A M4 foi aberta no ano de 2022 para trabalhar na campanha eleitoral de Lula e, atualmente, sob o nome de Nordx, presta serviços para o diretório nacional do PT. Questionado, o empresário disse que a produtora foi escolhida em processos de concorrência por “adequação técnica” e pela oferta de menor preço.
Chico Kertész, como é conhecido, atualmente é sócio-administrador da agência Nordx. Sidônio ainda integra o quadro societário. Por ser ministro, porém, ele não pode mais ser sócio-administrador da empresa, função que também exercia quando a agência foi aberta.
A relação comercial entre Chico e Sidônio é anterior a essa empresa. A produtora Macaco Gordo presta serviços há diversos anos para a agência de publicidade de Sidônio, a Leiaute na execução dos contratos de publicidade do governo petista da Bahia, mas não trabalhava para o governo federal.
Com a vitória de Lula na disputa à Presidência da República, Sidônio passou a ser consultado em assuntos vinculados à imagem do governo. Em maio de 2024, por exemplo, quando o governo lançou campanha “Fé no Brasil”, Sidônio recebeu crédito de idealizador. Em janeiro deste ano, foi nomeado para a Secom da Presidência da República.
Chico também passou a frequentar eventos políticos em Brasília. Em 2025, com Sidônio já no posto de ministro, o dono da Macaco Gordo fez 13 visitas ao Palácio do Planalto entre janeiro e junho. Todas para se encontrar com Sidônio. Ao Estadão, Chico disse que os encontros foram “de cunho pessoal, sem que jamais tenha sido tratado das atividades da Macaco Gordo”.
Ele também é dono de uma rádio em Salvador, que tem uma linha de cobertura elogiosa a Lula e é ancorada por seu pai, o ex-prefeito de Salvador Mário Kertész.
No caso da Caixa, os pagamentos se intensificaram em 2025, após Sidônio ter se tornado ministro. A produtora do seu sócio foi a que recebeu os maiores valores para executar as peças publicitárias da estatal neste ano, em um total de R$ 4,3 milhões. Procurada, a Caixa diz que as contratações seguiram as normas legais (leia mais abaixo).
Os pagamentos das estatais ao sócio de Sidônio ocorrem de forma indireta. Assim como outros órgãos públicos, a Caixa e a Embratur mantêm contratos com agências responsáveis por criar campanhas publicitárias sob demanda, que foram contratadas por meio de licitação.
Quando esses serviços são executados, as agências subcontratam produtoras de vídeo, mas sem um processo licitatório formal. A partir de 2024, a Macaco Gordo foi contratada para produzir oito campanhas – seis delas do banco estatal e duas da empresa de turismo. Os dados foram obtidos pelo Estadão por meio da Lei de Acesso à Informação.
O órgão público não transfere o dinheiro diretamente para a produtora. Os valores são pagos às agências de publicidade, que ficam com o lucro correspondente e repassam parte dos recursos para as produtoras. Por isso, essas produtoras não aparecem nos portais do governo federal como empresas contratadas.
Não existe exigência de licitação para contratar essas produtoras. A agência de publicidade, porém, precisa fazer uma cotação de preços no mercado com no mínimo três diferentes propostas para justificar a contratação da mais barata. Esse procedimento não precisa seguir os parâmetros de transparência e publicidade definidos pela Lei das Licitações, já que a contratação não é feita diretamente pelo poder público. Mas, ao final da produção da campanha publicitária, o órgão público precisa dar sua aprovação ao processo.
Mesmo assim, nem sempre a regra dos orçamentos é cumprida. Os documentos obtidos pelo Estadão mostram que o maior pagamento recebido pela Macaco Gordo, para realizar uma campanha sobre renegociação de dívidas atrasadas para a Caixa, no valor de R$ 2,3 milhões, teve um aditamento com a dispensa na pesquisa de preços. A contratação foi em 2025.
