O Ministério Público da Espanha se posicionou contra o pedido do Supremo Tribunal Federal (STF) de extradição do blogueiro bolsonarista Oswaldo Eustáquio. Segundo o parecer da procuradora espanhola Teresa Sandoval, os atos atribuídos a ele não configurariam crime no país, estando protegidos pelo direito à liberdade de expressão.
“Os atos constituem, segundo a legislação brasileira, um crime de abolição violenta do Estado democrático de direito e golpe de Estado. Na legislação espanhola vigente, esses atos não constituem crime, ao estarem amparados pela liberdade de expressão. Portanto, a dupla incriminação normativa não se aplica”, explicou a procuradora.
Ao GLOBO, Eustáquio afirmou nesta quarta-feira que o posicionamento espanhol “desqualifica os inquéritos contra ele, que duram mais de cinco no Brasil”.
— O mundo hoje entende que a Justiça brasileira tem se excedido e abusado de autoridade. O que fiz foi criticar o governo Lula. Falei que desconfiava, e ainda desconfio, do resultado mostrado pelas urnas eletrônicas em 2022 — disse o blogueiro.
O pedido de extradição do blogueiro foi encaminhado em outubro ao Ministério da Justiça pelo ministro Alexandre de Moraes. Logo em seguida, a solicitação foi dirigida ao Ministério das Relações Exteriores, que comunicou a ordem ao seu equivalente na Espanha.
O bolsonarista é acusado de usar o perfil da filha de 16 anos para conduzir uma campanha virtual contra o delegado da Polícia Federal (PF) Fábio Shor, após o indiciamento do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O processo afirma que a página nas redes sociais publicou três postagens em que expõe um familiar de Shor e acusa o delegado de “prender patriotas inocentes e fazer milhares de crianças chorarem por seus pais”.
“Bernardo Eustáquio, uma das milhares de crianças vítimas do delegado Fábio Alvarez Shor, dá o seu testemunho sobre a crueldade do responsável pelo indiciamento de Bolsonaro, conhecido como capataz de Alexandre de Moraes. A denúncia do meu irmão tem o aval de 131 delegados”, dizia outra publicação no perfil que traz outro filho do bolsonarista como “testemunha”.
A defesa do blogueiro alega que “não há fundamentação jurídica baseada em Lei que autorize a extradição”.
“Seus atos ditos como Abolição Violenta do Estado Democrático de Direito não são tipificados como delitos na Espanha e são abrangidos pela Liberdade de Expressão”, diz a nota assinada pelos advogados Ricardo Vasconcellos e Daniel Lucas Romero.
Pedido de asilo
Eustáquio está na Espanha desde 2023, quando fez um pedido de asilo na Europa. Ele é um dos alvos do inquérito das milícias digitais, que corre no STF sob a relatoria de Moraes. O magistrado determinou a prisão do blogueiro em dezembro de 2022, atendendo a um pedido da Polícia Federal em inquérito das milícias digitais e divulgação de fake news.
O bolsonarista participou de protestos contra o resultado das eleições e defendeu intervenção das Forças Armadas, o que é inconstitucional. Ele é investigado desde 2020, tendo inclusive já sido preso por envolvimento com atos antidemocráticos que pediam o fechamento do Congresso e do Supremo.
Em agosto, Eustáquio e outros aliados do ex-presidente foram alvos de uma nova operação deflagrada pela Polícia Federal e autorizada por Moraes. Entre as medidas, foi decretada novamente a prisão dele e de Allan dos Santos, que são considerados foragidos por estarem no exterior.
Faltando pouco mais de um ano e meio para a campanha de 2026, um ator político relevante vem marcando posição de forma discreta, porém eficaz. O ministro Flávio Dino foi para o Supremo em 2024, depois de comandar o Ministério da Justiça. Entre os 11 integrantes do STF, ele é de longe o mais bem preparado para o exercício do poder. Tem no DNA aquilo que Maquiavel define como “virtú” (talento para conquistar e manter o poder). Seu apetite é imenso.
Dino começou a carreira na política estudantil da Universidade do Maranhão e participou da campanha de Lula em 1989, coordenando a jovem guarda. Foi filiado ao PT, ao PC do B e ao PSB. Aprovado em 1º lugar no concurso de juiz federal em 1994, ficou na magistratura até ser candidato a deputado federal em 2006, eleito com mais de 120 mil votos. Em 2014, foi eleito governador e reeleito em 2018. Depois, eleito senador em 2022, ministro da Justiça e, agora, ministro do Supremo.
Sabe tudo de poder o doutor Flávio, cuja família está na política há 200 anos. Dono de uma habilidade incomum para seduzir e comandar, foi indicado por Lula como sendo o primeiro comunista a ocupar uma cadeira no Supremo. Um comunista de sangue azul, de uma família tradicional na política maranhense, cujo patriarca Manoel Antônio Monteiro Tapajós, rico proprietário de terras, combateu a revolta da cabanagem ao lado das tropas do então governo imperial comandado pelo regente Diogo Antônio Feijó.
Ao derrotar os líderes da cabanagem, revolta que explodiu no Pará em 1835 e durou até 1840, Tapajós angariou enorme prestígio na Corte e era chamado de herói por Feijó. Dino tem no DNA essa mesma capacidade de comando e de exercício da força. Não é pouca coisa.
Adversário figadal da família Sarney no Maranhão, ele encontrou na esquerda o espaço para crescer que não teria no centro ou na direita. Antes dele, Edson Vidigal, ex-ministro do STJ, tentou um caminho pelo PSB até o Palácio dos Leões e acabou em 3º lugar, atrás de Jackson Lago e Roseana Sarney.
Dino foi construindo sua rota até o poder tijolo por tijolo. Eleito deputado federal em 2006, foi candidato a prefeito de São Luiz em 2008 e perdeu para João Castelo, oriundo do grupo de Sarney. Em 2010, derrotado por Roseana Sarney na disputa pelo governo, ganhou de Dilma a presidência da Embratur como prêmio de consolação. Nesta época, perdeu um filho adolescente, morto depois de passar mal na escola. A dor imensa não passou nunca.
Em 2014, finalmente chegou ao governo do Maranhão, derrotando o grupo da família Sarney. A partir desta eleição, foi consolidando seu poder no Estado, ocupando a pista toda, como é do seu feitio.
Neste mesmo ano, depois de deixar o Senado e a vida pública, o ex-presidente Sarney montou um escritório no Setor Hoteleiro Norte, em Brasília. Era um local até modesto para o tamanho e a importância política de Sarney. Correu forte o boato de que Dino mandou alugar uma sala ao lado, na qual teria montado escutas para monitorar o ex-presidente. Verdade ou não, o fato é que Sarney mudou seu escritório para um shopping algumas quadras adiante.
Dino enfrenta problemas de saúde causados pela obesidade e tem procurado se cuidar mais desde que assumiu sua cadeira no Supremo. Assim que Lula bateu o martelo para sua nomeação, tratou de procurar o ex-presidente José Sarney a quem pediu apoio. Sarney, cuja sabedoria é um ativo valioso, deu sinal verde a Dino. De adversário, passou à condição de credor.
Nesta semana, políticos da esquerda e do centro com bom trânsito no Congresso e na Faria Lima, mencionaram Dino como potencial candidato que joga parado de olho na Presidência. Desde que chegou ao STF, o ministro tem se pautado pela discrição e atuação firmes. Numa rara derrapada, se meteu no caso das tarifas dos cemitérios de São Paulo, miudeza incompatível com seu tamanho.
Nascido em 1968, em 30 de abril completará 57 anos. Ninguém no Supremo tem seu currículo ou talento semelhante para o exercício do poder, como reconhecem até seus adversários mais robustos. Ele quer ser candidato, deseja, sonha, mas em silêncio. Seu timing depende de uma definição de Lula. Nesta semana, ouvi de deputados da esquerda que essa história de candidatura é espuma fabricada pelo próprio Dino.
Creio ser improvável que, nesta altura do calendário, ele esteja dedicado a esse tipo de movimento. Dino sabe que o presidente Lula enfrenta uma crise, tem perdido popularidade e soltar balões de ensaio sobre sua possível candidatura pode ser visto, no mínimo, como traição. Diferentemente da intriga, o ministro é leal ao presidente.
A realidade política tem mostrado um Lula com popularidade claudicante, sem o encanto dos mandatos anteriores, como escrevi aqui outras vezes. Por toda sua trajetória, o presidente não merece destino semelhante ao de Joe Biden, defenestrado pela realidade.
Também não estou defendendo a candidatura do ministro Flávio Dino, embora reconheça seus méritos como profissional do direito e homem público. Creio que o mais provável é Lula manter sua candidatura à reeleição, mesmo que para isso tenha de fazer das tripas coração ou escolher Dino seu vice.
