O leilão de concessão dos serviços de água e esgotamento sanitário da Companhia Pernambucana de Saneamento (Compesa), realizado nesta quinta-feira (18) na B3, em São Paulo, foi celebrado pelo Governo de Pernambuco como um marco rumo à universalização do saneamento. Os dois blocos regionais ofertados foram arrematados, com a promessa de R$ 18,4 bilhões em investimentos e impacto direto em mais de 7,5 milhões de pessoas, distribuídas em 175 municípios do estado.
O Bloco 1 do Sertão ficou com a Pátria, que ofereceu outorga de R$ 720 milhões, com ágio de 727%. Já o Bloco 2, que engloba a Região Metropolitana do Recife, o Pajeú e Fernando de Noronha, foi arrematado pelo consórcio formado por BRK Ambiental e Acciona, com outorga de R$ 3,5 bilhões, 5% de desconto tarifário e 60% de ágio. As informações são do blog Plural.
Enquanto o discurso oficial ressalta o volume de investimentos, a geração de empregos e o avanço rumo às metas de 2033, a escolha de uma das vencedoras reacende um debate sensível: o histórico de reclamações, sanções e questionamentos enfrentados pela BRK Ambiental em diferentes regiões do Brasil.
Leia maisQuestionamentos institucionais em Maceió
Na capital alagoana, onde a BRK atua na concessão dos serviços de saneamento, o desgaste com o poder público municipal é explícito. Com a assinatura dos 27 vereadores da Câmara Municipal de Maceió, foi protocolado o Requerimento nº 001/2025, de autoria do vereador Galba Netto (MDB), solicitando à Prefeitura a reavaliação do contrato firmado com a empresa. O documento chega a sugerir a criação de um Serviço Autônomo de Água e Esgoto (SAAE), o que, na prática, colocaria em xeque o modelo de concessão atual.
Durante sessão ordinária, Galba Netto afirmou que a Câmara convive com um volume constante de reclamações da população sobre a qualidade dos serviços, sobretudo no saneamento básico e no tratamento de esgoto. As críticas foram endossadas pelo presidente da Casa, Chico Filho (MDB), que também subscreveu o requerimento e anunciou reunião com o Ministério Público Estadual para discutir a atuação da concessionária.
Outro parlamentar, Rui Palmeira (PSD), apontou falta de transparência e relatou que foi necessária uma Ação Civil Pública da Defensoria Pública para garantir acesso ao mapa de saneamento — informação que, segundo ele, deveria ser pública desde o início do contrato. Levantamentos feitos por vereadores ainda indicaram falhas estruturais no projeto, como a ausência de estações elevatórias em determinados bairros, comprometendo o funcionamento do sistema.
Reclamações recorrentes em Aparecida de Goiânia
Em Aparecida de Goiânia (GO), onde a BRK atua como subdelegatária da Saneago desde 2013, a empresa também foi chamada a prestar esclarecimentos à Câmara Municipal diante de reclamações recorrentes da população. Durante sessão ordinária, vereadores exibiram vídeos e relataram problemas como extravasamento de esgoto, demora no atendimento, buracos abertos sem recomposição adequada do asfalto e bairros ainda sem cobertura da rede.
Embora a direção da BRK tenha apresentado números robustos de investimentos — R$ 1,2 bilhão ao longo da concessão e a alegação de que a universalização teria sido alcançada antes do prazo legal —, parlamentares questionaram a efetividade desses resultados no cotidiano da população. Houve pedidos formais de revisão contratual, maior fiscalização da agência reguladora, aplicação de multas e até a possibilidade de rescisão do contrato caso os problemas persistam.
Ao final, foi proposta a criação de uma comissão especial para acompanhar de perto a execução do contrato e avaliar as demandas dos moradores, sinalizando que a insatisfação extrapola episódios pontuais.
Multa por interrupção de água em Palmas
Em Palmas (TO), as críticas ultrapassaram o campo político e resultaram em penalidade administrativa. A Agência de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos (ARP) aplicou multa de R$ 195.888,00 à BRK Ambiental por descontinuidade injustificada no abastecimento de água em diversos bairros da região norte da cidade.
A infração, classificada como “gravíssima”, foi motivada por relatos de moradores que ficaram mais de 20 dias sem fornecimento regular de água potável. A situação levou a manifestações públicas, com bloqueio de vias. Para a agência reguladora, o cenário foi considerado de “dimensão crítica” e incompatível com a natureza essencial do serviço de abastecimento.
O contraste com o discurso do leilão
Durante o leilão da Compesa, representantes do setor privado e autoridades destacaram o fortalecimento do marco legal do saneamento e a entrada de novos players como sinais de maturidade do mercado. A diretora-presidente da Associação Brasileira das Empresas de Saneamento (ABCON), Christianne Dias, afirmou que o certame representa um avanço histórico e uma esperança de futuro mais digno para milhares de pessoas.
A governadora Raquel Lyra (PSD), presente à B3, celebrou o resultado e afirmou que o saneamento não deve ser visto apenas como negócio, mas como política pública essencial para garantir dignidade e saúde à população.
No entanto, o histórico recente de uma das empresas vencedoras do leilão revela que o desafio vai além de cifras bilionárias e metas contratuais. Reclamações recorrentes, questionamentos sobre transparência, falhas operacionais e penalidades aplicadas por órgãos reguladores em outros estados acendem um alerta importante para Pernambuco.
À medida que a concessão avança, cresce também a expectativa e a necessidade de fiscalização rigorosa, transparência e participação social, para que os erros apontados em outras regiões não se repitam. Afinal, quando se trata de água e saneamento, o impacto de uma má gestão não aparece apenas nos balanços financeiros, mas no dia a dia, na saúde e na dignidade da população.
Leia menos




















