Por Tales Faria – Correio da Manhã
Dizem os escritos cristãos que a “extrema unção” é um dos sete sacramentos da Igreja Católica, administrado a doentes e idosos em perigo extremo de perder a vida. Tem o objetivo de fortalecer a alma e, se for da vontade de Deus, conceder a cura.
A extrema unção é ministrada por um sacerdote por meio da unção com “óleo abençoado” a fim de oferecer perdão de pecados, conforto e preparação para a morte. Essa aproximação extrema do seu fim é a situação que vive hoje no Congresso o projeto de anistia ampla, geral e irrestrita: está à beira da morte.
Leia maisO relator do projeto na Câmara, deputado Paulinho da Força (Solidariedade-SP), até já mudou o título para “Projeto da Dosimetria”: em vez de anistia ampla, geral e irrestrita, tratará da diminuição das penas para a raia miúda dos invasores das sedes dos Três Poderes.
A minuta do projeto divulgada pelos bolsonaristas beneficiava o chamado “núcleo crucial” do comando da tentativa de golpe de Estado, chefiado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Os bolsonaristas contavam salvar a anistia ampla pelo “óleo abençoado” do interesse do centrão em outro projeto, a chamada PEC da blindagem. Trata-se da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que blindaria parlamentares e presidentes de partidos contra investigações e processos por acusação de cometimento de crime comum.
O acordo chegou a ser fechado e resultou na rápida aprovação da urgência para a votação da anistia na Câmara, logo após a aprovação da PEC da Blindagem, no último dia 16.
A bancada do PL votou quase unanimemente a PEC: 83 deputados a favor, apenas cinco ausências e nenhum voto contra. Somaram-se ao centrão, cujo núcleo de partidos (PP, União Brasil e Republicanos) deu 141 votos a favor, apenas 7 contrários, uma abstenção e cinco ausências.
Mas nesta quarta-feira, 24, o Senado enterrou a PEC da blindagem. O enterro ocorreu na Comissão de Constituição e Justiça da Casa ao negar por unanimidade a constitucionalidade do texto proposto.
O motivo nada teve a ver com o juridiquês de constitucionalidade ou inconstitucionalidade. A PEC, antes aprovada rapidamente pela Câmara com mais de 300 votos, morreu por motivo político: o rompimento do acordo entre o centrão e o PL do ex-presidente Jair Bolsonaro.
O acordo foi quebrado por causa das manifestações populares contra a blindagem que amarraram o centrão aos bolsonaristas. Uma ligação perigosa às vésperas das eleições do ano que vem, quando a popularidade de Bolsonaro e seus filhos são atropeladas pelo trabalho do clã em favor do tarifaço de Donald Trump contra as empresas brasileiras.
O centrão passou a considerar tóxica a proximidade com o bolsonarismo e rompeu o acordo. Enterrou a PEC com pompa e circunstância na CCJ do Senado, sem chances de deixar o projeto ir ao plenário e obrigando até os bolsonaristas a votarem pelo fim da blindagem.
Líder da Minoria no Senado e dos bolsonaristas, até Rogério Marinho (PB), que tinha sugerido simpatia pelo projeto mudou de enfoque. Votou pela derrubada argumentando que “o Brasil não precisa de blindagem” e que “quem está blindado é o STF”.
Foi a linha seguida pelos demais bolsonaristas na CCJ para também votar pelo enterro do PL. Afinal, o tal “óleo abençoado” não veio.
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