A esquerda tem enfrentado um problema crônico de renovação, embora tenhamos alguns oásis como o prefeito João Campos (PSB), a deputada Tabata Amaral (PSB) ou Camila Jara (PT). A renovação na esquerda se tornou urgente, porque seus quadros estão cada vez mais velhos e menos conectados com o eleitorado jovem, diferentemente da direita.
Lula quer e pode tentar um quarto mandato. Terá 81 anos na eleição de 2026. Se agora, prestes a completar 80 anos em outubro, demonstra pouca ou nenhuma paciência para o dia a dia da política, imagine daqui a dois anos. Qualquer um depois dos 80, sabe que cada dia a mais de vida é lucro. São raros líderes como Konrad Adenauer. Chegou ao poder com 73 anos, em 1949, governou até os 87 e morreu aos 91 reverenciado como o grande líder do pós-guerra.
No atual cenário, Dino é o quadro mais qualificado da esquerda, o único a transitar nos 3 Poderes. Por isso, é difícil imaginá-lo como carta fora do baralho da sucessão. Numa conversa há poucos dias, um político experiente opinou que dificilmente o PT abriria mão da cabeça de chapa e que, se candidato fosse, Dino teria de sair pelo PT. Não vejo problema nisso, porque ele já foi filiado ao PT antes de ir para o PC do B. Seria como voltar para suas origens.
Por enquanto, uma eventual candidatura de Dino é tratada como mera especulação. Mas qualquer observador razoavelmente atento enxerga que o ministro joga parado, tem ocupado espaço positivo na mídia, não deixa de ser lembrado e segue fazendo política no Maranhão, sua fonte primária de poder.
Em fevereiro Dino mostrou ao governador Carlos Brandão (PSB), eleito com seu apoio, quem é que manda. Brandão esboçou desafiar o poder de Dino e perdeu três vezes.
Não conseguiu nomear um advogado seu amigo para o Tribunal de Contas e amargou uma decisão de Dias Toffoli, que suspendeu o foro privilegiado para diretores da Assembleia Legislativa, entre eles o irmão do governador, Marcus Brandão. Na sequência, o ministro Alexandre de Moraes suspendeu a nomeação de Marcus para o cargo de secretário de Assuntos Legislativos do Maranhão.
Ao colocar Brandão no seu devido lugar, Dino mostrou que continua firme e forte jogando o jogo do poder.
Hoje, 15 de março de 2025, completam-se 40 anos do fim do Regime Militar, com a posse do civil José Sarney como vice-presidente, eleito de forma indireta pelo Congresso Nacional. Sarney, nesse mesmo dia, assumiu a Presidência da República interinamente, devido à impossibilidade, por motivo de saúde, da posse do presidente eleito, Tancredo Neves. Pouco depois, em 21 de abril de 1985, com o falecimento de Tancredo, Sarney assumiu definitivamente a presidência.
A data de hoje é significativa. Quarenta anos se passaram e, apesar de tantas conquistas, muitas das mazelas daquela época ainda perduram. Penso que a democracia não foi plenamente consolidada. As elites tinham e ainda têm medo das massas, medo da vontade popular ser manifestada livremente. Escastelaram-se em estruturas de poder do novo regime criado e urdem contra iniciativas de emancipação e de participação popular. O processo político é corrompido e viciado. Hoje, ainda mais grave, atenta-se até mesmo contra a livre manifestação do pensamento. A própria Constituição Federal de 1988 se vê conspurcada.
Hoje, sente-se falta do saudável espírito de rebeldia que esteve presente nas várias formas de luta contra a Ditadura Militar. Inaugurada em 31 de março de 1964, com a deposição ilegal do presidente Jango pelos ministros militares, no que entrou para a história como o Golpe de 64, mas que foi tratado pela historiografia oficial da época como “Movimento Cívico-Militar” e mesmo como “Revolução”, o golpe contou com tanques nas ruas, fechamento de órgãos de imprensa e prisões arbitrárias, feitas pelo Exército, de possíveis opositores e pessoas comuns, simplesmente suspeitas de serem comunistas (o que não era, nem é, crime).
Em Recife, Gregório Bezerra foi torturado, amarrado pelo pescoço e arrastado, ensanguentado, pelas ruas de Casa Forte, por ordem do famigerado Coronel Villocq. A longa luta contra a Ditadura culminou na campanha das “Diretas Já” e na eleição indireta de Tancredo e Sarney, em 15 de janeiro de 1985, fruto de uma brilhante articulação política, em que teve destaque o pernambucano Fernando Lyra, derrotando os acólitos do decadente regime de 21 anos, que queriam Paulo Maluf na presidência.
José Sarney tomou posse como presidente da República há exatos 40 anos, em 15 de março de 1985. Era uma sexta-feira. Ele tinha 54 anos. Hoje, está com 94. Sua chegada ao Planalto foi o epítome do processo de redemocratização e do fim do regime militar, que havia durado 21 anos.
Hoje, neste sábado (15), o Brasil completa 40 anos ininterruptos de democracia. É um recorde de estabilidade institucional na história dos 525 anos do país.
Na manhã da última quarta-feira (12), Sarney recebeu o Poder360 para uma entrevista em sua casa de estilo colonial em Brasília. Fazia sol. Ele acabara de fazer sua fisioterapia diária, para reforçar os músculos. Vestia um terno azul-marinho, camisa social branca e gravata estampada com tons de azul e amarelo. Não tinge mais de preto os cabelos nem o bigode, hábito que manteve durante muitos anos quando ocupava cargos públicos.
Ainda não se vê nenhum item marrom no vestuário de Sarney. Ele é supersticioso. Nunca usa essa cor. “Que las hay, las hay”, brinca. É uma citação ao conhecido aforismo espanhol “yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay” (eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem).
“Na minha idade, o importante é ter força nas pernas”, disse ao entrar na sala onde seria iniciada a conversa. Na varanda ao lado, sobre uma mesa, repousava um exemplar do livro “Nexus” (2024), do professor israelense de história Yuval Harari, já com mais da metade das 504 páginas lidas e anotadas. Sarney sublinha o que considera mais interessante com caneta esferográfica de tinta preta.
“É muito interessante o conceito que ele [Harari] sintetiza sobre informação não ser sinônimo de verdade”, diz o ex-presidente, que vai completar 95 anos em 24 de abril. Com o raciocínio afiado, demonstrou estar também bem-disposto fisicamente ao final da entrevista, quando passeou um pouco pelos jardins de sua casa com a equipe deste jornal digital. Já era quase meio-dia. O calor havia aumentado. Sarney parecia não se importar. Atendeu aos pedidos do repórter fotográfico Sérgio Lima para se posicionar num local arborizado e assim ter sua imagem registrada.
No início da entrevista gravada em vídeo, definiu o que é democracia: “O coração da democracia é a liberdade. Essa é a definição mais precisa de democracia: liberdade. A liberdade tem um poder criativo que se derrama sobre a sociedade”.
A tolerância é uma das marcas de José Ribamar Ferreira de Araújo Costa, o nome de batismo de Sarney (que adotou o prenome do pai como sobrenome já na vida adulta). Nos cinco anos em que esteve no Planalto, foi um dos presidentes mais criticados pela mídia e por políticos de esquerda e de direita. Aguentou firme. “Nunca processei nenhum jornalista nem nenhum jornal. Eu achava que essa liberdade dada é como a da 1ª Emenda à Constituição dos Estados Unidos, que nós seguimos como democracia. Tive muitos críticos ferinos. Acredito que a democracia e a liberdade de imprensa têm um poder tão grande que no futuro pode corrigir tudo que foi dito”.
Não guardou mágoa de ninguém? “Eu nasci com a absoluta impossibilidade de ter ódio […]. Eu não tenho inimigos. Eu sempre tive adversários. Eu acho que essa é uma coisa nova na política brasileira que nós devemos superar e abandonar. A política feita para ter adversário, não para ter inimigos”.
Sarney assumiu seu primeiro cargo público em 1955, como deputado federal pelo Maranhão. Ele nasceu na cidade de Pinheiro, que fica no norte do Estado e a 333 km de São Luís, a capital maranhense. A carreira de Sarney é longeva. Ele foi governador do Maranhão (1966-1970), senador pelo Maranhão (1971-1985) e senador pelo Amapá (1991-2015). Presidiu o Senado por três mandatos: 1995-1997, 2003-2005 e 2009-2013.
Casado com Marly desde 1952, tem três filhos: Roseana, 71 anos; Fernando, 69 anos, e José Sarney Filho, o Zequinha Sarney, de 67 anos.
