Por Claudemir Gomes*
Em 1970, eu era apenas um jovem, cujo sonho de consumo era uma calça Lee e um tênis All Star. Amava os Beatles, os Rolling Stones e tinha o maior orgulho de dizer que o meu País era tricampeão mundial de futebol. Oito anos depois, em companhia do fotógrafo Maurício Coutinho, vivia o sonho de fazer minha primeira cobertura internacional: acompanhar a Seleção Brasileira num giro pela Europa e Arábia Saudita, na última fase dos preparativos visando a Copa do Mundo da Argentina.
De lá pra cá, se passaram mais de meio século. Como repórter, em coberturas nacionais e internacionais, e como mero torcedor, testemunhei muitas coisas. Acertos e desacertos, que nos levaram a vivenciar bons e maus momentos, e que nos deixaram com a certeza de que no futebol tudo passa, tudo se transforma, e não adianta traçar paralelos entre o ontem e o hoje, pois nada nos dará a certeza do amanhã.
Leia maisHá cinquenta anos se ressaltava a velocidade do jogo apresentada pelas seleções no Mundial do México. Velocidade de tartaruga, comparada à realidade dos dias de hoje. A partir dos anos 90, quando o futebol brasileiro vivenciou outro ciclo de conquistas, somando dois títulos em três mundiais disputados, a tecnologia foi incorporada, de vez, ao futebol, mudando conceitos e lapidando talentos na incessante busca da criação de ciborgues da bola, ou seja, de craques cibernéticos.
Bolas inteligentes, chuteiras que corrigem a pressão, intensidade e direção do chute, adequando o pé do atleta a uma posição correta que diminui a margem de erros; uniformes desenvolvidos pela NASA e um conjunto de câmeras capaz de definir um impedimento através de uma unha mal aparada de um atleta. Um cenário que nos impõe um delay de até quatro minutos para poder soltarmos o grito de gol preso na garganta. Eis o futebol em sintonia com o novo tempo.
Não comparo os tempos. Evito que minha alma ande para trás. Mas ontem, após ver imagens fortes de uma violência inaceitável nas arquibancadas do novo Maracanã, foi impossível não comparar com o que veio na minha lembrança: o romântico futebol que nos era repassado pelas imagens do Canal 100, ressaltando o drible, a ginga e o jogo jogado pelos inigualáveis craques brasileiros, tricampeões mundiais. Tudo emoldurado pela alegria do torcedor que enchia de graça as extintas gerais do maior templo do futebol mundial: o Maracanã.
Tão abominável quanto a violência, foi a tentativa de justificar a insanidade de colocar, no mesmo palmo de chão, torcedores argentinos e brasileiros, desdenhando de uma rivalidade que é alimentada pela cólera.
O Brasil é o sexto colocado na tabela de classificação das Eliminatórias Sulamericanas para a Copa de 2026. Sem sofrimento! Afinal, a FIFA aumentou o guarda-chuva, criou um Mundial que vai abrigar quase todas as seleções dos vários continentes. A ordem é faturar. Além do mais, essa história de “qualidade técnica” é coisa do passado. Afinal, como asseguram os novos professores: “no futebol não existe mais time inocente”.
Sinais dos tempos! Em 1970 as apostas eram feitas no “Jogo do Bicho”. Hoje são feitas nas “bets”.
*Jornalista
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