As duas maiores lideranças políticas do País começam 2025 sob o peso de grandes desafios. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) inicia o terceiro ano de seu mandato sob a desconfiança do mercado, alimentada pela alta do dólar, juros elevados e inflação persistente. Paralelamente, no campo político, cresce a pressão por uma reforma ministerial que reorganize a base do governo e fortaleça as alianças com vistas às eleições de 2026. Já o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) encara um caminho ainda mais árduo: tentar reverter sua inelegibilidade ou manter a influência sobre a escolha do candidato para enfrentar o PT.
Aliados do presidente petista acreditam que a reforma ministerial deve começar a sair do papel no início do próximo ano, com o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, puxando a fila das primeiras mudanças. Desde o início do ano, Múcio tem sinalizado a Lula o desejo de deixar o cargo, mas acabou permanecendo na pasta a pedido do presidente. Nos bastidores, o nome mais cotado para assumir a Defesa é o do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), atualmente à frente do ministério de Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços. Em um dos cenários avaliados, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), seria indicado para assumir a pasta hoje ocupada por Alckmin.
Outra mudança tida como provável é na Secretaria-Geral da Presidência, liderada pelo ministro Márcio Macêdo — que já foi alvo de críticas públicas do presidente. Aliados de Lula ouvidos reservadamente avaliam que a relação com os movimentos sociais, responsabilidade da secretaria de Macêdo, foi um dos pontos fracos do terceiro mandato do petista. Há um consenso de que a relação com os movimentos “esfriou” pela falta de articulação política do ministro, deixando o governo sem apoio social para muitas das medidas adotadas ao longo desses dois anos.
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Ainda não está claro se Macêdo permanecerá no governo caso deixe a Secretaria-Geral. O espaço dele poderá ser ocupado por Paulo Pimenta, que está de saída da Secretaria de Comunicação Social, onde o principal cotado para substituí-lo é o marqueteiro Sidônio Palmeira.
Algumas pastas seguem em situação indefinida, apesar da pressão de setores do PT por mudanças, o que tem ampliado as cobranças sobre Lula. Um dos focos de tensão é o Ministério do Desenvolvimento Social, liderado por Wellington Dias. A pasta é vista como estratégica por ser responsável por políticas como o Bolsa Família. No entanto, há quem avalie que Dias não tem atendido às expectativas do cargo, defendendo sua substituição pela presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann.
Há também especulações sobre a possível saída do ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, que estaria demonstrando descontentamento com o governo, além de cansaço. No entanto, aliados do presidente, incluindo membros da ala ligada ao Grupo Prerrogativas, têm defendido sua permanência no cargo.
As mudanças no primeiro escalão do governo têm como objetivo melhorar o desempenho em áreas que, na avaliação de Lula, não estão entregando os resultados esperados. A estagnação na aprovação do presidente, apontada nas últimas pesquisas, reforça a necessidade de ajustes. Além disso, as trocas devem considerar partidos que possam compor a aliança do presidente para 2026.
Lula ainda terá de lidar no próximo ano com a crescente desconfiança do mercado em relação à política econômica de seu governo. Se por um lado o pacote de cortes de gastos é considerado insuficiente, por outro, a alta do dólar, os juros elevados e a inflação fora da meta reforçam o clima de incerteza econômica.
Somado a isso, aliados avaliam que o governo precisa avançar também com a PEC da Segurança. Governistas consideram que a decisão de pautar a proposta, que amplia as competências federais no combate ao crime organizado, foi acertada. No entanto, apontam falta de empenho de outros ministérios, especialmente da Casa Civil, em mobilizar o governo e a sociedade civil em torno do tema. “Houve uma oportunidade rica, mas não soubemos aproveitar”, disse, reservadamente, um aliado próximo a Lula, destacando que o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, e o advogado-geral da União, Jorge Messias, acabaram isolados na condução da discussão.
Bolsonaro tem maiores desafios na Justiça
O ex-presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, encerra o ano com três indiciamentos pela Polícia Federal (PF) no currículo — por fraude no cartão de vacina, desvio de joias entregues pelo governo saudita e tentativa de golpe de Estado —, situação que pode levar à sua condenação perante o Supremo Tribunal Federal (STF). Os três crimes atribuídos pela corporação contra ele podem resultar em 28 anos de prisão.
O destino jurídico do ex-presidente é considerado crucial para a sua influência na candidatura que o bolsonarismo venha a lançar em 2026 para enfrentar o PT. Discute-se no entorno de Bolsonaro repetir a estratégia petista de 2018, quando Lula estava preso e foi inscrito como cabeça de chapa presidencial mesmo assim. Com o ex-presidente petista impedido de concorrer, o então vice Fernando Haddad assumiu o seu lugar, beneficiando-se da transferência de votos do aliado e chegando ao segundo turno. No caso do PL, o nome do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) é cogitado para a empreitada similar.
Pelo caminho há a Procuradoria-Geral da República (PGR). Se o chefe da instituição, Paulo Gonet, optar pela denúncia e o STF aceitá-la, Bolsonaro e seus aliados serão transformados em réus, iniciando uma nova fase de apuração e julgamento. Ao final do processo, eles podem ser condenados ou absolvidos pelo Supremo.
Há uma aposta entre os bolsonaristas mais otimistas de que a gestão do presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, aliado de Bolsonaro, possa interferir positivamente no andamento dos processos contra Bolsonaro. Anos de articulação com aliados do republicano deram a Eduardo um raro acesso a Trump — comprovado com o convite ao espaço restrito de seu comitê em Mar-a-Lago, na Flórida, na noite em que foi decretada sua volta à Casa Branca.
Enquanto Bolsonaro luta para manter a influência sobre o futuro da direita, o seu campo político sofre rachaduras que podem desembocar em candidaturas independentes do clã. A bancada federal do PL hoje é menos coesa do que quando foi eleita em 2022 na medida em que cresce o número de insatisfeitos com o ex-presidente.
O descontentamento desses aliados se põe sobre dois principais motivos. Um deles é a “ingratidão” com que definem o tratamento dado por Bolsonaro em retribuição às demonstrações de lealdade nos últimos anos. O outro, a preferência do ex-presidente a candidatos do Centrão em detrimento de “bolsonaristas raiz” nas articulações das eleições municipais.
Os atritos se encontram aos montes. Hoje grandes máquinas de voto como Carla Zambelli (PL-SP, 946 mil votos), Ricardo Salles (Novo-SP, 641 mil) e Nikolas Ferreira (PL-MG, 1,5 milhão) estão mais distantes de Bolsonaro. O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), encontra-se tanto rompido com o ex-presidente quanto tornado inelegível por uma decisão da Justiça Eleitoral de seu Estado — cabe recurso. Em Minas, o bolsonarismo ensaia lançar um nome próprio para concorrer contra a candidatura apoiada pelo governador Romeu Zema (Novo), presidenciável da direita. O próximo ano ditará se a extrema direita vai chegar ainda mais rachada para um pleito que deve testar o capital eleitoral de seu principal líder.
Do Estadão.
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