Escreveu e publicou 123 livros. É membro da Academia Brasileira de Letras. Deixou a política eleitoral ao terminar seu último mandato de senador, pouco antes de completar 86 anos, em 2015. Mas não parou de ser procurado por muitos políticos, que desejam ouvir suas análises e conselhos. Em 10 de março de 2025, passou cerca de três horas no Palácio do Planalto na cerimônia das posses dos ministros Alexandre Padilha (Saúde) e Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais). Foi abraçado e tietado por várias autoridades, inclusive pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – um crítico do passado e hoje um amigo.
Observador da vida nacional, Sarney aponta alguns líderes na política atual: o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), e os governadores do Pará, Helder Barbalho (MDB), de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil), e o de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos) – este último, “um excelente quadro”.
Leitor voraz, elogia Itamar Vieira Junior, de quem leu o livro “Torto Arado” (de 2019). Lamenta não haver jornais impressos em papel. Vira-se lendo tudo num iPad, o tablet da marca Apple. Pretende finalizar agora em 2025 seu 124º livro, “O Brasil e seu labirinto”. Escreve à noite, em geral depois das 22h. Usa um computador Dell e o processador de textos Word, da Microsoft. Dorme cerca de seis horas por noite. Qual o segredo para chegar bem aos 95 anos? Sarney responde sorrindo: “Dormir muito, comer pouco e não discutir com mulher”.
Em 2026, o ex-presidente opina que o seu partido, o MDB, deveria manter o apoio a Lula. “Ele [Lula] ainda é o maior líder popular que tem no país. Tem experiência”.
Assista à entrevista de José Sarney ao Poder360:
A seguir, trechos editados da entrevista de Sarney ao Poder360:
Poder360 – O que é a democracia?
José Sarney – O coração da democracia é a liberdade. Essa é a definição mais precisa de democracia: liberdade. A liberdade tem um poder criativo que se derrama sobre a sociedade.
Alguém já disse que a democracia é a troca do grupo que está no poder de vez em quando. Essa é também é uma boa definição?
É boa, mas é uma definição secundária. A democracia é de fato um regime no qual pode haver substituição. Há alternância no poder. Mas essa é uma explicação do mecanismo, de como se exerce a democracia.
O atual período democrático começou há 40 anos, em 15 de março de 1985, com a sua posse como presidente da República. O então presidente eleito, Tancredo Neves, teve de ser internado por causa de uma diverticulite. Como foi a tensão daquelas horas que antecederam sua posse?
Eu fui tomado de absoluta perplexidade. Eu não havia me preparado para ser presidente da República. Nem Tancredo tinha me convidado para participar da formulação do seu programa de governo, da escolha dos seus ministros. Eu sou um homem de fé. Eu acreditava que o Tancredo jamais morreria. Eu sabia, pela minha experiência da vida pública, o que era governar o Brasil. Um país complexo e com grandes problemas. E nós estávamos com um outro problema muito maior: a transição do poder autoritário para um poder democrático. Saíamos de um regime militar, autoritário e de poder absoluto, para um regime de absoluta liberdade….
O senhor assumiu como presidente interino. Só depois, com a morte de Tancredo em 21 de abril de 1985, passou a ser presidente de maneira definitiva. Além de assumir o poder de forma inesperada, era um interino nas primeiras semanas…
Quando o presidente morreu, aí tomei aquela consciência das minhas responsabilidades. Eu usava a expressão “estou com os olhos de ontem”.
Quais foram as personagens relevantes ao seu lado naquele período de transição, na sua posse como interino e depois em definitivo?
Em primeiro lugar, Ulysses Guimarães [1916-1992] [então deputado federal e presidente da Câmara]. Eu disse a Ulysses que não queria assumir. Causaria uma certa perplexidade ao povo brasileiro: em vez de Tancredo, eu assumindo a Presidência da República. Eu havia sido presidente do PDS, da Arena [as siglas que deram sustentação ao regime militar].
Em segundo lugar, foi importante naquele momento o dr. Leitão de Abreu [1913-1992, ministro da Casa Civil do governo do presidente João Figueiredo]. E também o general Leônidas Pires Gonçalves [1921-2015] [que havia sido escolhido por Tancredo para ser ministro do Exército].
Houve uma comissão de pessoas que se reuniu para decidir o que fazer em 14 de março de 1985, pois Tancredo não teria como tomar posse no dia seguinte. Faziam parte dessa comissão Ulysses, Leitão de Abreu, Leônidas, Fernando Henrique Cardoso, Pedro Simon e Heráclito Fortes, entre outros. Eles se reuniram no Hospital de Base, em Brasília, onde estava internado Tancredo. Falávamos no corredor.
Eu fui engolido pelo cansaço. Começaram a discutir quem devia assumir. Eu disse: “Olha, eu tenho a minha posição expressada ao dr. Ulysses. Eu não quero assumir. Vocês estão discutindo aqui, no hospital. Eu vou para minha casa”.
Leônidas sustentou que quem deveria tomar posse era eu. Leitão de Abreu, nessas conversas, tinha de defender a posição de Figueiredo, que não desejava a minha posse, dizendo que Ulysses deveria ocupar o Planalto.
O ministro do Exército de Figueiredo era o general Walter Pires [1915-1990]. Ele estava disposto a cumprir a determinação de Figueiredo. Ao saber que a comissão havia decidido que quem assumiria seria eu, Walter Pires disse ao Leitão de Abreu: “O presidente não aceita. Vou para os quartéis agora e vamos impedir essa posse”. Aí Leitão de Abreu respondeu: “Você não é mais ministro. O ‘Diário Oficial’ de hoje publica sua demissão” [já era madrugada de 15 de março de 1985].
Em que horário chegou a informação de que o senhor iria assumir a Presidência?
Às 3h da madrugada.
E quem comunicou?
Leônidas Pires Gonçalves, que seria o ministro do Exército, escolhido por Tancredo. Eu disse a ele o que já havia dito quando eu também havia estado no hospital: “Leônidas, você conhece a minha posição. Eu só quero assumir com o Tancredo”. Ele respondeu: “Sarney, vocês levaram muitos anos para que isso acontecesse [a transição do regime militar para a democracia]. Então você não pode criar mais nenhum caso. Vamos deixar de sentimentalismos”. Essa era a mesma expressão usada por Ulysses antes quando eu dissera a ele que não deveria assumir. Nessa conversa com Leônidas, já na madrugada do dia 15, ele concluiu assim: “Às 8h da manhã vão buscá-lo para cumprir tudo o que está no cerimonial. Boa noite, presidente”. E bateu o telefone. Foi a partir daquele momento que eu passei a saber que a decisão estava tomada.
A ditadura militar, na sua opinião, foi derrubada ou acabou caindo sozinha por ter fracassado?
Ela foi substituída por um processo de engenharia política que orgulha muito os políticos brasileiros.
Na independência, tivemos também um processo negociado. Pegamos um príncipe estrangeiro [d. Pedro 1º], transformamos em brasileiro. Não tivemos luta, como na América espanhola, cujas independências foram feitas de batalha.
Nós atravessamos isso na República da mesma maneira. Não tivemos nenhuma luta sangrenta. Na Revolução de 1930, prepararam-se para ter grandes embates. Não teve nenhum. Saímos também com uma posição negociada na renúncia de Jânio Quadros [1917-1992], em 1961. A mesma coisa na posse de Jango Goulart [1919-1976].
Os políticos brasileiros construíram tudo isso ao longo do tempo. E Ulysses teve grande importância nesse processo, com o PMDB. E nós nos juntamos a ele com o nosso grupo que, embora tivesse apoiado o regime de 1964, teve como objetivo não deixar fechar o Congresso.
A característica brasileira de não violência é em geral elogiada. Mas há quem diga que dessa forma, sem rupturas abruptas, o país enfrenta processos mais longos e demorados de transição. Isso é bom ou ruim?
O Brasil foi uma construção civil. Não foi uma construção militar como as outras independências.
O José Bonifácio [1763-1838], que vinha da Europa, conduziu um processo em que o imperador convocou uma Constituinte. Era uma maneira de mostrar que aquilo vinha dos civis, para fazer uma monarquia constitucional.
Essa atitude conciliatória torna o Brasil mais lento na evolução das suas instituições em comparação com países que tiveram revoluções sangrentas?
O sangue sempre foi uma maneira de dividir as sociedades e marcá-las durante muito tempo. Veja nos Estados Unidos: até hoje o problema dos pretos remanesce. É um grande problema com o qual eles têm de lidar. É uma hipoteca da independência.
Na América do Sul, o brasilianista chamado Ronald Schneider diz que a transição brasileira para a democracia foi a mais exitosa de todas. Não deixou hipotecas militares.
Ainda assim, apesar do processo de anistia de 1979, hoje o Supremo Tribunal Federal discute se deve reavaliar certos fatos que não deveriam ter sido incluídos nesse processo de perdão.
