Do Estadão Conteúdo
O volume de processos conduzidos pela advogada Viviane Barci de Moraes nas cortes superiores saltou de 27 para 152 ações após a posse de seu marido, o ministro Alexandre de Moraes, no Supremo Tribunal Federal (STF). O crescimento expressivo concentra-se nos últimos oito anos, período que supera em cinco vezes o acumulado nos 16 anos anteriores à chegada do magistrado à cúpula do Judiciário, ocorrida em março de 2017.
Ao todo, 85% das ações em que a advogada atuou nessas instâncias foram autuadas depois que Moraes assumiu a cadeira na Corte. Levantamento realizado pelo Estadão aponta que esse movimento representa um aumento percentual de 463% na atuação do escritório da família Barci de Moraes em Brasília.
Leia maisA banca da família Barci de Moraes, da qual Viviane é sócia-administradora, foi aberta em 2004, mas a primeira atuação da advogada em Cortes superiores data de 2001, em um processo no STJ. Os dados mostram que, no STF, 22 dos 31 processos com atuação da advogada tiveram início após a posse de Moraes. No Superior Tribunal de Justiça (STJ), no mesmo período, esse total chega a 130 de 148 casos.
Procurados, Viviane Barci e o gabinete do ministro Alexandre de Moraes não se manifestaram.
Enquanto o Supremo julga controvérsias constitucionais, o STJ atua como a principal instância de revisão das decisões da Justiça comum, responsável por uniformizar a interpretação das leis federais, o que resulta em uma concentração maior de recursos cíveis e empresariais nesta Corte.
Em alguns processos, a atuação de Viviane conta com a colaboração dos advogados Giuliana de Moraes e Alexandre Barci de Moraes, filhos do casal.
Entre os clientes da advogada estão empresas de grande porte e grupos empresariais com atuação em diferentes setores da economia. Viviane representa, por exemplo, a Santos Brasil, uma das principais operadoras do Porto de Santos, e o empresário brasileiro Jair Antônio de Lima, fundador de um dos maiores frigoríficos do Paraguai, o Frigorífico Concepción. Procurada, a Santos Brasil informou que não vai se manifestar.
Esse perfil de clientes inclui ainda grandes companhias do setor de serviços. Um dos representados pela advogada é a Qualicorp, que atua nas áreas de saúde e seguros.
Desde novembro, Viviane disputa em nome da Qualicorp com a SBA Corretora de Seguros e Benefícios um recurso em tramitação no STJ. A advogada venceu a ação no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), mas a parte contrária recorreu à instância superior.
A SBA alega que a Qualicorp rescindiu um contrato de comercialização de seguros e benefícios para associados, vinculados e integrantes da Associação Brasileira de Bacharéis de Direito (ABBDIR) sem pagar os valores devidos a título de comissão até o fim definitivo do vínculo entre as duas partes.
A gigante representada por Viviane afirma, por sua vez, que o contrato não era vitalício e poderia ser rescindido a qualquer momento, sem a necessidade de pagar o valor previsto para o restante do contrato. Ao vencer no TJSP, o escritório de Viviane fez jus a 15% de honorários sobre o valor da causa.
Os honorários advocatícios recebidos a partir de vitórias em processos judiciais ampliam, com uma porcentagem sobre o valor da causa, os ganhos geralmente elevados dos escritórios que atuam em tribunais superiores. Procurada, a Qualicorp não se manifestou.

Viviane também atua para empresas dos setores de construção e mercado imobiliário, entre elas a Savoy Imobiliária Construtora e a Centerleste Empreendimentos Comerciais.
Em uma das ações no STJ, a advogada defende as empresas em uma disputa que envolve a execução de uma dívida de R$ 15 milhões. A Corte rejeitou os recursos apresentados e manteve a possibilidade de cobrança imediata do valor, reconhecido pelas próprias rés na fase de liquidação da sentença. Procuradas, as duas empresas não se manifestaram.
O escritório Barci de Moraes Sociedade de Advogados, liderado por Viviane, também representa pessoas físicas perante as mais altas instâncias do País. Um desses nomes é o do ex-servidor da Controladoria-Geral da União (CGU) Paulo Rodrigues Vieira, que foi alvo de investigação da Polícia Federal (PF) em 2012 sob suspeita de liderar uma organização criminosa infiltrada em órgãos públicos que vendia pareceres de agências reguladoras a empresas privadas.
Viviane representou Vieira em duas ações encerradas no STF — uma sob relatoria do ministro Dias Toffoli e outra relatada pela ministra aposentada Rosa Weber — e um caso também encerrado no STJ.
Nas ações no STJ e sob relatoria de Weber, a advogada apresentou recursos às Cortes superiores após decisões desfavoráveis ao seu cliente nas instâncias inferiores. Ele não foi encontrado para se manifestar.
Já na ação relatada por Toffoli, o cliente de Viviane constava apenas como intimado em um recurso apresentado por Rosemary Novoa Noronha, ex-chefe do escritório da Presidência da República em São Paulo e amiga do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) que chegou a ser denunciada por improbidade administrativa pelo Ministério Público (MP) por ligação com a quadrilha liderada por Vieira.
No STJ, a esposa de Moraes pleiteava a anulação de interceptações telefônicas de Vieira. O caso retornou ao tribunal de origem após análise da Corte. Rosemary Noronha não se manifestou.
Em outro caso de repercussão, a advogada atua na defesa do espólio do ex-governador de São Paulo Orestes Quércia em uma ação de improbidade administrativa que discute um contrato firmado sem licitação em 1989, no valor de R$ 34 milhões, para a aquisição de sistemas de ensino.
A Justiça paulista declarou a nulidade do contrato e condenou os réus ao ressarcimento do dano ao erário, em montante ainda a ser apurado em liquidação. No STJ, os recursos foram considerados prejudicados por perda de objeto, sem análise do mérito, após sentença condenatória nas instâncias inferiores.
Atuação de familiares X legislação
A atuação de familiares de ministros como advogados em processos no STF não é vedada pela legislação. As regras, porém, impedem que um magistrado julgue ações em que parentes atuem, exigindo a declaração de suspeição e o afastamento do caso.
Em 2023, o STF flexibilizou essa regra ao decidir que juízes podem julgar processos em que as partes sejam clientes de escritórios nos quais atuam cônjuges ou parentes. A única exigência é que haja outra banca de advocacia representando a pessoa na ação.
A atuação do escritório de advocacia do qual Viviane Barci de Moraes e os dois filhos do ministro são sócios passou a ser alvo de questionamentos após a revelação de um contrato de R$ 129 milhões firmado com o Banco Master, instituição que acabou liquidada em meio a suspeitas de fraudes financeiras.
O caso envolvendo o Banco Master tramita no STF sob a relatoria do ministro Dias Toffoli. Em novembro, Toffoli foi alvo de questionamentos após viajar a Lima, no Peru, em um jato particular ao lado de um advogado ligado ao caso, durante a final da Taça Libertadores. Após a viagem, o ministro decretou sigilo dos autos e barrou o acesso da CPI do INSS a documentos obtidos com a quebra de sigilos bancário e fiscal.
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