais e modelagem geofísica e geoquímica para delimitação de volumes exploráveis.
Alinhamento com o Plano Nacional de Fertilizantes
O potencial da Formação Longá também se insere no contexto das metas do Plano Nacional de Fertilizantes (PNF), lançado pelo governo federal para reduzir a dependência externa de insumos agrícolas, como o fosfato — atualmente com mais de 85% de importação.
O PNF prevê o mapeamento e incentivo à produção nacional de fertilizantes até 2050, especialmente em regiões com vocação geológica identificada. Nesse sentido, a descoberta no Piauí pode contribuir para a recomposição da segurança alimentar e mineral brasileira, conectando geologia, indústria e política agrícola em um mesmo eixo estratégico.
Produção regional e perspectiva para o Nordeste
A produção brasileira de fosfato é liderada por Minas Gerais e Goiás. No Nordeste, não há minas de grande porte ativas para esse insumo ou para ETRs. Dados da ANM apontam que o Piauí registrou aumento de requerimentos de pesquisa mineral nos últimos anos, com foco em minerais estratégicos.
A descoberta na Formação Longá pode representar uma nova fronteira para o setor mineral nordestino, particularmente em um contexto global de alta demanda por terras raras, usadas em transição energética, imãs permanentes e microeletrônica.
A pesquisa do SGB integra as diretrizes da Política Nacional de Minerais Estratégicos, reforçando a importância do mapeamento sistemático em regiões com potencial geológico ainda subaproveitado.
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