Por Marcelo Tognozzi
Colunista do Poder360
A chegada das delegações europeias à COP30, em Belém, acabou sendo uma viagem no tempo. A Amazônia brasileira do século 21 é muito parecida com o Brasil do século 19 ou a Europa de 300, 400 anos atrás, quando as cidades cheiravam a esterco de cavalo, urina e fezes. A maioria dos 30 milhões de brasileiros habitantes da Amazônia está na mesma situação dos seus antepassados de 80 anos atrás, quando Josué de Castro escreveu seu clássico “Geografia da Fome”. Nada mudou.
Por isso, não é de se estranhar que o chanceler alemão Friedrich Merz tenha dado graças a Deus ao voltar para casa e sair da Belém caótica e até então desconhecida da maioria dos estrangeiros que lá foram.
Leia maisChanceler alemão diz ter ficado feliz ao ir embora de Belém
— Poder360 (@Poder360) November 17, 2025
O chanceler alemão, Friedrich Merz, afirmou na 5ª feira (13.nov.2025) que ele e sua equipe ficaram “contentes” em retornar à Alemanha depois de participação na COP30.
“Senhoras e senhores, nós vivemos em um dos países… pic.twitter.com/h9yuQG4WzK
A COP30 mostrou que não se pode falar de Amazônia sem incluir as pessoas, habitantes de uma região onde 70% das casas não têm acesso ao saneamento básico. O Pará é o pior de todos, com 80% da população sem esgoto.
As favelas são erguidas nos igarapés, com as pessoas morando dentro d’água e produzindo uma poluição incontrolável. A cena se repete no Amazonas e em outros Estados, como Amapá, Roraima, Rondônia e Acre. E os mosquitos se revezam em turnos durante o dia e a noite e são eles maruim, aedes e carapanã.
Esses brasileiros invisíveis continuam vivendo no século 19 e deveriam ter sido incluídos, mas seguem sendo esquecidos, enquanto os “bambambãs” do clima preferem focar em economia verde, créditos de carbono e outros assuntos completamente alheios à realidade do dia a dia.
Não há como negar que a COP30 serviu para dar um choque de realidade no glamour da floresta pulmão do mundo. Agora talvez comecem a entender que não há salvação para uma floresta onde as pessoas seguem vivendo num tempo de 200 anos atrás.
Para onde foram os bilhões dos fundos europeus para a Amazônia? É uma irresponsabilidade monumental dar dinheiro para a suposta preservação da floresta, enquanto milhões de brasileiros que lá vivem não têm dinheiro para viver dignamente, alimentar seus filhos, ter esgoto e água tratada. Não tenho dúvidas de que a COP30 provocou mais dúvidas que certezas com todos os problemas e mazelas exibidos ao mundo.
O Brasil se vendeu durante anos a fio como o país da preservação, do combate ao desmatamento, do compromisso com a sustentabilidade e por aí vai. Os delegados estrangeiros da COP foram formalmente apresentados aos indígenas do Psol e aos ambientalistas que nunca protestaram contra a falta de esgoto e água tratada, como se viver assim fosse a coisa mais normal do mundo. Como diz aquela letra de Caetano: “De perto ninguém é normal”. E foi assim quando os delegados da COP foram apresentados ao Brasil amazônico, onde o normal é o avesso de qualquer normalidade.
Aqui temos os guardiões do atraso em uma região onde virou crime produzir comida, mas onde o crime, este organizado, produz desgraças em série. Narcos mandam e desmandam em parte desta floresta que a Europa sonha ver intocada. Os garimpos ilegais empanturram de diamantes e ouro mercados onde a riqueza fincou raízes faz muitos séculos.
Eu quero mais COPs por aqui, mais delegações europeias para que eles possam sentir o cheiro das comunidades de Belém ou de Manaus. Para que eles cheguem bem pertinho da margem dos rios e tenham nojo de molhar os pés ou pensem duas vezes antes de comer peixes que podem estar contaminados com mercúrio ou tenham sido pescados com bombas, como fazem os bandidos no Vale do Jaguari. E se forem assaltados, devem ser solidários e lembrar que os ladrões de turistas são vítimas desta ausência completa do Estado.
Vamos precisar de muitos eventos internacionais, muita imprensa estrangeira na nossa Amazônia. Não a imprensa dos jornalistas financiados por ONGs e outras entidades cujo ganha-pão é falar mal dos brasileiros que tentam levar um pouco de prosperidade para os abandonados.
A COP30 me remeteu a este trecho do poema de Tiago de Mello, “É natural, mas fede”:
“Tudo é tão natural, é como o céu estrelado da minha terra
cobrindo o sonho opaco de um menino
– mordido de carapanã, caralho! –
que sequer sabe onde a fome começa”.
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