Por Zé Américo Silva*
Enquanto a direita lança bandeiras e define agendas, o governo federal segue reagindo a fatos, sem construir uma narrativa propositiva capaz de resgatar popularidade e consolidar um projeto de país.
O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vive um impasse de comunicação que é, na verdade, um impasse de estratégia política. Passados quase dois anos de mandato, Lula enfrenta uma popularidade que oscila entre altos e baixos e uma oposição que, mesmo fragmentada, encontrou uma pauta de unificação: segurança pública. O recente “Consórcio da Paz”, lançado por sete governadores sob liderança de Cláudio Castro, do Rio de Janeiro, mostra que a direita compreendeu o jogo da comunicação propositiva — enquanto o governo segue preso ao marketing reativo, reagindo a crises, sem definir uma narrativa estruturante.
O marketing reativo, como se sabe, é aquele que age a posteriori. Ele se move em resposta a acontecimentos, buscando mitigar danos ou extrair algum ganho político do imprevisto. Foi assim que o governo reagiu à ofensiva comercial e diplomática dos Estados Unidos, após a aplicação de tarifas sobre exportações brasileiras e da Lei Magnitsky contra autoridades nacionais. A resposta veio sob o manto da “defesa da soberania nacional”, bandeira que, de fato, rendeu algum alívio momentâneo na percepção pública. Mas, ainda assim, foi uma reação. A agenda partiu de fora.
Leia maisO marketing propositivo é diferente. É aquele que define a pauta, antecipa movimentos e propõe causas antes que a oposição o faça. É o marketing de quem conduz a narrativa — e não o de quem corre atrás dela. E é justamente essa postura que falta hoje à comunicação do governo federal.
Mesmo com o lançamento de programas sociais de apelo direto à base popular, como o Vale Gás Social e o Pé-de-Meia Educação, além da recente proposta de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil — ainda em tramitação no Senado —, o governo não conseguiu traduzir essas medidas em fortalecimento político. As marcas existem, mas carecem de identidade emocional e simbólica. São políticas corretas, mas comunicadas de forma burocrática, sem alma, sem narrativa.
Lula fala para os seus — para o eleitor de baixa renda, concentrado no Norte e Nordeste — mas não fala para o conjunto do país. Essa limitação segmenta sua comunicação e reduz sua capacidade de construir maioria política ampla. Enquanto isso, a direita encontrou um campo onde pode unir pobres e ricos, conservadores e moderados: a insegurança cotidiana. A violência e o tráfico estão em 95% dos municípios brasileiros; não há tema mais transversal, mais palpável e mais potente eleitoralmente.
O problema, portanto, não é apenas de comunicação, mas de posicionamento estratégico. O marketing do governo federal precisa deixar de ser um instrumento de defesa e voltar a ser uma ferramenta de proposição. Precisa criar uma marca-bandeira forte na área de segurança pública, que conecte a ideia de proteção à vida, paz social e fortalecimento do Estado, sem ceder ao discurso punitivista da extrema-direita. Um projeto de segurança cidadã, visível e nacional, que possa rivalizar com o “Consórcio da Paz” da oposição.
Além disso, é necessário ampliar o campo da narrativa. As marcas sociais devem ser incorporadas a um conceito-guarda-chuva — algo como “Governo que cuida da vida e protege o futuro”. A segurança social e a segurança pública precisam dialogar entre si, compondo uma visão coerente de país. O marketing propositivo faz isso: une políticas dispersas sob uma mensagem-mãe, de fácil compreensão e alto impacto emocional.
Enquanto o governo continuar se comunicando por reflexo, responderá sempre com atraso. O país precisa de um governo que comunique antes, não depois. De um governo que antecipe temas, que se antecipe ao adversário, que proponha antes de explicar. O marketing propositivo é, no fundo, o marketing de quem governa com propósito — e não o de quem apenas administra crises.
O desafio de Lula, portanto, é sair da defensiva e recuperar o protagonismo narrativo. A direita entendeu a força de uma bandeira única; o governo precisa entender o poder de uma narrativa coerente. Entre reagir e propor há uma diferença que define vitórias políticas — e pode decidir, inclusive, o futuro da sua quarta candidatura.
*Jornalista e publicitário
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