Anistia ganha musculatura
Até então considerada letra morta, a anistia aos envolvidos nos atos golpistas de 8 de janeiro está por um fio para entrar na pauta do Congresso e ser aprovada. Até o presidente Lula (PT) já admitiu que as forças de centro direita não podem ser subestimadas, sob o risco de aprovarem a proposta que perdoaria todos os baderneiros e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O cenário pró anistia mudou de configuração com as articulações promovidas nos últimos dias pelo governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, atualmente filiado ao Republicanos, mas assediado para o PL, com anuência dos seus líderes para entrar na disputa presidencial em 2026.
Leia maisAté então discreto quanto à corrida presidencial, Tarcísio entrou numa jogada do tudo ou nada para conquistar o apoio do ex-presidente Bolsonaro e dos seus filhos, que andavam arredios com ele. Na liderança do movimento para votar a anistia, Tarcísio restabelece a confiança do clã Bolsonaro.
Aprovada, Bolsonaro restaura seus direitos políticos e pode ser candidato em 2026. Mas Tarcísio aposta que ele não entraria na disputa, por vários motivos, e assumiria com ele o compromisso de apoio velado no enfrentamento à candidatura de Lula, que está disposto a tentar um novo mandato nas eleições do ano que vem.
Apesar de toda movimentação, o avanço da medida é considerado inviável por especialistas pelas resistências no próprio Parlamento e pela chance quase certa de o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubá-la em caso de aprovação.
Tarcísio participou de encontros junto a lideranças partidárias, que buscam um acordo para que o tema seja pautado logo após o julgamento da trama golpista, previsto para terminar na próxima sexta-feira. As articulações no Legislativo foram antecedidas por uma promessa feita pelo governador na semana anterior, quando, em entrevista ao Diário do ABC Paulista, afirmou que, caso seja eleito presidente do Brasil, seu primeiro ato será a concessão de um indulto a Bolsonaro.
Os acenos fazem parte de uma estratégia de mão dupla do governador para se viabilizar enquanto candidato ao Palácio do Planalto. Se ele se apresentar como o grande articulador da anistia, receberá parte do espólio eleitoral do ex-presidente, ou quase a totalidade, por ter sido o salvador de Bolsonaro.
O ELO COM O CENTRÃO – A empreitada do governador paulista tem conquistado o apoio de partidos como o União Brasil e o Progressistas (PP). As duas legendas, que desembarcaram semana passada do governo Lula, também defendem a anistia, articulada internamente pelo senador e presidente do PP, Ciro Nogueira (PI). Ex-ministro da Casa Civil de Bolsonaro, o parlamentar se apresenta como um dos fiadores da candidatura de Tarcísio, interessado em ocupar a vice numa eventual chapa. Ciro funciona como o elo entre o bolsonarismo e Centrão.

Motta, a pedra no meio do caminho – Apesar disso, a oposição enfrenta resistência do presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB). Na última terça-feira, após uma reunião com lideranças, ele admitiu que o número de interlocutores que pedem a anistia havia aumentado. Dois dias depois, evitou falar em prazos e ajustou o discurso ao dizer que ouviria grupos interessados e contrários à pauta. Além disso, é colocada na mesa a possibilidade de elaboração de um texto alternativo, que pode deixar Bolsonaro de fora do perdão.
Exclusão de Bolsonaro – A proposta de anistia, em fase de elaboração pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (UniãoAP), poderá diferenciar as penas de acordo com o grau de participação no 8/1. A solução, no entanto, não será aceita pelo núcleo mais próximo do ex-presidente. “A anistia será ampla e irrestrita ou não contará com o apoio da direita e não terá efeito de diminuir as sanções internacionais”, escreveu em suas redes o deputado Eduardo Bolsonaro, que articula nos EUA a aplicação de punições a autoridades brasileiras que atuam no julgamento de seu pai.
Muita promessa, pouca ação – Ao observar as movimentações dos últimos dias da governadora Raquel Lyra (PSD) pelo interior, um prefeito sertanejo confessou à coluna que seu propósito é se manter aliado com a gestora ao seu projeto de reeleição, mas advertiu: “Tudo que ela me prometeu, entretanto, continua no papel. Estou só esperando, no meu canto. Meu prazo é abril. Se até lá ela não cumprir, ficarei livre para tomar outro rumo. Sou um político de palavra. Na eleição passada apoiei Miguel. Quando Paulo Câmara tentou mudar meu voto para Danilo, fui muito franco: não posso, já me comprometi com Miguel”, contou. Em tempo: o gabinete deste prefeito fica na beira no Rio São Francisco.

Nem passagem sabe emitir – Do deputado Waldemar Borges ao comentar as queixas da governadora em direção a oposição: “Era o que faltava a governadora dizer que o governo não funciona porque não deixam ela trabalhar. Um governo que não sabe emitir sequer uma passagem para alunos disputarem uma olimpíada; que perde prazo de carência de empréstimo; que durante dois anos peleja pra fazer rodar velhos programas como o Ganhe o Mundo; que precisa refazer inúmeras vezes uma licitação para corrigir erros formais; que passa quase três anos para elaborar um projeto dando finalidade ao Americano Batista”.
CURTAS
Equipe fraca – Para Waldemar Borges, os atropelos da gestão Raquel são resultados do seu próprio atropelo e da sua equipe, no seu entender, despreparada e incompetente. “Não há um só secretário que se destaque, um horror”, afirmou.
Agenda do livro – Dou uma paradinha esta semana na agenda de lançamentos do meu livro “Os Leões do Norte” e retomo na semana que vem por Sertânia, Tabira, Cabo e Paulista.
Podcast – O entrevistado do meu podcast Direto de Brasília de amanhã, uma parceria com a Folha de Pernambuco, será o jurista Walber Agra, professor da Faculdade de Direito do Recife, autor do projeto que deixou Bolsonaro inelegível. Na pauta, o julgamento do ex-presidente pela Primeira Turma do STF.
Perguntar não ofende: Como será o voto do ministro Luiz Fux no julgamento de Bolsonaro?
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