No dia seguinte à condenação de Jair Bolsonaro pelo Supremo Tribunal Federal, dirigentes do PL e aliados próximos ao ex-presidente abriram uma frente paralela de articulação política. Além do esforço no Congresso para aprovar uma proposta de anistia, eles passaram a sondar ministros da Corte em busca de sinais de receptividade a uma eventual lei que possa beneficiar tanto Bolsonaro quanto os condenados pelos atos do 8 de janeiro de 2023.
O movimento é conduzido por integrantes da cúpula do PL, à exemplo do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), líder da bancada do partido na Câmara. Ainda na noite de quinta-feira, durante uma vigília em frente ao condomínio onde Bolsonaro cumpre prisão domiciliar, Sóstenes declarou:
— Tem a questão da constitucionalidade. Os onze ministros do STF vão ter que se manifestar. Nós vamos precisar de seis votos lá. E esse trabalho já começou a ser feito. Muitas pessoas estão trabalhando e eu sou uma delas. As informações são do jornal O Globo.
Leia maisNo grupo, a avaliação é que não basta conquistar votos no Legislativo: sem algum entendimento prévio com o Supremo, a anistia corre alto risco de ser considerada inconstitucional e derrubada logo após a aprovação.
O ex-presidente foi condenado ontem pela Primeira Turma do STF, formada por cinco ministros, sendo que quatro votaram pela condenação. Na Corte, há outros seis magistrados que não participaram do julgamento, e são esses que a oposição mira.
Entre os ministros já procurados estão Luiz Fux, voto divergente no julgamento, e aqueles que não participaram da decisão: André Mendonça e Kassio Nunes Marques, indicados por Bolsonaro, e Gilmar Mendes, que vem sendo sondado desde que medidas cautelares foram aplicadas ao ex-presidente.
A estratégia inclui ainda tentativa de aproximação com o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, visto como figura-chave para medir a disposição interna do tribunal. No entanto, a fala de Barroso ontem, quando disse que a finalização do julgamento encerrou um “ciclo de atraso” no país, esfriou os planos dos aliados.
Não há expectativa de diálogo com Alexandre de Moraes, relator da ação que levou à condenação, nem com ministros como Flávio Dino e Cármen Lúcia, que fizeram votos considerados mais duros. O presidente da Primeira Turma, Cristiano Zanin, ainda não foi procurado, mas, por ter perfil cristão e mais conservador, pode ser procurado nos próximos dias.
Esse tipo de sondagem não é inédito. Duas semanas antes da decisão contra Bolsonaro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também buscou ministros para discutir a hipótese de anistia. Na ocasião, o governador não obteve sinalizações positivas.
A avaliação predominante entre magistrados é de que uma anistia ampla e irrestrita, que alcance Bolsonaro e todos os condenados pela tentativa de golpe, dificilmente resistiria ao crivo constitucional. Para integrantes do STF, tal proposta seria derrubada, mesmo que setores do Congresso insistam em avançar na pauta.
As conversas da oposição são apresentadas pelos articuladores como uma reação institucional, mas ministros ouvidos reservadamente classificam o movimento como pressão política, deflagrada em tempo recorde após o julgamento. Para eles, a ofensiva dificilmente terá sucesso.
No Congresso, a articulação mira a escolha de um relator favorável e a construção de maioria para aprovar o projeto. O presidente da Câmara, Hugo Motta, não tem dado sinais de que pautará a proposta, mesmo sob pressão de interlocutores de Bolsonaro.
Líderes do Centrão já ponderam a possibilidade de aprovar um texto que não inclua o ex-presidente, alternativa aceita por ala menos dura do PL. O entorno de Bolsonaro, contudo, insiste que não dará votos a esse projeto.
Bolsonaro foi condenado a 27 anos e três meses de prisão na chamada trama do golpe e permanece em prisão domiciliar até que o processo transite em julgado.
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