Relator da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) que investiga as fraudes do INSS, o deputado federal Alfredo Gaspar (União Brasil-AL) afirmou que os desvios triplicaram no governo Lula (PT). Em entrevista ao podcast “Direto de Brasília”, ele criticou a blindagem dos parlamentares governistas, mas prometeu citar todos os envolvidos em seu relatório.
Relator, como resumir o que foram os desvios bilionários na previdência social?
Leia maisTudo nasceu com acordos de cooperação técnica com o INSS, em que determinadas entidades tiveram direito de descontar na folha dinheiro de aposentados e pensionistas. O desconto associativo começou em 1994. E nunca houve fiscalização. A primeira entidade que conseguiu descontar diretamente na folha do INSS foi a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag). Depois foram os consignados, em que desde 2003 foi permitido que bancos fizessem descontos. Resumindo, as entidades associativas têm cerca de 40 acordos de cooperação, o sistema financeiro tem cerca de 90. Isso envolve cerca de R$ 100 bilhões anuais, e a fiscalização era nenhuma. Um sistema previdenciário aberto para desvios dessa natureza, e que atinge diretamente os que mais precisam.
Não é de hoje que temos escândalos. Qual a diferença do atual governo para os anteriores?
No governo atual, alguns “cabeças” dos desvios, funcionários de carreira, passaram a ocupar postos chave e de forma conjunta. Isso permitiu um acréscimo muito grande nos descontos associativos. Saiu dos milhões para os bilhões de reais. Mas isso é uma prática que vem ocorrendo há vários governos. Não foi a primazia do atual. Há décadas, esse é um sistema contaminado. O rombo que era X passou a ser 3X. Houve sim um conjunto de oportunidades que permitiu o desvio de uma monta bilionária. A partir de Carlos Lupi, o sistema se sentiu mais apto a fazer desvios em quantitativo maior, mas já havia desvios de vários governos.
O ex-presidente do INSS já negou tudo, assim como os demais nomes citados…
É direito dos investigados darem sua versão, se calar ou fantasiar, mas a realidade dos fatos chega e não tem quem afaste. A cúpula do INSS foi afastada judicialmente, o ex-ministro Carlos Lupi foi afastado, mas a estrutura do INSS foi mantida.
Já que o mencionou, como foi a atuação de Carlos Lupi?
O ministro da Previdência tem que ter responsabilidade institucional. Ou você domina a função que exerce, ou peca pela omissão institucional. E estamos estudando, se foi um ato comissivo ou se foi fruto de omissão deliberativa.
O senhor também falou da Contag. O ex-presidente será ouvido nos próximos dias?
Como falei, foi o primeiro sindicato a conseguir fazer os descontos. É uma entidade muito próxima ao PT, tem o maior número de filiados e de descontos, alcançando bilhões de reais. Até 2024, o presidente era Aristides Veras (irmão do deputado e primeiro-secretário da Câmara Federal, Carlos Veras). Ele iria ser ouvido na próxima semana, mas pedi o adiamento, porque faltava chegar o extrato bancário para termos mais subsídios. É o que temos feito com todos que vêm para a comissão.
A convocação do Frei Chico, irmão do presidente Lula (PT), foi impedida na comissão. Ele poderá depor ainda na CPMI?
Ele é vice-presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos (Sindnapi), que é a segunda ou terceira maior entidade em termos de volume. Há muito tempo eles detêm acordos de cooperação com o INSS. Ele já foi blindado de ser convocado à CPMI, a base governista impediu. Vamos tentar colocar de novo em votação, pois tem fatos que precisam ser esclarecidos. Ele não será chamado por ser irmão do presidente Lula, mas porque existem indícios muito fortes e provas já concretas, de desvio de recursos. E como o presidente do sindicato (Milton Baptista de Souza Filho), se calou perante a CPMI, ele (Frei Chico), pela hierarquia, é o segundo da entidade e talvez tenha muito o que dizer.
Além dele, tem outros nomes sendo blindados?
