Vencido pelo câncer ontem, aos 63 anos, dois anos após a descoberta de um tumor na cabeça, o médico Antônio Carlos Figueira virou, ainda garoto, um arraesista fervoroso, graças a influência do pai Fernando Figueira, fundador do Imip – o Instituto de Medicina que ganhou o seu nome. O velho Figueira tinha uma relação histórica e amizade sincera, como diz a canção de Renato Teixeira, com o ex-governador Miguel Arraes.
Ainda estudante de Medicina, Antônio Figueira viu Arraes voltar ao Governo de Pernambuco na histórica eleição de 1986, na qual o mito entrou pela porta que saiu do Palácio das Princesas, deposto pelo regime de exceção. Com o tempo, de tantas idas e vindas pelo Interior, acompanhando o então governador, se transformou numa espécie de assessor informal.
Leia maisMais tarde, veio a aproximação com Eduardo Campos, neto de Arraes, de quem aceitou convite para entrar na vida pública definitivamente. Deu sua contribuição na área de atuação, ocupando a Secretaria de Saúde em substituição ao ex-secretário João Lyra Neto, que implantou as Upas e Upaes. Eduardo cumpriu a promessa de abrir três novos hospitais, que passaram a ser geridos pelo Imip, numa parceria bem-sucedida.
Ao final da sua segunda gestão, Eduardo, já com o projeto de disputar a Presidência da República, queria um nome bem próximo a ele como candidato a governador. Chegou a cogitar a alternativa Figueira, mas este resistiu, como resistiu mais na frente quando lembrado também para ser candidato a senador e deputado federal.
Figueira gostou do poder, aliás, foi extremamente poderoso nas gestões do PSB, especialmente no primeiro ano de Paulo Câmara, quando assumiu a Secretaria da Casa Civil, mas nunca deixou ser picado pela Mosca Azul. Paulo Câmara governou a quatro mãos, pois Figueira exerceu em seu governo uma grande influência, tanto que era considerado uma espécie de primeiro-ministro. Prefeitos o saudavam assim, quando queriam ser agradáveis ao vice-rei.
O tempo, entretanto, se encarregou de fazer mudanças radicais na vida de Figueira. No segundo mandato de Paulo Câmara, por exemplo, se afastou da gestão para cuidar da implantação e consolidação da Faculdade de Medicina do Imip, seu xodó. Alguns desavisados interpretaram sua saída do governo como consequência de um estremecimento da sua relação com Paulo Câmara. Os mais próximos, entretanto, dizem que não houve absolutamente nenhum ruído.
O fato é que Figueira, considerado um excelente quadro técnico, profundo conhecedor da sua área, não revelava aptidão pela vida partidária. Alguns atribuem isso ao seu temperamento. Era duro no trato, embora cordial e sedutor como Eduardo. Tenho a impressão de que Figueira, com quem convivi de perto, incutiu a filosofia de que somente quem, frente a todas as dificuldades, pode dizer apesar de tudo, tem a vocação para a política.
A vocação dele era a de salvar vidas, como médico, igual ao pai, sua luz em vida, espelho eterno. Os bons filhos são o reflexo do que importaram do pai, porque um homem que faz coisas grandes é admirado. Como bom filho, Figueira tinha a exata noção do verdadeiro legado do pai, que assim ensinou: quando teus pais já não puderem mais te servir, seja um bom filho e retribua em dobro o que eles fizeram por ti.
Além de fazer do Imip uma chama acesa, Figueira foi um visionário que escapou da sedução da política. Teve a grande sacada de ir no embalo, driblando e contornando a vida da melhor forma possível. Morreu com a certeza de que não teríamos rosas lindas e perfumadas, se as roseiras não tivessem espinhos, vencidos por ele em sua brilhante trajetória como médico.
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