Até agora, não atinei por que, entretanto, nenhum (a) dos (das) acadêmicos (as) se pronunciou, prosperum vel contrarium, a respeito do posicionamento do ex-presidente do Sodalício, autor destes comentários. Parece, todavia, me cumprir entender, por enquanto, que tal sucedeu em razão tanto da secura de minhas palavras como em decorrência da cautela preservada pela posição elevadamente urbana de cada qual, jamais em se tratando de componentes da Academia Cearense da Língua Portuguesa, na sua totalidade, pajens de tal civilidade. De toda sorte, a mim me compete, por oportuno, explicar o comentado procedimento, coincidente ou não com as razões conduzidas e sustentadas, individualmente.
O fato é que se afigura não haver dúvidas de que os escritos sob comento, com esteio em produtores (as) de bens de alçado patim linguístico e científico, por si, já representam colaboração de monta aos (às) leitores (as) demandantes de saberes que tais, pois ditos conhecimentos foram sorvidos, à extensão temporal e sob os cuidados exigidos, em compridos trajetos acadêmicos, nas universidades, instituições de pesquisa e outras searas de prova, havidos como de certificação válida e inconteste.
Mencionados haveres, conquistados e fortalecidos à medida de seu emprego nos locis de suas ocorrências, constituem um conjunto de produtos prontos, aparelhados a servir de aditamento valioso às necessidades demandadas pelos consulentes, os quais neles se vão louvar, com o mais elevado grau de certeza e máxima segurança, com vistas a prosseguir no seu desiderato de ensinar, instruir, adestrar seus circunstantes e prosseguir dessedentando a sempre ressequida garganta da ciência, em sua sede repetida e perene, consoante sucede com certas particularidades da Língua Portuguesa.
Com suporte no discernimento assim operado, para que não se dissolvam à medida do tempo, contrastando o conteúdo transitório da fala, são registadas as palavras, intenções, teorias, razões e provas por intermédio dos meios de propagação coletiva escritos, conforme o são os livros, revistas científicas e assemelhados, pois, de acordo com o explícito no rifão latino, Verba volant, scripta manent, isto é, as palavras voam e o que está escrito permanece.
Em expressa conjunção, encontram-se, exempli gratia, no nosso caso, as obras de escritores e autoras de grande porte, constituintes desta Arcádia – complexo de trinta e nove intelectuais de alevantado nível, sem exceção – como os (as) docentes Myrson Melo Lima, Ítalo Gurgel, Sousa Nunes, Ana Paula Medeiros, Sebastião Valdemir Mourão, Giselda Medeiros, Tarcísio Cavalcante, Maria Elias Soares e os demais, que mourejaram, e ainda o fazem, longamente nos seus modi operandi de docentes e, hoje, espalham farto e fértil verbo em livros e revistas, jamais na Vernáculo, veículo a conter, com raro prestígio, as compreensões de tão erguidos teores.
Com efeito, estimados (as) acadêmicos (as), por qual razão, além de não receberem pelo que oferecem de instrução e preceito magnificente, ainda hão de pagar para editar?
Meu posicionamento, pois, é totalmente opósito à obrigação de, além de oferecerem matérias corretas, com a devida acreditação, tomadas com esforço e didáticas por excelência, ainda têm de desembolsar para as ver publicadas.
Deveriam era receber…
Com a palavra, o Presidente – Prof. Sousa Nunes.
A propósito de “Paga intempestiva”, de Vianney Mesquita, e sua riqueza lexical
Por Francisco Souza Nunes Filho**
Ignóbil é dizer uma coisa e pensar outra. Muito mais, entretanto, é escrever uma coisa e pensar noutra. (SÊNECA)
Tendo lido e relido a nota de Vianney Mesquita, ressaltaram-me à vista, além do que pleiteia o nobre Confrade, o zelo, o esmero e a precisão que o acadêmico palmaciano imprime em tudo o quanto escreve.
