Marco Maciel não dormia, acordava auxiliares pela madrugada e comia pouco para não perder tempo

Marco Maciel

Capítulo 2 

Marco Maciel governou Pernambuco de 1978 a 1982 sem passar pelo crivo das urnas. Foi escolhido governador biônico pelo ex-presidente Ernesto Geisel. Quando Marco era presidente da Câmara dos Deputados, Geisel baixou um ato “fechando” o Congresso. Foi o Ato Complementar 102, de 1 de abril de 1977. O intuito era aprovar a reforma judiciária que havia sido rejeitada pelo parlamento.

O Congresso foi reaberto em 14 de abril, após duas emendas constitucionais e seis decretos-leis regulamentando a reforma do judiciário e a reforma política, esta última criando os chamados senadores e governadores biônicos.  A história registra que Marco Maciel, apesar de contrário à supressão das prerrogativas do Congresso Nacional, acatou a decisão presidencial.

Mas não tomou parte nas cerimônias que marcaram a vigência das medidas baixadas pelo Poder Executivo. Não polemizou a respeito do assunto e, em sinal de reconhecimento por sua postura, foi indicado governador biônico de Pernambuco pelo próprio Geisel, em 1978. Ao longo de sua gestão, Marco Maciel montou uma equipe de técnicos e políticos que cerraram fileiras nas eleições de 1982 contra o MDB, principal partido de oposição.

Líder do PDS, Maciel escolheu Roberto Magalhães como candidato a governador em 82 e derrotou o senador Marcos Freire, então candidato a governador considerado imbatível. Eleito senador na chapa com Magalhães, Maciel teve seu nome lembrado como uma das alternativas civis à sucessão do presidente João Figueiredo, em face, sobretudo, de sua grande capacidade de articulação.

Maciel chegou ainda a disputar a eleição indireta para presidente. Eu, no início da minha carreira, escolhido pelo jornalista Ângelo Castelo Branco, fui o repórter que acompanhou a peregrinação de Maciel em busca de votos nos Estados. Cruzamos os céus do Brasil do Oiapoque ao Chuí. Não havia eleição direta para presidente, o candidato disputava os votos dos políticos – deputados federais, estaduais e senadores – que integravam o Colégio Eleitoral.

O grande temor era a eleição de Paulo Maluf, que tinha fama de comprar os votos dos delegados que iam ao colégio eleitoral. Foi quando Maciel renunciou à condição de candidato no colégio eleitoral e liderou um movimento, ao lado de Aureliano Chaves e José Sarney, em apoio à candidatura de Tancredo Neves, que derrotou Maluf, mas morreu de diverticulite antes de tomar posse, assumindo o vice José Sarney.

LIGADO NA TOMADA

Governador de Pernambuco, Marco Maciel adotou uma rotina massacrante de trabalho para viabilizar seu governo cujo slogan era “Desenvolvimento com Participação”. Suas varadas pela madrugada no Palácio do Campo das Princesas caíram no folclore político. Quando alguém pedia uma audiência e recebia a confirmação à meia noite, não acreditava. Desconfiava de trote.

Então secretário de Agricultura, o engenheiro Aloísio Sotero chegou tarde da noite em casa, depois de uma longa reunião no Palácio. Chegou tão cansado que teria esquecido até de tirar a gravata. Às duas da madrugada, toca o telefone em sua casa. A mulher atende. Do outro lado da linha, o ajudante de ordens de Maciel, que queria tirar uma dúvida com o auxiliar.

A esposa responde que ele estava em sono profundo, havia chegado muito tarde e não iria acordá-lo. No dia seguinte, ao encontrar-se com Sotero, Maciel o elogiou bastante pela eficiência, mas disse que tinha um grave defeito: era dorminhoco. Um empresário, que pediu para não ser citado, disse que, certa vez, saiu à meia noite de uma audiência com Maciel, e às cinco da matina foi acordado por ele, anunciando que já teria o desdobramento da conversa.

“Eu tomei um susto quando fui atender e disseram que era o governador que queria falar comigo”, lembrou, dando uma boa gargalhada. Além de não dormir, Marco Maciel também quase não comia, daí a razão de ser tão magro. Também não gostava de perder tempo em almoços. Certa vez, cumprindo uma extensa agenda em Brasília ao lado de Francisco Bandeira de Mello, o Bandeirinha, assessor de extrema confiança, foi obrigado por Bandeirinha, esfomeado, a parar numa lanchonete.

Era a paradinha para o almoço. Marco Maciel se dirigiu ao dono da lanchonete e tascou:

– Por favor, um sanduíche misto e uma Coca-Cola.

Bandeira retrucou:

– Marco, somos dois.

O governador então saiu com a seguinte pérola:

– Sim, Bandeira. Pedi um para dividirmos. Não podemos perder tempo”.

Maciel não dormia nem deixava ninguém dormir. Na campanha para o Senado, ao lado de Joaquim Francisco, em 1990, depois de cumprir uma extensa agenda no Agreste, foi pernoitar em Pesqueira, por coincidência no mesmo hotel em que os jornalistas que o acompanhavam também estavam hospedados.

Um arguto e curioso repórter, ao passar no corredor do hotel em direção ao seu apartamento, já por volta de uma hora da madrugada, ouviu vozes vindo de um apartamento, cuja porta estava entreaberta. “Era Marco Maciel despachando e ditando um discurso para o assessor Guilherme Codeceira, que tombava de sono e dava cochilos”, recorda o atento jornalista. 

O hábito do trabalho noturno, Maciel também levou para Brasília. Ministro da Educação, era o último a deixar a Esplanada dos Ministérios. Meu amigo Gualter Loyola, jornalista perdigueiro e boêmio, vinha de uma farra em Brasília já passando da meia noite quando observou as luzes do MEC acesas. 

Sabendo da fama de notívago de Maciel, teve a ousadia de checar a razão de tantas luzes acesas em meio a um apagão na Esplanada. Apresentou-se na recepção como jornalista, foi autorizado a ter acesso ao gabinete e chegando lá se deparou com uma cena que jamais esqueceu.

“Magno, o homem não estava despachando nem fazendo reunião. Na ante sala do seu gabinete encontrei mais de dez pessoas aguardando as audiências que haviam sido marcadas para depois da meia noite”, contou Loyola, que foi meu chefe por duas vezes, no Correio Braziliense e no Jornal de Brasília. 

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