A agência Calia, responsável pela campanha, fez uma cotação para produzir filmes publicitários de 30 segundos. A Macaco Gordo arrematou o serviço com uma proposta de R$ 1,6 milhão. Em seguida, a agência complementou o serviço contratado da Macaco Gordo e pediu a produção de outros filmes, que acrescentaram R$ 687 mil ao custo do contrato. Como justificativa, a Calia apresentou um documento dizendo que não iria realizar a cotação de preços porque se tratava apenas de um complemento.
Essa campanha, batizada de “Tudo em Dia Caixa”, incluiu a contratação do ator Paulo Vieira. Seu cachê foi pago à parte pela Caixa, mas os dados fornecidos pelo banco ao Estadão não incluíram esses valores.
“A produção de 01 FILME WEB REDUÇÃO DE 15′’ referente a CAMPANHA CICLO CRÉDITO 2025 – ADIMPLÊNCIA – FASE 1 dispensa concorrência por se tratar de um serviço adicional ao anterior aprovado, conforme estratégia aprovada pelo cliente/agência”, diz um dos documentos. Questionada, a Calia negou irregularidades e afirmou que “o aditamento foi feito em razão de acréscimo quantitativo de objeto e período inicialmente contratado”.
Pela Embratur, a Macaco Gordo produziu uma campanha sobre afroturismo em 2024, concebida pela agência Calia, e filmada em pontos turísticos de Salvador. A produtora recebeu R$ 1,9 milhão pelo trabalho. A produtora também executou uma segunda campanha da Embratur em 2024 pela mesma agência, com o tema “projeto realidade virtual Sebrae”, por mais R$ 1,9 milhão.
A Calia ainda contratou a Macaco Gordo para uma campanha da Caixa sobre renegociação de dívidas atrasadas, em 2025, pagando R$ 2,3 milhões à produtora.
A agência Propeg executou mais duas campanhas com a Macaco Gordo pela Caixa neste ano: uma para a Lotofácil da Independência, com valor de R$ 1,5 milhão, e outra sobre o programa Minha Casa Minha Vida, de R$ 516 mil.
Em 2024, a Caixa registrou despesas de R$ 38 milhões com as produtoras responsáveis por suas campanhas publicitárias. Desse total, a Macaco Gordo faturou R$ 3,6 milhões. Neste ano, até o mês de setembro, a Caixa fez pagamentos de R$ 21 milhões às produtoras. A Macaco Gordo foi a que mais faturou: R$ 4,3 milhões, cerca de 20% do total.
As agências Binder e Calia afirmaram que a escolha da produtora foi feita em conformidade com a legislação, após cotação de preços no mercado. A Propeg não se manifestou.
Ministro afirma que ‘jamais’ indicou produtora de aliado
Questionado por meio da Secom, o ministro Sidônio Palmeira afirmou que “jamais” indicou a contratação da Macaco Gordo para campanhas publicitárias. O ministro, porém, não respondeu sobre as visitas do seu sócio, Chico Kertész, ao Palácio do Planalto.
“A escolha de qualquer fornecedor terceirizado, pelas agências licitadas, ocorre sem intervenção da Secom. O regramento em vigor obriga que as agências obtenham cotações de pelo menos três empresas capazes de prestar aquele serviço, de modo que a ofertante do menor preço o execute. No processo de aprovação das campanhas, compete à secretaria aprovar a linha conceitual e a alocação dos recursos nos diferentes veículos, à luz dos normativos de mídia técnica consolidados na legislação e nos acórdãos do Tribunal de Contas da União”, afirmou.
Na nota, a Secom ainda afirma que “jamais indicou ou endossou a escolha, pelas agências que prestam serviço à Embratur, à Caixa ou a qualquer outro órgão federal, de qualquer um dos fornecedores que tenham sido escolhidos”.
