Por Aurélio de Macedo Rodrigues*
Neste 7 de setembro, além da Independência do Brasil, celebramos também um marco no Vale do São Francisco: os 110 anos da fundação de O Pharol. Criado em Petrolina, em 1915, quando a cidade tinha pouco mais de 11 mil habitantes e apenas duas décadas de emancipação política, o periódico cresceu junto com a cidade, tornando-se o mais longevo jornal do interior de Pernambuco. Durante 73 anos, foi testemunha atenta da vida sertaneja, registrando suas lutas, conquistas e esperanças.
Tudo começou um ano antes, quando João Ferreira Gomes, o Joãozinho, ainda menino de 13 anos, lançou o Correio Infantil, um jornal manuscrito que teve sete edições. A paixão pelas letras e pelo ofício logo floresceu: assim nasceu O Pharol, o primeiro ainda manuscrito e depois impresso em Juazeiro (BA). O jornal seguia de trem, avião, ônibus e até nas barcas do Velho Chico — um feito e tanto para a época em termos de logística.
Leia maisEm 1916, com a parceria do irmão José Mariano, Joãozinho instalou uma gráfica em Petrolina. Ali, o jornal ganhou vida própria, passando a ser feito na cidade. Com paciência e teimosia, ele reuniu máquinas, tipos de letras e muita disposição. Poucos acreditavam que um jornal sertanejo pudesse resistir por tanto tempo — mas O Pharol atravessou mais de sete décadas, sempre “vivo e bulindo”, como registrou o jornalista Waldimir Maia Leite sobre a “imprensa matuta”.
Joãozinho do Pharol: a alma por trás das páginas
Com o tempo, Joãozinho e o jornal se tornaram inseparáveis. No sertão inteiro ele era conhecido como “Joãozinho do Farol”. Ele foi dono, editor, repórter, revisor e até entregador do jornal. Mais do que informar, ele tinha um compromisso silencioso com a memória e a identidade de nossa gente.
O Pharol era um retrato vivo da comunidade. Casamentos, aniversários, debates políticos, poesias e acontecimentos do mundo todo. A chegada do jornal era motivo de reunião familiar em torno da sua leitura em voz alta e muitos aprenderam a ler pelas páginas de O Pharol.
O Pharol foi um espelho do seu tempo. Relatou guerras, revoluções, enchentes, secas, o cotidiano do comércio, a vida política e até os feitos de Lampião. Era mais que notícia: era memória preservada em preto e branco.
Um legado que resiste
O fim do jornal deixou um vazio profundo. Não era apenas um semanário que se encerrava, mas um elo com a memória viva de Petrolina e do Vale do São Francisco. Outros jornais surgiram depois em Petrolina: O Sertão, de Luciano Pinto; Gazzeta, de Eudes Celestino; O Tempo, de Ubirajara Figueiredo; a Folha Verde. Mas todos tiveram vida efêmera, e nenhum conseguiu ocupar o mesmo lugar em nossos corações.
Hoje, graças ao acervo digital, O Pharol segue acessível, mantendo viva a história que Joãozinho do Farol ajudou a escrever com tanto amor e dedicação. A chama que ele acendeu em 1915 continua a iluminar — um farol que jamais se apagará na memória dos sertanejos.
*Historiador
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