Por Ricardo de Oliveira Paes Barreto*
Desde minha infância convivi com o setor sucroalcooleiro do nosso Estado de Pernambuco, em especial na zona da mata sul, onde fui criado, e pude ver, com o passar dos anos, a sua importância social, ambiental e com o nosso crescimento estrutural, o que pude constatar quando de nossa gestão perante o Tribunal de Justiça de Pernambuco, ao visitar quase todas as unidades do Estado, em missão de aproximar o Judiciário de todos os setores trabalhadores, produtivos e de segurança do Estado.
No particular do setor, a importância social está nos milhares de empregos que são gerados a cada ano, passando do cortador de cana de açúcar, pelos funcionários mais variados, até por graduados profissionais que trabalham nas unidades usineiras espalhadas nas matas norte e sul do Estado, impactando a economia de cerca de 60 municípios.
Leia maisNas unidades há escolas primárias bem equipadas, programas sociais e alimentação para todos. Tivemos oportunidade de ver linhas familiares inteiras ali trabalhando, para manter uma estrutura bastante complexa e custosa na produção das commodities próprias do sistema: melaço, álcool, açúcar de várias espécies, o conhecido ouro doce”, que não só abastecem o mercado interno, mas fortemente também o mercado internacional.
A importância ambiental é enorme. No passado, víamos pesadas queimadas poluentes e perigosas nas plantações para facilitar a colheita, com a queima da palha cortante, hoje quase inexistente com a utilização de novas tecnologias que, embora demandem forte investimento na aquisição e manutenção, foram essenciais à redução dessa indesejada técnica.
A floresta das redondezas das unidades foram quase que totalmente devastadas para uso da madeira nas enormes caldeiras necessárias ao funcionamento das usinas, poderíamos até dizer, é o “coração” que as faz pulsar, hoje totalmente substituídas pelo bagaço das moendas e uso de gás natural, gerando não só a energia ali produzida é utilizada, mas igualmente gerando energia para o sistema estadual de fornecimento.
Em paralelo não só foram introduzidas inúmeras ações de recuperação da mata degradada, o que pude constatar em todas elas, mas implementado severo controle na manutenção das matas remanescentes e recuperadas, o que demanda, também, forte e custoso investimento tecnológico e de pessoal especializado.
O vinhoto, subproduto da produção e que era jogado nos rios afluentes, causando danos poluentes sérios, hoje é cem por cento utilizado na irrigação das plantações, com resultados positivos de sustentabilidade e economicidade.
O etanol produzido é um combustível verde, muito menos poluente que os combustíveis de origem fóssil.
Na esfera de crescimento estrutural do Estado, há uma geração direta e indireta de tributos incalculáveis. Só de impostos estatais são mais de 500 milhões por ano, sem falar dos outros milhões decorrentes das prestações dos serviços típicos da atividade.
Por outro lado, e independentemente de todo esse esforço empresarial, milhares de valiosos hectares de terras são necessários para que os parques industriais sucroalcooleiros possam nelas se assentar e produzir todo o leque de produtos que serão oferecidos ao mercado consumidor.
Mas todo esse esforço, de essencial importância para a manutenção da força de trabalho e da sustentabilidade em todos os sentidos, tem um decorrente e óbvio custo de funcionamento, como um orçamento familiar em que quando há sobra, fazemos investimentos e melhoramos a qualidade de vida de todos, mas quando, por razões diversas, as despesas aumentam muito e não há retorno financeiro suficiente, toda a estrutura familiar sucumbe.
É um momento indesejado, difícil e delicado, pois observamos os custos mínimos de manutenção não serem atingidos com a arrecadação financeira decorrente. É preciso parar, pensar e buscar soluções que levem, em primeiro plano, ao corte de despesas, o que interfere imediatamente na qualidade de vida, e, ato contínuo, na busca de soluções que possam reequilibrar as finanças para restauração da regularidade e da necessária prosperidade que todos esperamos e queremos.
Pois bem, hoje temos cerca de 13 usinas de cana de açúcar funcionando em Pernambuco, quando no passado chegamos a ter mais de 120, e o que significa isso? Significa que, como as centenas de engenhos que sucumbiram por dificuldades financeiras, igual fenômeno ocorre com nossas usinas, que chegaram a processar nas safras passadas mais de 14 milhões de toneladas de cana.
Trabalhando com commodities universais, os seus preços flutuam para cima e para baixo no mercado, o qual convive atualmente com tarifaços, guerras, moedas fortes e fracas, dentre outros fenômenos. Em decorrência de tudo isso, quando os preços flutuam para cima, poucas vezes, o sistema funciona perfeitamente, trazendo todos os benefícios já mencionados ao nosso Estado, mas quando os preços flutuam para baixo, o que comumente ocorre, diante dos altos custos de sua manutenção, a crise se irradia e muitas vezes e o valor pago pelo mercado não cobre nem o pesado custo de produção.
Como ocorre na Europa e nos Estados Unidos, sem esquecer outras regiões pelo mundo afora, é preciso pensar e efetivar ação de proteção ao funcionamento adequado desse sistema como um todo por parte dos governos estadual e federal, maiores arrecadados de tributos decorrentes da produção, não mero e indesejado protecionismo, que vicia e gera acomodações, mas uma proteção capaz de garantir sua sustentabilidade mínima.
Redução e racionalização de custos e boas práticas agrícolas, já vem sendo praticadas e funcionalizadas pelas usinas, mas nada disso é suficiente para proteger o setor em momentos de grave crise como se vê atualmente.
É preciso discutir e implementar políticas públicas e apoio governamental com instituição de incentivos fiscais e linhas de crédito, como forma de manter a saúde financeira desse importante setor, como também a implementação de políticas que venham a incentivar o uso do etanol, nosso combustível limpo e renovável, descarbonizando o setor de transportes e garantindo um preço minimamente justo.
Por certo, há também outras políticas estruturais que, com muito diálogo e proposição, podem não só regular o sistema hoje, mas também garantir que nosso setor sucroalcooleiro possa se recuperar e consolidar um novo e sustentável padrão de estabilidade para o futuro.
*Desembargador e presidente do TJPE
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