Quem dirigiu esse processo da anistia foi o Petrônio Portela [1925-1980]. Ele fez a negociação que possibilitou a transição democrática. O que foi a anistia? Foi para os dois lados. Sem isso nós não teríamos a transição democrática.
Os militares jamais aceitariam. Tinham armas na mão. Não aceitariam que fossem punidos depois.
Isso possibilitou que fizéssemos a transição democrática e comemorarmos agora os 40 anos de democracia no Brasil. Acredito que se o Supremo encontrar, de maneira legal, sem mexer no acordo da anistia, é a Justiça que examina se deve punir ou não de acordo com as leis que nós temos atualmente. Temos de fazer leis atuais. Punir aqueles que atualmente tenham feito [cometido delitos], e não como coisas do passado.
O STF analisa atualmente um caso do passado, de Rubens Paiva, que foi deputado. A ideia é avaliar se devem ser punidos aqueles que mataram e ocultaram o cadáver de Rubens Paiva.
A anistia para os criminosos de sangue não foi feita. Nós conseguimos, naquela época, que isso fosse excluído. Isso já foi. Nós tivemos uma maneira de pacificação […]. Nós não podemos mexer na anistia para o passado, que foi uma construção com as Forças Armadas, que tiveram um papel muito importante.
Durante o meu governo, dei duas diretrizes ao ministro do Exército, para que ele transmitisse a todos. A primeira diretriz foi que eu era o comandante em chefe das Forças Armadas. E o dever de todo comandante é zelar pelos seus subordinados. A segunda diretriz era que a transição seria feita com as Forças Armadas e não contra as Forças Armadas. Essa era uma diretriz também de Tancredo, quando ele disse que jamais faria perseguições, jamais faria represália e que o passado seria esquecido.
No caso específico do ex-deputado Rubens Paiva, o que o Supremo deve fazer?
Eu não digo que o STF não deva examinar a anistia. Deve examinar a lei que tem e, dentro da lei, fazer as suas punições, se é que ele pode fazer.
O senhor não saberia dizer se essa punição é algo que deve ser aplicada?
Isso é um problema jurídico. Está submetido ao Supremo Tribunal. É a quem nós entregamos a guarda da Constituição.
O senhor foi alvo de muitas críticas durante sua passagem pelo Planalto. Chegou a processar algum jornal ou jornalista?
Nunca processei nenhum jornalista nem nenhum jornal. Eu achava que essa liberdade dada é como a da 1ª emenda à Constituição dos Estados Unidos, que nós seguimos como democracia.
O jornalista Paulo Francis (1930-1997) era um crítico ferino seu…
Tive muitos críticos ferinos. Eu acredito que a democracia e a liberdade de imprensa têm um poder tão grande que no futuro podem corrigir tudo o que foi dito.
Eu estou lendo um livro de [Yuval] Harari sobre informação e ele diz muito sobre isso. Estou vendo hoje com muita felicidade muitos atualmente fazendo uma leitura mais generosa a respeito do meu governo. Isso é a democracia. Não debito isso [revisionismo] à minha pessoa. Debito ao processo democrático. Eu deixei o governo sem ter tido nenhum dia de prontidão militar. Um país pacificado, que foi entregue a um adversário meu [Fernando Collor de Mello, que venceu a disputa presidencial em 1989].
O senhor não guardou mágoa de ninguém?
Eu nasci com a absoluta impossibilidade de ter ódio. Só tenho que agradecer ao Criador. Eu sou muito religioso, você sabe. Ele me fez assim. Ele me deu tantas coisas, tantas oportunidades, colocou na minhas mãos as oportunidades e dificuldades e ao mesmo tempo me deu condições de superá-las. Eu não posso jamais ter raiva de ninguém.
E sei que cumpri aquele princípio Dele de perdoar os seus inimigos. Eu não tenho inimigos. Eu sempre tive adversários. Eu acho que essa é uma coisa nova na política brasileira que nós devemos superar e abandonar. A política é feita para ter adversários, não para ter inimigos.
Há uma frase atribuída a Samuel Wainer [1910-1980] sobre esse tema no livro “O homem que estava lá” (2020). Ele teria dito que “o ódio é uma perda de tempo”.
É uma boa frase. O ressentimento é contra a gente mesmo. O ressentimento e o ódio prejudicam a nossa busca da felicidade. Aquilo que está na Constituição dos Estados Unidos, na frase que foi incluída por Thomas Jefferson [1743-1826].
A democracia é um sucesso no Brasil ao completar 40 anos. A economia, nem tanto. O PIB do Brasil nesse período cresceu 166%. O da China (que nem é uma democracia) cresceu 2.933%. Mas países democráticos tiveram mais sucesso que o Brasil. A Índia teve seu PIB crescendo 1.007% em 40 anos. A Coreia, 736%. Por que a economia no Brasil teve menos êxito do que a democracia?
Porque a democracia não significa soluções econômicas. A democracia mostra bem a volta da liberdade. E da liberdade, inclusive, na economia. O processo econômico tem outras implicações, que não são aquelas de natureza institucional e dentro da própria sociedade, como ela se organiza.
Mas eu não sou tão pessimista. Já tivemos os anos dourados dos Estados Unidos. Já tivemos os anos dourados da Europa. Já tivemos os anos dourados da Ásia. O que resta do mundo para ter seus anos dourados são África e América Latina. Vai chegar a nossa vez e eu espero que seja neste século.
Eu disse uma vez ao Deng Xiaoping [1904-1997] [chefe do Comitê Central do Partido Comunista da China de 1978 a 1990] que o século 21 seria o século da China. E ele completou: “E do Brasil”. E eu disse: “E da América Latina”.
O Estado precisaria ser um pouco mais ágil, não tão grande, no Brasil? O país precisa de tantas estatais? De onde vem essa cultura da dependência do Estado?
Vem justamente do marxismo, que criou a cultura do planejamento. Essa [o planejamento] foi uma herança boa que o marxismo deixou para o mundo inteiro. Todo mundo passou a ter o seu planejamento.
O Brasil tem algumas empresas estatais icônicas como a Petrobras, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Essas grandes empresas devem ser para sempre estatais?
A Petrobras e essas que você cita são empresas que agregaram o trabalho do povo brasileiro durante muitos anos. Nós não podemos entregar agora à iniciativa privada uma coisa que foi construída com os impostos pagos pelo povo durante esses anos todos.
O presidente Lula enfrenta dificuldades agora. A aprovação ao governo caiu, apesar de a economia ter registrado crescimento robusto acima de 3% por dois anos e a taxa de desemprego ter sido baixa. Por que há insatisfação de parte dos eleitores?
Ninguém governa o tempo em que governa. As circunstâncias que existem tornam o presidente o escravo de sua circunstância. Como dizia Ortega y Gasset [1883-1955], o homem é ele e suas circunstâncias.
Quem são hoje os líderes políticos que merecem ser olhados com atenção?
Uma das piores falhas do movimento de 64 foi a extinção dos partidos políticos [por meio do Ato Institucional nº 2, de 1965, que permitiu apenas duas legendas, Arena, pró-governo, e MDB, de oposição consentida]. Os partidos eram uma escola. Nós nunca tivemos tradição de partidos nacionais. Sempre eram partidos regionais.
Se a gente olhar para os países que nos cercam, o Paraguai, Argentina e Chile, os partidos são centenários. E nós não tivemos essa tradição. Isso foi muito danoso para a formação de líderes. Nós vivemos um pouco uma crise de liderança. Mas estão aparecendo líderes bons, novos, como o presidente da Câmara, o deputado Hugo Motta [Republicanos-PB]. Tenho uma boa impressão dele.
E entre os governadores atuais?
Helder Barbalho [governador do Pará, pelo MDB]. Ronaldo Caiado [União Brasil, Goiás] está fazendo um bom governo. E o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas [Republicanos], também um excelente quadro.
O senhor defende o sistema eleitoral distrital-proporcional misto. Como seria possível ter esse modelo no Brasil?
O voto nos distritos seria para uma eleição majoritária, de um deputado por distrito. E todos os votos dados aos deputados seriam contados para as legendas. Dessa forma, a metade dos deputados seria eleita nos distritos – o mais votado em cada distrito. E, a outra metade, pelo voto total de votos de cada partido no Estado. Aí teria de discutir se esses deputados fora do distrito serão escolhidos por lista partidária ou por um segundo voto dentro do distrito.
Vamos pegar um exemplo. O Acre tem oito cadeiras na Câmara. O Acre seria dividido em quatro distritos. Cada distrito elegeria de maneira majoritária um deputado. E os votos que cada partido receberia dentro de cada distrito também seriam usados para escolher os outros quatro representantes do Acre. Mas o problema seria em como convencer o Congresso a dividir os distritos, não?