Sim. Posso citar o Paulo Bodens, que recebeu R$ 3 milhões do ‘Careca do INSS’ (apelido do lobista Antônio Carlos Camilo Antunes). O Gustavo Gaspar, que tem muito a explicar. E uma ex-marqueteira do PT, que pegou R$ 5 milhões do ‘Careca’. Essas pessoas ajudariam na investigação e estão sendo blindadas. Mas todas constarão no relatório, o caminho a seguir e o que iria atingir. Estamos falando de 10 milhões que foram para essas pessoas e elas repassaram. Para quem? Quais autoridades estão trabalhando para que esses investigados não prestem esclarecimentos?
O ‘Careca do INSS’ está preso preventivamente. Qual o papel dele, afinal?
Ele trabalhou com mais de R$ 1 bilhão. Não sei com quanto ele ficou, mas acho que o suficiente para ficar calado. Hoje está preso, mas tem muita gente trabalhando para ele ser solto. Só não está solto porque a relatoria no Supremo Tribunal Federal (STF) caiu nas mãos de um ministro que está interessado em esclarecer os fatos, que é o ministro André Mendonça. A CPMI tem colaborado, colocando holofotes nessa safadeza.
Se ele falasse, seria uma delação explosiva?
Se o ‘Careca’ delatasse, a República cairia. Ele está fazendo medo à República. Tem indícios muito concretos e provas de que esse dinheiro que foi desviado não terminou na mão dele, mas que foi distribuído para muitas autoridades, dos três Poderes da República. Não posso dizer relativamente as funções ou cargos dessas autoridades, mas posso dizer que vai do Judiciário, ao Legislativo e ao Executivo. Infelizmente, o que estamos vendo na CPMI é que o dinheiro comprou muitas consciências. O conjunto dessa obra trouxe desesperança a milhares de brasileiros.
Essa é uma denúncia grave…
Parece pouco provável que um esquema dessa magnitude não tenha parlamentares envolvidos. Me parece que sim. Vamos ver se o colegiado tem a coragem de fazer esses esclarecimentos.
A exposição como relator deve lhe projetar politicamente em Alagoas. Disputar o Senado está nos seus planos?
Em Alagoas, há um fato atípico. Temos duas pessoas com muita estrutura política e base, que são o senador Renan Calheiros (MDB) e o ex-presidente da Câmara, Arthur Lira (PP). Eu sou justamente o inverso, minha base é o voto de opinião. Fui o deputado federal mais votado de Maceió e o segundo de Alagoas, sem apoio de prefeitos. Eu era do Ministério Público. Agora, sempre pontuei entre primeiros colocados para o Senado, a CPMI me traz visibilidade e responsabilidade maiores. Mas o povo está cansado de eleição, estamos ainda no ano anterior. Nem parei para pensar se serei candidato à reeleição, quanto menos ao Senado. Mas não tenho medo de desafios. No momento oportuno tomarei essa decisão, mas não tenho receio de enfrentar quem quer que seja.
Seu partido recentemente anunciou oposição ao governo Lula, mas nos estados há muitos apoiadores do presidente. Como fica a sua situação?
Desde o início eu já fui oposição ao governo Lula, enquanto no meu partido a maioria votava a favor do governo. Tive minha posição respeitada, então não posso agora desrespeitar a posição de quem entenda que deve estar ao lado do governo. Me mantive na oposição desde o início e ficarei até o fim. Não vejo no PT a habilidade e a competência para administrar o País. Fiquei feliz por o partido sair da base do governo, mas isso cabe ao diretório nacional. A mim cabe a coerência de ficar na oposição ao governo do PT.
Tem receio de que a CPMI acabe em pizza, como já ocorreu com muitas outras?
Esse é um sentimento com o qual sempre compartilhei. Sabemos o quanto é difícil fazer justiça no País, imagine no ambiente político. Como relator, tenho obrigação de dar respostas ao povo brasileiro, e irei apontar efetivamente todos que tiveram participação nos desvios. Já a consequência desse apontamento dependerá das instituições. A CPMI aponta indícios e as instituições tomam conta dos próximos passos. Na minha relatoria não haverá proteção a quem quer que seja.
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