O irreal tem a mesma substância dos sonhos
A cada dia, postando nas suas redes o que mais aprecia – vender doces ilusões – fico convencido de que a governadora Raquel Lyra (PSDB) não leva a inteligência dos pernambucanos a sério. Sua mais recente provocação: incutir a ideia de que a extensão da duplicação da BR-232, de São Caetano, até Serra Talhada, e não Arcoverde, projeto original, já é uma realidade palpável, quando, na verdade, é uma sombra imperfeita do que seria realidade.
Estou convencido ainda de que o modo dela de governar não procura o real, persegue o irreal. Do irreal, só resulta a impotência, porque o que não é possível conceber não se pode dominar. Raquel, meus caros leitores, não está duplicando a 232 até Serra, até porque a estrada não lhe pertence. É federal. E o Governo Lula está em fase do exercício implacável da tesoura. A ordem do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é cortar.
Leia maisAté o social não escapa, conforme protestou a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, provocando a ira no seio do núcleo duro do Governo. Se não há dinheiro para programas sociais, de onde vai aparecer grana para a duplicação de um projeto em Pernambuco que não está entre as prioridades de Lula? O ex-governador Jarbas Vasconcelos fez a duplicação do Recife a São Caetano com dinheiro azul e branco, do tesouro estadual, resultado da privatização da Celpe.
Um erro grosseiro, diga-se de passagem, porque Jarbas se apoderou de uma concessão federal e até hoje o Estado não consegue resolver um imbróglio em Brasília por conta do desvio de finalidade. Mas era uma promessa de campanha e ele botou na cabeça que tinha que cumprir de todo jeito, mesmo a União, dona da estrada, não ter colocado um centavo na obra.
A governadora não está iniciando a duplicação de São Caetano a Serra Talhada. Apenas autorizou a contratação de um estudo de viabilidade técnica, que se não me falha a memória, já existe, iniciativa do governo passado. Se já existe, por que então gastar rios de dinheiro para fazer um novo estudo? Grande parte do que vejo de propaganda deste governo é irreal. E o irreal é feito da mesma substância de que são feitos os sonhos.
RESTAURAÇÃO SONRISAL – Seria cômico se não fosse trágico sair do Recife pela BR-232 e se deparar com outdoors, pagos pelos impostos dos contribuintes, passando a informação de que a duplicação até o Sertão já é realidade. Raquel espalha fake news. Devia compreender que está gerando uma grande esperança. Esperança gera expectativas reais quando tudo parece irreal. Aliás, as obras de restauração que começaram na mesma estrada federal são iguais a Sonrisal: em muitos trechos, a buraqueira já é vista do mesmo jeito, para infelicidade dos que transitam pela via mais movimentada do Estado.

Um ano para se chegar ao projeto! – A governadora diz que vai investir R$ 5,1 bilhões no chamado Programa PE na Estrada, no qual o projeto de viabilidade técnica para duplicação da BR-232 até Serra Talhada está incluído. O primeiro lote do projeto, segundo o Governo, vai de São Caetano e Arcoverde, extensão de 108,9 quilômetros. Já o segundo lote atende ao trecho entre Arcoverde e Serra Talhada, com 156 quilômetros de extensão. A previsão é de que os projetos sejam concluídos em dez meses e que as obras sejam iniciadas no primeiro semestre de 2026. Ou seja, só o projeto vai consumir quase um ano para sair do papel, mas a governadora vende gato por lebre, a ideia de que a duplicação é cristalina na realidade. Coitados de nós, pobres mortais pernambucanos!
Custo dos estudos é R$ 40 milhões – Os editais de licitação para elaboração do projeto de duplicação da BR-232, entre as cidades de São Caetano, no Agreste, e Serra Talhada, no Sertão, já estão no Diário Oficial. De acordo com as publicações, as empresas contratadas serão responsáveis por elaborar estudos e relatórios de impacto ambiental e o projeto básico e executivo de engenharia para a duplicação, adequação e restauração da pista da rodovia. Para essa fase inicial de elaboração dos projetos, os contratos terão valor total de R$ 37,2 milhões.
Ainda vão à caça do dinheiro – O próprio secretário de Infraestrutura do Governo do Estado, Diogo Bezerra, admite que a governadora não tem dinheiro para duplicação da estrada. “Com o projeto em mãos, iremos buscar recursos e fazer essa grande entrega para a população”, diz ele. O secretário, entretanto, vai encontrar as portas federais fechadas em Brasília. O Ministério da Fazenda está anunciando um bloqueio da ordem de R$ 5 bilhões no orçamento do ano que vem, sob os protestos de vários ministros, inclusive de Renan Filho, dos Transportes, única porta que estaria aberta para o secretário.

Cortes podem ter impacto de R$ 70 bilhões – O governo Lula engajou em um discurso sobre os cortes de gastos para equilibrar as contas públicas, mas ainda não houve anúncio oficial. É a quarta semana que o tema toma conta da equipe econômica. O governo se comprometeu a acabar com o rombo nas contas públicas em 2024. O objetivo é que os gastos sejam iguais às receitas e espera-se um déficit zero. Na prática, é necessário aumentar a arrecadação e diminuir despesas. Entretanto, pouco foi feito pelo lado da segunda opção. Por isso, a cobrança do mercado financeiro pelo anúncio das medidas. O Congresso sinalizou que o impacto total do pacote deve ser de R$ 70 bilhões.
CURTAS
PLANOS – O governo federal espera mexer com uma série de despesas no pacote que visa reduzir os gastos públicos. Os planos incluem mudanças nas regras do salário-mínimo, no abono salarial e na pensão dos militares.
MILITARES – Segundo o ministro Fernando Haddad, o corte dos gastos com militares deve trazer uma economia anual de R$ 2 bilhões aos cofres públicos. As medidas incluem a determinação de uma idade mínima para aposentadoria e o fim da pensão a familiares de militares expulsos do Exército.
BLOQUEIO – O ministro descartou a possibilidade de contingenciamento, mecanismo usado quando as receitas do governo vêm abaixo do esperado. O que se enxerga é o contrário, a arrecadação com impostos tem batido recordes. “Talvez seja um pouquinho mais, mas é na casa dos R$ 5 bilhões. É bloqueio porque a receita está correspondendo às expectativas”, disse.
Perguntar não ofende: Quanto custa a duplicação da BR-232 até Serra Talhada?
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