Você menciona agora o ponto mais difícil: dividir os distritos. O Brasil teve a tradição distrital do império, mas era um país que tinha uma população muito menor do que tem hoje. Não tínhamos a realidade que temos hoje. Nos grandes países em que a democracia se consolidou com o voto distrital, o sujeito já nasce no seu distrito. A partir dali, eles têm uma tradição, como na Inglaterra.
O senhor acredita que algum dia haverá consenso no Congresso para fazer essa mudança?
Eu acho que sim. Hoje, na eleição proporcional, é uma briga entre os candidatos. Você tem como adversário o seu companheiro de partido. Isso não ajuda na existência de partidos nem na formação de líderes.
A Câmara agora pensa em aumentar as vagas de deputados de 513 para 527 deputados. É uma medida positiva?
O Brasil tem de fixar o número de vagas da Câmara de maneira definitiva.
Mas é positivo aumentar o número de deputados?
Acho que não é. Em nenhum lugar que tenha um aumento de deputados isso é uma solução para os problemas do parlamento. [Recomendaria] que refletissem melhor. Temos de buscar uma fórmula que seja definitiva: não aumentar mais nem diminuir. Isso não significa que não se aumente agora, mas que seja de uma maneira definitiva.
O senhor está escrevendo um livro no qual que vai mencionar melhorias possíveis no sistema político eleitoral. Quando sai o livro?
Até o fim do ano. Vai se chamar “O Brasil no seu labirinto”. Como se deve definir o que foram os atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023? Foram episódios absolutamente impossíveis de a gente pensar que pudessem existir no Brasil. Vi aquilo como uma coisa vergonhosa para o Brasil. A definição do que foi, a Justiça está vendo. Se tiver as provas necessárias, deve punir.
O senhor ajudou na aprovação da Lei de Acesso à Informação, quando era presidente do Senado, em 2011. Como foi o processo para aprovar a LAI?
Eu não devo esconder a verdade dos fatos. Eu tenho que dizer e não é uma maneira de fazer um elogio a você. Você foi realmente o interlocutor. Como presidente do Senado, tive aquele tempo para nós aprovarmos uma lei e você foi a pessoa que me fez despertar para que essa lei fosse aprovada no Brasil, porque era um avanço na maneira que o povo brasileiro tinha de acesso às informações e que tem funcionado bem no Brasil.
Dos 123 livros que o senhor escreveu, quais são os seus prediletos?
Vou me fixar nos romances: “O Dono do Mar” [1995], “Saraminda” [2000], “A Duquesa vale uma Missa” [2007] e “O Norte das Águas” [1969]. Desses quatro, eu acho que no “Dono do Mar” eu consegui fazer um romance que tem princípio, meio e fim, bem estruturado.
Como o senhor escreve? Em qual horário? É no computador?
No princípio, eu não tinha computador. Eu escrevia a máquina e à mão. Depois da era do computador, eu me adaptei. Hoje, eu escrevo no computador. Mas com uma técnica: um espaço maior entre as linhas e não corrijo os erros de digitação. Mando para minha secretária passar para papel. Corrijo no papel e mando de novo para minha secretária.
E aí tem um arquivo novo no computador?
Isso. É um processo em que eu chego a até 12 releituras.
O senhor escreve em algum horário específico do dia?
Eu sou um pouco disciplinado. Tenho uma organização desorganizada [risos]. Às 10h da noite eu me recolho à biblioteca e aí eu fico lendo e escrevendo. Se a coisa é boa, eu escrevo até a madrugada. Ou leio até a madrugada.
Seu horário predileto então é o da noite?
À noite. Mas eu leio também de manhã. Acordo muito cedo, e leio.
Qual a marca do computador que o senhor usa e programa que usa para escrever?
Meu primeiro computador foi um Sharp, que me foi dado pelo Matias Machiline [1933-1994] [fundador Sharp]. Era um computador que levava um tempo… A gente ficava esperando que ele ligasse. Hoje, eu tenho um Dell e escrevo no Word.
Esta entrevista foi marcada numa conversa minha com o senhor pelo celular. O senhor é um usuário frequente do telefone celular?
Olha, eu uso, sim. É por meio do celular que a gente muitas vezes trabalha, resolve as coisas. A gente antigamente tinha que comparecer e marcar hora.
E o senhor escreve no celular, mensagens de WhatsApp?
Eu escrevo com alguma dificuldade com esses dois dedos [mostra os dois polegares]. Primeiro eu escrevia com um dedo só. Agora, eu estou escrevendo com os dois. Mas bem devagar.
Comunica-se com a família por meio do WhatsApp? Tem um grupo da família?
Não. Eu não gosto de grupo. Não tenho participação em grupo. Quando alguém quer me meter em um grupo, eu caio fora.
E televisão? Que programas o senhor aprecia? Novelas?
Não. Nunca assisti a novela. Não quero censurar quem assiste, porque eu tenho dentro de casa minha mulher, que é bem devota das novelas. Eu vejo os programas de televisão de noticiário. Esses eu a acompanho. O “Jornal Nacional”, os telejornais.
E o hábito de leitura das notícias na mídia tradicional? Ainda lê em papel ou lê no computador ou tablet?
Eu tenho uma saudade imensa do papel! Eu me habituei e gostava de pegar no jornal. Gosto tanto que eu leio os jornais locais [de Brasília] toda manhã, no papel.
E os outros?
Outros eu leio no meu iPad.
O senhor navega na internet? Entra em endereços na internet e também nas redes sociais?
Nas redes sociais e na internet em geral eu escolho alguns. Com 95 anos que vou fazer no próximo mês eu acho que a gente já pode distinguir o que é bom, o que é mau. O que é interessante, o que não é. A gente vai passando aqui, ali, descartando o que não é importante. Até porque eu já estou na fase da releitura.
Quem são os autores contemporâneos brasileiros que o senhor aprecia?
O Itamar Vieira Junior. Eu li um livro dele, “Torto Arado” [2019], e achei muito bom. É um livro forte, muito denso, quando ele começa com a cena do corte da língua. Uma cena marcante. Uma técnica de prender o leitor, e, ao mesmo tempo, o livro tem princípio, meio e fim.
O que o senhor está relendo atualmente?
Eu sempre releio o Guimarães Rosa [1908-1967]. O Machado de Assis [1839-1908] é impossível a gente não deixar de reler, sobretudo as crônicas.
Como é a sua rotina? E a saúde? Tem dormido bem?
Eu tenho um problema de sono. Sempre dormi pouco, quatro ou cinco horas. Talvez um costume de estudante que varava a noite estudando e tomando café. Hoje, já estou me recuperando: estou dormindo mais, umas seis horas.
Qual é o segredo para chegar nessa fase da vida, saudável, com a cabeça funcionando bem aos quase 95 anos?
Os chineses dizem que é o seguinte: dormir muito, comer pouco e não discutir com mulher [risos].
Qual conselho o senhor daria para o presidente que será eleito em 2026?
Eu acho que o meu partido, o MDB, deve manter o apoio a Lula. Eu tenho essa opinião. Ele [Lula] ainda é o maior líder popular que tem no país. Tem experiência. Está vivendo uma crise de popularidade. Mas os governos sempre alternam em matéria de popularidade.
Só que uma sucessão é sempre imprevisível. Basta ver a política brasileira. O suicídio de Getúlio Vargas [1954]. A doença de Tancredo Neves [1985]. Muitas coisas acontecem. A própria primeira eleição de Lula é consequência das instituições criadas a partir de 1985. Nós tivemos a oportunidade de ter presidentes militares, advogados, engenheiros, médicos e chegamos a um operário no poder. É uma coisa muito difícil. Se dissessem na Inglaterra que um operário iria ao poder, eles cairiam de costas.
Eu sou otimista. Nós consolidamos a democracia. Na minha mão, ela não morreu. Ela foi criada. Foi consolidada. Nós tivemos um período de muitas críticas. Eu paguei por essas críticas. Períodos difíceis. Períodos de ameaça de retrocesso. Tudo isso tivemos. Passei o governo a um opositor, com as instituições consolidadas. Tanto que as instituições venceram o processo de impeachment do presidente que me sucedeu [Fernando Collor, que foi impedido em 1992]. Também tivemos outro impeachment [de Dilma Rousseff, em 2016]. E tivemos esses acontecimentos do 8 de Janeiro.
Jair Bolsonaro empunha a bandeira da anistia para os envolvidos no 8 de janeiro. Um discurso épico que revela que o líder não abandou seu povo, apesar de ser também uma introdução de uma autodefesa, e que vai ser reforçado no ato nacional convocado para amanhã, no Rio de Janeiro. O irônico, no entanto, – para não dizer sarcástico – de tudo isso é que Bolsonaro quer ser o herói da anistia para salvar os aliados da armadilha que ele próprio criou.