“Antes de assumir o cargo que hoje ocupa, o ministro Sidônio Palmeira afastou-se das funções de gestão e de administração das empresas em que já atuou, em absoluto respeito à legislação vigente e aos princípios éticos da alta administração federal. Desse modo, é descabido, infundado e mentiroso insinuar que tenha havido qualquer ingerência do ministro em favor de empresas ou indivíduos durante qualquer decisão de que ele tenha participado no âmbito do governo federal”.
Dono da Macaco Gordo diz que produtora foi escolhida por menor preço
O empresário Chico Kertész afirmou que sua produtora tem mais de 15 anos no mercado e foi escolhida por apresentar qualificação técnica e menores preços.
“A Macaco Gordo é uma produtora audiovisual que tem 15 anos de história e um portfólio com projetos realizados para mais de uma centena de clientes, como Natura, Britania, Perdigão, Multishow, Rede Globo, Rede Record, SBT e Ivete Sangalo, entre outros no mundo privado. Já no setor público, já prestamos serviços para as prefeituras de Salvador e do Rio de Janeiro e para os governos estaduais do Maranhão, do Pará e da Bahia. No caso dos projetos realizados para o governo federal, a produtora foi contratada por agências de publicidade que, conforme previsão contratual, devem terceirizar parte dos serviços pelos quais são responsáveis. Essa contratação decorre de concorrência interna, em que apresentamos orçamento e plano de trabalho, avaliados em razão da adequação técnica e da oferta do menor preço”, afirmou, em nota enviada ao Estadão.
O empresário também afirmou que disputou as cotações de preços “a convite das agências publicitárias”. “Em todos esses casos, ingressamos no processo de concorrência a convite das agências publicitárias, sem contato com a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República ou com qualquer outro órgão da administração. Não houve, em nenhuma hipótese, engajamento de nenhum membro da Secom na apresentação, avaliação ou execução desses projetos junto às agências”, afirmou.
Caixa diz que seguiu critério de menor preço
A Caixa afirmou, em nota, que as contratações de serviços de produção publicitária realizadas pelas agências no âmbito dos contratos seguem os critérios estabelecidos pela legislação e pelas normas internas da estatal. Disse ainda que a escolha da Macaco Gordo foi aprovada pelo banco e se deu por critério de menor preço, mediante processo de cotação no qual foram coletados pelo menos três orçamentos no mercado. “Desde janeiro de 2023, a Caixa trabalhou com 41 produtoras de vídeo’.
“A Caixa esclarece que as contratações de serviços de produção publicitária realizadas pelas agências Propeg, Calia e Binder, no âmbito dos contratos vigentes com o banco, seguem os critérios estabelecidos pela legislação e pelas normas internas da instituição. A escolha da produtora Macaco Gordo para a produção de filmes publicitários ocorreu por meio de processo de cotação conduzido pelas agências de publicidade licitadas, conforme previsto contratualmente. A produtora foi selecionada por apresentar a proposta de menor preço entre, no mínimo, três orçamentos coletados no mercado. Desde janeiro de 2023, a Caixa trabalhou com 41 produtoras de vídeo. A Caixa aprovou os orçamentos apresentados pelas agências e autorizou a produção das campanhas por representarem a proposta de menor custo, em conformidade com os ritos legais e contratuais vigentes”, diz a nota.
Embratur defende legalidade de concorrências
A Embratur afirmou, em nota, que realiza chamada pública e sessões públicas para a escolha das produtoras que executam as campanhas, com a entrega de proposta em envelope lacrado. Disse ainda que não houve interferência de Sidônio. “O processo de seleção da produtora é realizado pela agência de publicidade à frente da campanha”, disse.
Agências defendem regularidade da contratação
A agência Binder afirmou que a escolha da Macaco Gordo ocorreu “após processo de cotação de valores de mercado e por ter apresentado o menor valor dentre todas as propostas recebidas”. A agência Calia também disse que a escolha da produtora ocorreu após processos pelo critério de menor preço. A Propeg não se manifestou.
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