Detenho-me, neste particular, na exemplaridade vocabular que resplandece em seu texto “Paga Intempestiva”. Aliás, mais uma vez, a pena arguta de Vianney Mesquita comprova que a Língua Portuguesa, quando manejada por mão hábil e espírito cultivado, não se exaure na aplicação banal do cotidiano, pois antes se dilata em campo vasto, rico e fecundo, a reclamar o esforço de quantos a amam. Veja-se, por exemplo, o emprego da expressão “Paga Intempestiva” — título do artigo —, que, no rigor de seu alcance, ultrapassa a singeleza de um mero “pagamento atrasado”, dando-lhe o tom jurídico e clássico que o assunto pedia.
É esse o gesto do escritor-filólogo: não se contenta com a palavra comum, indo à cata do vocábulo que porta em si a carga inteira de sua história e do seu matiz semântico.
Do mesmo modo, ao utilizar “editação” (“… pela exigência, por parte da ACLP, de retribuição financeira quando da editação de artigos e quaisquer peças na Revista Vernáculo”), não incorre em arcaísmo gratuito: restaura, antes, uma forma legítima, de raiz latina, que realça a antiguidade do termo e recorda ao leitor que a língua não é estática, mas organismo vivo em perpétua renovação.
Noutra passagem, a nobre palavra “membra” (“…Escuso-me junto aos componentes e membras deste silogeu…”), lusitanismo que sobrevive nos textos portugueses, é chamada à cena não por exotismo, mas para nos lembrar da plasticidade do idioma e de suas variantes de prestígio. Com isso, o autor obriga o leitor a reconsiderar a norma corrente e a abrir-se às possibilidades múltiplas da linguagem.
Ainda mais sugestivo é o uso de “jamais” (“… jamais em se tratando de componentes da Academia Cearense da Língua Portuguesa…”), não apenas no sentido negativo, mas no valor intensivo de “principalmente”, “em particular”. Ao manejar essa polissemia, Vianney devolve ao termo uma força esquecida, e com ela amplia a sensibilidade de quem o lê.
Em sequência, surge o “registado” (“são registadas as palavras, intenções, teorias, razões e provas…”), forma de velho sabor luso, que nos transporta à tradição das atas notariais e dos escritos acadêmicos de antanho. O mesmo se diga de “alevantado” (“… complexo de trinta e nove intelectuais de alevantado nível, sem exceção…”), tão castiço quanto sonoro, que empresta elevação à referência aos acadêmicos da Arcádia.
E quando escreve “opósito” (“Meu posicionamento, pois, é totalmente opósito à obrigação…”), em vez de simplesmente “oposto”, não faz para causar estranheza: oferece, antes, a lição de que a língua é tesouro a ser redescoberto, e que cada vocábulo guarda nuança própria.
Para remate, a expressão “palavras exprimidas” (“A semiaridez das minhas palavras exprimidas no Grupo de WA da Academia, em 14.08.2025…”), no lugar do trivial “expressas”, restaura uma forma de correção absoluta, porque o verbo exprimir – muitas vezes relegado – é de direito tão legítimo quanto expressar.
Em todos esses exemplos, a lição é clara: as palavras, em sua pena, não são ornamento gratuito, mas veículos de exação e adequação, escolhidas como quem lavra pedra rara ou talha madeira nobre. Cada vocábulo traz consigo a história da Língua, e, ao ser revivido, enriquece não somente o texto, mas sobretudo o espírito do leitor.
Por isso, ao comentar “Paga Intempestiva”, reitero a convicção de que Vianney Mesquita cumpre missão dupla: escrever com justeza e beleza, convidando-nos a haurir, na “última flor do Lacio”, as fragrâncias que dormitam esquecidas e que só o escritor erudito desperta.
*Escritor, professor e membro da Academia Cearense de Língua Portuguesa (ACLP)
**Professor e Presidente da Academia Cearense de Língua Portuguesa
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