Alguém já parou para pensar sobre isso?
Não tivesse ao longo de quatro anos de governo, e mais contundentemente no ano de 2022, instigado a tese de ilegalidade das eleições e, consequentemente, da impossibilidade de aceitar uma eventual derrota nas urnas, não se teria criada um “exército” de inconformados que deixaram suas vidas para mergulhar numa fantasia que os levaram a pagar por ela na dimensão da realidade.
Não tivesse deixado de reconhecer a vitória de Lula. Não tivesse deixado de dar posse ao presidente eleito. Não tivesse ficado em silêncio enquanto seus eleitores se esgoelavam na porta dos quartéis pedindo intervenção militar, muito provavelmente o 8 de janeiro de 2023 teria sido mais um domingo ensolarado de praia e veraneio.
E isso para registrar apenas o comportamento público do ex-presidente, deixando de fora os movimentos internos que foram captados pelo inquérito da Polícia Federal, que já se encontra no STF, de acusação de golpe ao estado democrático de direito.
O fato é que Bolsonaro reaparece em cena para reconectar seus seguidores de olho na salvação da sua própria pele e nas eleições de 2026 usando uma bandeira que só tem razão de ser porque num passado recente muitos aderiram à bandeira que ele empunhara outrora.
Sendo sem perceber, ao mesmo tempo, vítimas e protegidos da mesma pessoa.
A recente notícia sobre a entrega de títulos de propriedade para 2 mil famílias na Comunidade do Pina (Bode), no âmbito da Regularização Fundiária de Interesse Social (Reurb-S), representa um marco histórico para a região. No entanto, é fundamental reconhecer o longo e árduo trabalho que antecedeu esse momento, um esforço que se estendeu por anos e envolveu uma equipe multidisciplinar dedicada.
O processo de Reurb-S na localidade foi autorizado pelo Decreto Municipal nº 35.088, de 22 de novembro de 2021, pelo prefeito João Campos. Atendendo ao que determina a Lei Federal nº 13.465/2017, que permitiu a alienação de imóveis públicos da União, como é o caso do Pina, um território acrescido de área de marinha.
Como ex-técnico da Perpart, durante a gestão Paulo Câmara, tive o privilégio de participar ativamente desse projeto e de outros semelhantes em diversas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). Testemunhei de perto a complexidade do processo, que exigia um profundo conhecimento do ordenamento jurídico e um empenho incansável para superar os desafios burocráticos.
A partir da Lei Federal, intensificamos nossos esforços, realizando um mapeamento detalhado da área com o auxílio de tecnologias de ponta, como drones de alta capacidade, e atualizando todos os cadastros por meio de atendimentos sociais e jurídicos in loco.
A equipe técnica, composta por pesquisadores, geógrafos, biólogos, engenheiros florestais, advogados, assistentes sociais, engenheiros topográficos, civis, cartográficos, urbanistas e arquitetos, trabalhou incansavelmente para garantir a qualidade e a precisão do trabalho, sempre com o apoio e prioridade da gestão Paulo Câmara.
O resultado desse esforço conjunto foi um trabalho técnico robusto e bem fundamentado, que superou as exigências e permitiu a emissão das matrículas dos imóveis junto ao 1º Ofício de Registro de Imóveis do Recife (1º RGI).
É com grande orgulho que vejo o resultado desse trabalho se concretizar, proporcionando segurança jurídica e dignidade para milhares de famílias. No entanto, é importante ressaltar que esse é apenas um passo em direção a uma cidade mais justa e igualitária. Ainda há muito a ser feito para garantir o direito à moradia e à regularização fundiária em outras comunidades. O prefeito João Campos, por meio do programa “A Casa É Sua”, tem avançado significativamente com a meta de emissão de milhares de títulos de propriedades nas ZEIS do Recife, cumprindo o que determina a Lei Municipal do Prezeis.
Neste contexto, a regularização fundiária no Pina é um exemplo de como um trabalho técnico de excelência, o compromisso social e a vontade política podem transformar a realidade de milhares de pessoas. Que esse legado inspire novas iniciativas e que possamos construir um futuro mais justo e inclusivo para todos.
Por fim, o único trabalho que a gestão estadual mais atabalhoada que Pernambuco teve foi sujando um grande projeto com muita pirotecnia, fake news e politicagem, o que é algo extremamente triste para se testemunhar.
*Foi o técnico responsável pelas pesquisas de campo no processo de Reurb-S, no Pina, em 2021.
Por Paulo Silva Pinto Hamilton Ferrari Houldine Nascimento Gabriel Benevides
Do Poder360
O Brasil completa hoje 40 anos de democracia. É o maior período contínuo da história com eleições diretas para presidente, senadores, deputados, governadores, deputados estaduais, prefeitos e vereadores.
Em 1988, o Congresso promulgou uma nova Constituição no país. Substituiu a que estava em vigor desde 1967, quando o Brasil vivia sob uma ditadura. Os governos autocráticos de presidentes militares duraram 21 anos, de 1964 a 1985. Houve várias fases, com diferenças nas restrições à liberdade de expressão e de participação política.
Em 40 anos, a partir de 1985, o PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil foi ultrapassado pelo da China e pelo da Índia. Os 3 países integravam o que se chamava de Terceiro Mundo nos anos 1970. Nos anos 1990, passou-se a usar o termo “emergentes” para designá-los. Atualmente, usa-se Sul Global.
O Brasil conseguiu superar a alta inflação que o primeiro governo civil herdou em 1985. O processo levou nove anos e sucessivos planos econômicos.
José Sarney (então no PMDB) tornou-se presidente em 15 de março de 1985. A inflação mensal havia sido 22% no mês anterior. Sarney tentou controlar a carestia por meio de congelamento de preços no Plano Cruzado em fevereiro de 1986. No início, a inflação caiu. Depois, voltou a subir.
O cruzeiro, moeda em fevereiro de 1986, foi trocado pelo cruzado, com o corte de 3 zeros da moeda anterior. Houve nova troca em janeiro de 1989 pelo cruzado novo, mais uma vez com a divisão da moeda anterior por 1.000. O governo de Sarney teve inflação acumulada de 1.516.073%.
O sucessor de Sarney, Fernando Collor (então no PRN) foi eleito em 1989 na primeira eleição pelo voto direto em 29 anos. Tomou posse em 15 de março de 1990. Naquele mês, a inflação foi de 82,4%. O novo governo decidiu limitar saques de contas bancárias e de Cadernetas de Poupança a apenas 50.000 cruzados novos (o equivalente na época a só US$ 1.300, pelo câmbio oficial, ou US$ 610, no mercado paralelo de dólar).
O dinheiro permaneceu inacessível por períodos variados a depender das empresas e pessoas que os detinham. Na prática, houve um confisco permanente de parte do dinheiro bloqueado. Quando começou a haver liberação, os recursos haviam perdido valor em relação aos preços de produtos e serviços.
Houve seis planos econômicos contra a inflação nos governos de Sarney e Collor. Todos fracassaram.
Só com o Plano Real, em 1994, durante o governo de Itamar Franco (1930-2011), sem partido na época, foi possível conter a inflação.
Fernando Henrique Cardoso (PSDB) planejou a nova moeda como ministro da Fazenda de Itamar. Candidatou-se a presidente em 1994. Venceu no primeiro turno por causa do sucesso do Plano Real.
A taxa acumulada nas três décadas seguintes foi de 730%. É muito para o padrão dos países desenvolvidos. Nos EUA, a inflação acumulada nesse período foi 112%. Mas, consideradas as altas taxas brasileiras na segunda metade de século 20, o período a partir do Real foi de significativa estabilidade.
O economista André Lara Resende, 73 anos, diz que houve demora excessiva para reduzir a inflação no Brasil. Ele participou do Cruzado, em 1986, e do Real, em 1994. Propôs, ainda no Cruzado, substituir a moeda por uma referência monetária indexada. A ideia foi recusada. No Real, foi aceita. Resultou na URV (Unidade Real de Valor), próxima à cotação do dólar na época. Depois, virou a nova moeda. Com isso, eliminou-se a inflação inercial.
Na avaliação de Lara Resende, o combate à inflação consumiu tempo e energia excessivos, que impediram atenção a outras obstáculos. “Imaginava-se, ou pelo menos eu imaginava, que a inflação era o grande fator impeditivo para que o Brasil pudesse enfrentar seus verdadeiros problemas, o atraso estrutural”, declarou.
