Há três cidades que povoam meu coração de forma ardente e apaixonante: Afogados da Ingazeira, minha pátria-mãe, Recife, que me acolheu como retirante, e Brasília, onde meus sonhos profissionais se concretizaram. Capital da política, economia, cultura e esperança, Brasília completa amanhã 65 anos.
Celebrar a existência da moderna capital brasileira é comemorar a criação humana, sua capacidade de inventar a vida em novas formas, com novos conteúdos. Amo Brasília porque, além de ter o pôr do sol e os ipês mais lindos do País, é também onde as vidas se transformam. Não há nada mais apaixonante do que surfar no seu céu azul de nuvens doidas.
Juscelino Kubitschek, seu grande idealizador, compartilhou seu sonho com Lúcio Costa, urbanista responsável pelo plano da cidade, transformando-a em um destino moderno, funcional e, por que não, geométrico. Mas Brasília não é obra isolada de JK, o homem que fez do Brasil em cinco anos uma nação próspera que valeu por 50 anos, como era seu slogan.
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Há também figuras memoráveis, como Athos Bulcão, com seus azulejos coloridos, que deram vida aos prédios públicos da cidade, enquanto Darlan Rosas, com suas esculturas, e Burle Marx, com seus jardins, trouxeram leveza para o cenário brasiliense.
Gênio por sua contribuição à arquitetura moderna brasileira e sua influência global, Oscar Niemeyer usou as curvas como elemento fundamental em suas obras. Em Brasília, criou edifícios icônicos e inovadores, um de seus maiores legados.
Brasília, com sua arquitetura moderna e original, é um exemplo paradigmático do seu trabalho e foi declarada Patrimônio Histórico da Humanidade pela Unesco. As mulheres, sempre as mulheres, também desempenharam um papel crucial na construção da capital federal.
Entre elas, Dulcina de Moraes na cultura, ao fundar a primeira escola de teatro da cidade, e Sarah Kubitschek, que, além de esposa de JK, contribuiu para as iniciativas sociais e culturais da nova capital. Esses grandes nomes deixaram suas marcas na cultura, política, arte e sociedade.
Brasília é reconhecida como a cidade de melhor qualidade de vida do País. Também se destaca em áreas cruciais, como saúde, segurança e bem-estar, o que a colocou no topo do ranking nacional. Sou apaixonado pela beleza da sua arquitetura moderna. Também pelo seu céu, que para Lúcio Costa é o mar da cidade. Para mim, a beleza de Brasília está na sua amplidão.
De vez em quando, algumas pessoas, certamente desinformadas, costumam malhar Brasília como centro de corrupção, paraíso dos políticos de má-fé. Esses, entretanto, não vivem a cidade, são personagens flutuantes, que usam seus poderes para atos nada republicanos.
Mas a cidade não pode ser confundida com malandragem de políticos. Amo Brasília e não admito que falem mal dela. Me considero brasiliense, foi nela que cresci como ser humano. Meu filho primogênito nasceu na cidade, que me acolheu, me deu régua e compasso para ser gente na vida.
Aos que denigrem a cidade, respondo com poesia: Brasília é senhora de curvas sinuosas e de estética atrevida. De mãos dadas com o céu azul, mar do cerrado, sua arquitetura contraria a lógica e flerta com a razão. Na geometria rigorosa de seu plano, a capital do Brasil mistura poesia concreta e versos formados em esquadro e papel.
Como não se apaixonar por sua amplidão, que entorpece os olhos e cala a alma? Como não admirar o Lago Paranoá, que parece cortejar a cidade e fica corado ao pôr-do-sol, tal qual namorado ensimesmado ante tamanha beleza? E a Catedral, qual templo que brota do solo e ergue os braços rumo ao sagrado?
Ou o Palácio do Planalto, que parece levitar no meio de uma obra de arte sempre inacabada? O Alvorada surge no horizonte como miragem de linhas, retas e segredos. Brasília é antítese de si mesma. Impávida e tímida, vaidosa e recolhida, romântica e bruta, formosa e crua.
É local de opulência e de ostentação, mas também de miséria e de sonhos. Brasília é fé e misticismo. Baú de histórias da própria história do Brasil. Posses presidenciais, protestos, impeachments. Terra de candangos que vieram em busca de uma vida melhor. Da profecia de Dom Bosco e do Vale do Amanhecer. Das tesourinhas e dos eixinhos.
Das quadras espaçosas e dos pilotis protetores e aconchegantes. Do Parque Dona Sarah Kubitschek e da Ermida Dom Bosco. Das famílias que se sentam no gramado do Eixo Monumental, acima do Memorial JK, para contemplar o crepúsculo e celebrar a amizade e a vida.
Do Eixão do Lazer. Dos vitrais mágicos do Santuário Dom Bosco. Dos olhares distantes da Flor do Cerrado e da Torre de TV. De Lucio Costa, Burle Marx e Athos Bulcão. Honesta, trabalhadora, ética. Impossível não se apaixonar por uma obra prima do urbanismo e da arquitetura arrojada e moderna. O legado de Oscar Niemeyer ressoa mundo afora.
Estrangeiros visitam os monumentos e não conseguem esconder a perplexidade. Sim, brasilienses de nascimento, ou adotados em algum momento da vida, têm a sorte de admirar tanta beleza. De nos apaixonar por suas curvas sinuosas e estética atrevida.
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