Tabira, separada de Afogados da Ingazeira por apenas 20 km, virou um centro de estudos literários depois que Deus chamou em 2016, aos 91 anos, Maria das Neves Pires da Silva, ou simplesmente a poetisa Nevinha Pires, a Cora Coralina de Tabira.
Em seus versos poéticos, o amor sem limites pela sua cidade era latente, como o amor de Cora por sua Goiás Velho. Na última consulta a uma geriatra, levada pelo médico Pedro Pires, seu único e amado filho, Nevinha foi provocada a escrever uma frase qualquer. De suas mãos brotou: “Eu amo Tabira”.
E amava de verdade, na palavra e no verso. Com o coração e a alma. Se Cora Coralina foi uma autora que se destacou pela simplicidade de expressão, amor pelo semelhante e comunicação humana, Nevinha se destacou pelo amor a Tabira.
Leia maisCom o tempo, virou a própria memória da cidade. A sorte de pobres e ricos passou pelas suas mãos. Antes perdida no tempo e no espaço e hoje dona de seu passado, Tabira deve muito a Nevinha. Foi ela quem, em cartas, discursos e livros, escreveu a sua história.
A terra era distrito quando o pai, comerciante hábil, chegou à Prefeitura de Afogados da Ingazeira e a emancipou. E se o velho Pires se tornou líder político, foi porque Nevinha escrevia os discursos e os lia no coreto da praça. Era a própria conselheira do marido político, que governou Afogados da Ingazeira e Tabira e pela região do Pajeú foi eleito deputado estadual.
Para eternizar Nevinha, Pedro, o filho, ergueu na praça central de Tabira uma escultura em homenagem à mãe. Virou parada obrigatória para os turistas. Todos querem sentar no banquinho e fazer uma foto ao lado da sua imagem. Minha Nayla e eu choramos de emoção ontem ao posar ao lado da escultura de Nevinha.
Ficou linda! Pedro Pires, o filho apaixonado, foi mais além. Criou um festival literário de Tabira com o nome da mãe. Nevinha estudou em um colégio de freiras e depois cursou Pedagogia, Contabilidade e Licenciatura em História. Era constantemente procurada pelos moradores do município, que pediam sua ajuda para escrever cartas aos parentes distantes ou solicitações às autoridades.
Ensinou por 40 anos. Quando batiam à porta pedindo à moça letrada que interviesse, escrevia de cartas aos parentes no sul a pedidos a autoridades, com a caligrafia das freiras. No velório, um amputado chorou: sua carta ao presidente lhe garantiu a aposentadoria.
Viúva, aposentada e após ter feito do filho médico, decidiu verter o dom em livros. De arquivos e genealogias fez “Tabira e Sua Gente”; dos causos folclóricos do sertão, “Tabira: História e Estória”. E cavou um estudo geopolítico da região que políticos como Marco Maciel tiravam do bolso na hora de discursar. Não parou nem com a escoliose, a mesma de Frei Damião.
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