Decepção com a economia
“O desempenho nesses 40 anos de redemocratização foi muito aquém do esperado, foi profundamente decepcionante”, afirma Lara Resende. Ele diz acreditar que o país precisa criar mecanismos para estabelecer investimentos de longo prazo com “um projeto de país, de infraestrutura, de educação”. Defende que esses planos de investimentos públicos sejam não-coincidentes com mandatos presidenciais.
O economista Maílson da Nóbrega, 82 anos, criticou a Constituição promulgada em outubro de 1988 por ser excessivamente estatizante e favorecer grupos de interesse. Maílson foi ministro da Fazenda de janeiro de 1988 a março de 1990, no governo de Sarney.
Na avaliação de Maílson, a Constituição teria sido diferente caso demorasse mais para ser feita porque o apoio à economia de mercado viria a crescer no Brasil e em outros países. “Por falta de sorte, [a Constituição foi promulgada] um ano antes da queda do muro de Berlim”, afirmou, referindo-se ao episódio de 9 novembro de 1989, que ficou marcado como o epítome dos fatos que resultaram no fim da Guerra Fria – e, por consequência, a preponderância do modelo de economia liberal e de mercado sobre o sistema de Estado grande e centralizador.
Maílson criticou também o regime militar. Disse que reformas relevantes no final dos anos 1960 resultaram no alto crescimento do início dos anos 1970. Mas os erros do período seguinte causaram a crise inflacionária do final da ditadura, que se intensificou depois da redemocratização. “Ditadura é sempre assim: no começo dá certo. Não tem oposição, o governo consegue fazer reformas estruturais. Mas o sistema não tem mecanismos de avaliação. Aumenta muito a taxa de erro”, afirmou.
Gastos públicos excessivos
O ex-ministro também avalia negativamente a falta de investimentos públicos por causa do aumento de outros gastos. “Os recursos do governo foram sendo carreados para programas sociais. O Brasil criou um sistema de bem-estar social semelhante ao de países ricos”, disse. Esse sistema consome R$ 397 bilhões por ano.
Outra crítica de Maílson é sobre o valor das emendas de congressistas ao Orçamento. “O grande desafio nos próximos anos é mobilizar o país em torno de reformas estruturais profundas que revertam a destruição do processo orçamentário. Nenhum país é viável se o governo central dispõe de apenas 4% dos gastos primários para definir prioridades porque 96% já estão determinados. [As emendas] são gastos paroquiais, [resultam em] má alocação de recursos”, disse.
Henrique Meirelles, 79 anos, que foi presidente do Banco Central de 2003 a 2010, nos dois primeiros mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e ministro da Fazenda de 2016 a 2018, no governo de Michel Temer (MDB), diz que o aumento de gastos públicos precisa ser controlado para que o governo tenha mais dinheiro para investir. “Quando há uma maior disciplina fiscal, o país tende a crescer mais e de uma forma mais sustentável”, afirmou.
Meirelles conseguiu em 2016 a aprovação pelo Congresso de uma emenda constitucional para impedir o aumento das despesas de custeio, o Teto de Gastos. Em 2023, o novo governo de Lula conseguiu a aprovação pelo Congresso de novas regras mais frouxas para limitar os gastos.
Infraestrutura
Investimentos públicos são essenciais para a melhora da infraestrutura, que resulta em redução nos custos para empresas e aumento da produtividade. A falta de investimentos no país em 40 anos resultou em limitação para o avanço das rodovias, por exemplo, um dos principais itens de transportes.
O país chegou a 66.520 km de rodovias pavimentadas em 2024 ante 46.455 km em 1985. A alta no período foi de 43,2%. O crescimento havia sido de 282,1% em 21 anos de regime militar (1964-1985).
Indústria
A participação da indústria brasileira no PIB (Produto Interno Bruto) recuou 23 pontos percentuais de 1985 até 2024. O peso dessa atividade na economia do país foi de 48% do PIB para 25% no período.
Maílson da Nóbrega entende que a Constituição de 1988 causou aumento de custos. “Destruiu o sistema tributário de consumo com a autorização dos Estados e municípios para fazer as próprias normas tributárias. É uma bagunça que custou muito o país nesses 40 anos. Isso começou a ser consertado com a reforma tributária”, afirma.
José Ronaldo de Souza, economista-chefe da Leme Consultores, afirma que a indústria do país se tornou menos eficiente em termos comparativos. “A produção foi para os locais com custo mais competitivos, de baixo custo em produtos que são intensivos em mão-de-obra e de alta tecnologia para produtos mais sofisticados”.
Exportações
A fatia brasileira nas exportações globais teve alta de 12% desde 1985. A fatia das exportações da China cresceu 920% no período. A maior parte do crescimento da participação brasileira no comércio internacional é resultado da alta demanda chinesa por produtos do agronegócio brasileiro. Em 50 anos de relações diplomáticas, de 1974 a 2024, a China passou da 38ª posição para a 1ª posição no comércio exterior do Brasil. É o maior comprador e o maior destino de importações brasileiras.
A defesa do candidato derrotado do PRTB à Prefeitura de São Paulo, Pablo Marçal, entrou com um recurso contra a decisão da Justiça Eleitoral paulista que o condenou por abuso de poder político e econômico, uso indevido dos meios de comunicação e captação ilícita de recursos na campanha municipal do ano passado – e que levou o ex-coach a ser declarado inelegível por oito anos, até 2032.
Marçal foi condenado por venda de apoio político. Durante a campanha eleitoral de 2024, ele prometeu gravar vídeos de apoio a candidatos a vereador que fizerem transferências PIX no valor de R$ 5 mil para a campanha dele.
“No caso concreto, a suposta irregularidade se restringiu à publicação de um único story, que permaneceu no ar por pouquíssimo tempo e cuja visualização dependia de ação voluntária do usuário (o interessado deveria clicar na publicação para assisti-la)”, sustenta a defesa de Marçal, em recurso protocolado no final do mês passado, endereçado ao juiz eleitoral Antonio Maria Patiño Zorz, responsável pela condenação do empresário em primeira instância.
“Ou seja, o vídeo não foi veiculado no feed, ambiente no qual as publicações permanecem acessíveis de forma automática (por tempo indeterminado) e contínua para qualquer usuário sem restrição de tempo. A publicação de um único story é suficiente para caracterizar a abusividade necessária ao reconhecimento do abuso de poder midiático e do uso indevido dos meios de comunicação social? Um único story que ficou minutos no ar? Evidentemente que não.”
A defesa de Marçal também alega que, em função do vídeo publicado, prometendo apoio político, recebeu cinco doações que totalizaram R$ 20.055,00 – valores que teriam sido integralmente devolvidos aos respectivos remetentes.
“As doações apontadas como objeto de abuso de poder econômico somam a bagatela de R$ 20.055,00 (vinte mil e cinquenta e cinco reais), quantia absolutamente inexpressiva no contexto global da arrecadação de campanha. Tal valor, por si só, evidencia a desproporcionalidade da condenação imposta, uma vez que não possui qualquer relevância prática para influenciar o resultado do pleito”, sustentam os advogados.
Nos cálculos dos advogados de Marçal, as “supostas irregularidades” nos valores corresponderam a apenas 0,2% do total de doações recebidas – e a menos de 0,03% do teto de gastos da campanha, o que seria um “montante absolutamente irrisório, incapaz de exercer qualquer impacto relevante no equilíbrio da disputa eleitoral, especialmente à luz do princípio da proporcionalidade e da razoabilidade”.
“A mera existência de um grande número de seguidores nas redes sociais — no caso, 5,4 milhões à época — não constitui, por si só, elemento suficiente para caracterizar abuso de poder econômico, sobretudo na ausência de um dispêndio financeiro significativo.”
Adversários moveram ações contra Marçal
Esta foi a primeira condenação de Marçal por ilícitos eleitorais na campanha de 2024 que leva à sua inelegibilidade, o que pode implodir as suas pretensões de disputar a Presidência da República em 2026, caso não consiga reverter a condenação em instâncias superiores da Justiça Eleitoral.
A decisão de Zorz foi tomada no âmbito de ações movidas pelo PSB da deputada federal Tabata Amaral e por Guilherme Boulos, que disputaram com Marçal a corrida pela prefeitura de São Paulo. Marçal acabou de fora do segundo turno, com apenas 56.880 votos a menos que Boulos, o segundo colocado.
Não há previsão de quando o juiz eleitoral vai analisar o recurso do ex-coach.
Ainda cabem recursos ao Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP) e ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para derrubar a decisão, mas aliados de Marçal avaliam que o cenário não é favorável para o ex-candidato do PRTB.
O Sertão tem seus mestres, guardiões de memórias, aqueles que, com paciência e paixão, recolhem os fios do passado e tecem a história de um povo. Nivaldo Alves de Carvalho é um desses homens raros, que vive entre o presente e o passado, entre os campos da pecuária e os pergaminhos da genealogia, entre o que foi e o que ainda pode ser preservado.
