Por Fernando Rêgo Barros*
A relação do governo do presidente Lula com a Venezuela é, para dizer o mínimo, ambígua. Lula demorou quase um mês para declarar que não reconhecia o resultado das eleições do fim de julho do ano passado, que mantiveram no poder o ditador Nicolás Maduro. Mesmo assim, o brasileiro não foi enfático nesse não reconhecimento. Preferiu cobrar transparência na divulgação das atas, coisa que até hoje não aconteceu por parte do governo do seu colega venezuelano.
Nunca é demais lembrar que, no primeiro momento, Lula havia afirmado que não tinha visto nada de anormal na disputa, embora vários líderes mundiais já tivessem, naquele momento, chamado a atenção para as evidências de fraude nas eleições venezuelanas. Na época, o Conselho Nacional Eleitoral (o equivalente na Venezuela ao nosso Tribunal Superior Eleitoral) se apressou em declarar Maduro como vencedor do pleito, mesmo sem ter apresentado nenhuma prova. Tal decisão tirou toda a credibilidade do resultado anunciado.
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Lula, agora, decidiu não ir à posse de Maduro, marcada para o próximo dia 10 de janeiro. Mas designou a embaixadora do Brasil na Venezuela, Glivânia Maria de Oliveira, para representar o país na cerimônia. O argumento é que o envio de um representante brasileiro indicaria a intenção de manter o diálogo aberto com nosso vizinho. A despeito de todas as possíveis explicações diplomáticas, acredito que não mandar um representante seria a melhor forma de o governo brasileiro marcar posição, demonstrando de fato seu descontentamento com a atual situação venezuelana.
Não defendo o rompimento de relações diplomáticas com Caracas, afinal, existem muitas outras razões, humanitárias e econômicas, para se buscar um entendimento entre os dois países. Mas é preciso ser firme na defesa das suas ideias. Se Lula quer defender os princípios democráticos, não parece coerente querer que seu governo esteja representado na posse do ditador venezuelano.
É do conhecimento de todos o desejo de Lula de que o Brasil volte a ocupar uma posição de liderança na América Latina e até mesmo no Hemisfério Sul. A hesitação em momentos relevantes da geopolítica mundial, porém, acaba depondo contra a intenção do líder brasileiro. Todos devem lembrar que, logo no início do seu terceiro mandato, há dois anos, uma das frases mais repetidas pelo governo Lula foi “o Brasil voltou”, no sentido de que o país havia recuperado o respeito no cenário global. Ela aparecia com frequência nas campanhas publicitárias e nas redes sociais do governo federal. E é fato que não deveria ser necessário um grande esforço para tanto, dada a total fragilidade e quase inexistência da política externa brasileira nos quatro anos de governo de seu antecessor.
Para que o Brasil retome o prestígio internacional é necessário que seu presidente seja, antes de tudo, transparente. Não dá para falar em defesa da democracia e não se posicionar, com firmeza e presteza, contra desmandos autoritários, seja lá de quem forem tais desmandos. Ditadores de plantão, de direita ou de esquerda, serão sempre ditadores.
*Jornalista
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