Nascido na antiga casa da Fazenda Água Branca, em Floresta – hoje Carnaubeira da Penha –, o destino de Nivaldo parecia já estar escrito nas terras que o viram crescer. Filho de Rosa Maria de Carvalho e de Alcides Alves de Carvalho Barros, e neto do major Tiburtino Alves de Carvalho Barros, herdou o amor pela terra, pelo gado e pelas histórias que moldam o Sertão do Pajeú. Ali, onde os ecos do passado ainda ressoam, Lampião e seus cangaceiros passaram, feridos, sendo cuidados por seu pai Alcides, numa das tantas passagens que unem sua família à própria história do Nordeste.
Pecuarista de alma e coração, Nivaldo não se contentou apenas em criar caprinos e bovinos com a maestria dos grandes homens do campo. Também foi bancário, servindo no Banco do Estado de Pernambuco, mas seu espírito inquieto sempre o levou a algo maior: a busca pelas raízes. Tornou-se genealogista e memorialista, reconhecido como um dos maiores – se não o maior – da história sertaneja. Cada nome, cada família, cada entrelaçamento de linhagens passava por suas mãos cuidadosas, ajudando a construir a identidade de um povo.
Foi consultor de inúmeros livros escritos por florestanos, um verdadeiro guardião dos relatos e das histórias que o tempo tenta apagar. Além disso, esteve entre os precursores do movimento indigenista no Sertão do Pajeú, sempre atento à preservação da cultura e das tradições de um povo que, muitas vezes, vive à margem da própria história.
Hoje, aposentado, mas longe da inatividade, Nivaldo continua sua missão de preservação. Sua fazenda, onde construiu uma nova casa ao lado de sua esposa Amália Adalia Barros, tornou-se um verdadeiro santuário da caatinga, onde a vegetação nativa e os animais sertanejos encontram refúgio. Enquanto seus filhos, Dênis Carvalho e Ariádne Carvalho seguem seus próprios caminhos, ele mantém viva a essência do Sertão, seja na lida com os animais, seja nas páginas que escreve e nos relatos que compartilha.
Membro da ABRAES, a Academia Brasileira de Letras e Estudos do Sertão Nordestino, Nivaldo não é apenas um pesquisador. Ele é um elo vivo entre o passado e o futuro, um contador de histórias que não deixa o Sertão ser esquecido, um homem cuja vida é um tributo à terra que o formou.
E assim segue Nivaldo, entre os livros e o gado, entre as lembranças e a lida, mantendo vivo o Sertão naquilo que ele tem de mais valioso: sua história.
A parceria entre o prefeito de São José do Egito, Fredson Brito, e a governadora Raquel Lyra trouxe um avanço importante para a zona rural do município. Com o apoio da Secretaria de Agricultura do Estado, comandada por Cícero Moraes, foram garantidos 10 poços artesianos para melhorar o abastecimento de água. A medida é um reflexo da promessa de Brito de fortalecer a agricultura familiar, um dos pontos que mais preocupavam os trabalhadores do campo, principalmente durante a sua campanha.
A decisão sobre a localização dos poços será tomada pelo Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural e Sustentável, garantindo que as áreas mais necessitadas sejam atendidas. Brito comemorou a conquista, ressaltando a importância da parceria com o Governo do Estado e destacando que, com os poços, a região terá um fornecimento de água mais estável, impactando diretamente a qualidade de vida e a produção agrícola local.
A saúde no Sertão do Araripe recebeu um grande reforço: é que a destinação de R$ 5 milhões em emendas parlamentares das bancadas estadual e federal do Partido Progressistas (PP) deve acelerar a conclusão do primeiro Hospital do Câncer do Sertão do Araripe, em Araripina. O anúncio, feito ontem durante visita à unidade, reuniu lideranças políticas e representantes da instituição responsável pela administração do hospital.
Os deputados federais Eduardo da Fonte e Lula da Fonte já haviam viabilizado R$ 2,6 milhões para o início das obras. Com o novo repasse, o hospital se aproxima da fase final, o que permitirá atendimento oncológico especializado na região.
A visita contou com a presença do senador Ciro Nogueira (PI), dos deputados federais Eduardo da Fonte (PE), Lula da Fonte (PE) e Júlio Arcoverde (PI), além de deputados estaduais do PP, do prefeito de Araripina, Evilásio Mateus (PDT), e das Irmãs Medianeiras da Paz, que gerenciam o hospital.
Para Eduardo da Fonte, a união política foi essencial para viabilizar os recursos e ampliar o acesso à saúde. “O povo nos dá força, e temos a responsabilidade de transformar essa força em realidade”, afirmou. O deputado também destacou a busca por parcerias com prefeitos do Piauí e Ceará para ampliar o alcance da unidade.
Já Lula da Fonte ressaltou o impacto do hospital para os moradores da região. “Com esse hospital, o povo do Sertão não vai mais precisar percorrer cerca de 700 km até as capitais para se tratar”, destacou. Já o senador Ciro Nogueira elogiou a atuação dos parlamentares pernambucanos e a importância da colaboração política.
O Hospital do Câncer do Sertão do Araripe funcionará no antigo prédio do hotel municipal e já está em fase de restauração. Com a garantia dos recursos, a expectativa é que a unidade entre em operação até o final do ano, oferecendo tratamento especializado e mais acessível para pacientes de Pernambuco e do Piauí.
O presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco, Álvaro Porto, lamentou neste sábado a morte do ex-deputado estadual e ex-presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) Fausto Valença de Freitas.
Em nota de pesar, Porto destacou a trajetória de Freitas nos três Poderes e sua contribuição para a modernização do Judiciário estadual. Ele também expressou solidariedade à família e aos amigos, ressaltando o legado de trabalho e admiração deixado pelo magistrado. Veja, abaixo, nota na íntegra.
Nota de pesar
“Com pesar, recebemos, neste sábado, a notícia do falecimento do ex-deputado estadual e ex-presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco Fausto Valença de Freitas. Homem público com atuação nos três Poderes, teve trajetória marcada por grandes serviços prestados a Pernambuco. Foi secretário de Estado, advogado da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste (Sudene) e da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), trabalhou no Ministério do Interior e tornou-se desembargador como representante da OAB, em vaga do quinto constitucional.
No TJPE, foi Corregedor-Geral de Justiça, chegando, depois, à presidência, de onde comandou exitoso processo de modernização e restruturação física e institucional do Judiciário pernambucano. Por onde passou, Fausto Freitas deixou sua marca de trabalho, fez amigos e conquistou admiradores. Nossos pêsames à esposa, Valéria Gueiros Leite; aos filhos, Andréa, Alexandre, Paola e Cláudia; e aos demais familiares e amigos. Que Deus possa confortar a todos neste momento de despedida”.
Álvaro Porto, presidente da Assembleia Legislativa de Pernambuco
O cantor Amado Batista, de 74 anos, casou-se na última quinta-feira (13), com a miss Calita Franciele, de 23 anos, no Cartório de 2º Ofício de Água Boa (MT). O casal, que já está junto desde o ano passado, optou por oficializar a união formalmente em uma cerimônia discreta na presença apenas da família dos noivos e de alguns convidados mais íntimos.
Amado e Calita se conheceram em junho de 2024, quando o avião do artista passou a visitar com frequência a cidade de Campinápolis. Após iniciarem o namoro, a miss começou a adaptar a sua rotina para poder acompanhá-lo em suas viagens nos shows pelo Brasil. No entanto, quando o casal assumiu publicamente a relação, eles foram alvo de muitas críticas na internet pela diferença de idade existente entre os dois.
O casamento civil foi em total separação de bens, já que a legislação brasileira determina que pessoas com mais de 70 anos não podem escolher entre os regimes de bens. A festa em comemoração à oficialização da união de Amado e Calita está prevista para acontecer hoje, na Fazenda AB, que fica localizada em Cocalinho, no Mato Grosso do Sul. O espaço possui 35 mil hectares e é avaliado em R$ 350 milhões.
A jovem de 23 anos é natural da cidade de Nova Xavantina que fica a 650 km de Cuiabá (MT). A mato-grossense é formada em Biologia, é fluente em Língua Espanhola e foi uma das favoritas ao título de Miss Universo Brasil em 2024, que teve como vencedora a modelo Luana Cavalcante de Recife (PE).
Além disso, Calita tem descendência indígena e sempre deixa claro que possui muito orgulho de suas raízes por conta da rica diversidade de culturas presente no município de Campinápolis. Antes de ingressar no cenário dos concursos de beleza, a jovem também foi técnica administrativa em uma escola.