Por João Batista Rodrigues*
Os fogos de artificio são uma tradição em Pernambuco, especialmente durante o Réveillon e o São João. No entanto, ao contrário do que ocorreu com a vaquejada — outra forte manifestação cultural nordestina, considerada prática legal pelo Supremo Tribunal Federal (ADI 5.728) — a Corte Suprema não foi tão permissiva com os estampidos. O STF, no julgamento do Recurso Extraordinário 1210727/SP julgou constitucional “lei municipal que proíbe a soltura de fogos de artifício e artefatos pirotécnicos produtores de estampidos”.
Como o Estado também detém competência concorrente para legislar sobre meio ambiente, uma lei estadual tem a mesma legitimidade que a norma municipal para tratar do tema. Em Pernambuco, essa regulação foi estabelecida por meio da Lei nº 17.195/2021, que praticamente proíbe todos os fogos ruidosos em eventos festivos realizados em ambientes abertos. Assim dispõe o texto legal:
Leia maisArt. 1º-A. Fica proibida a utilização, a queima e a soltura de fogos de artifícios e assemelhados, e de quaisquer artefatos pirotécnicos de efeito sonoro ruidoso com estampidos, nas classes C e D, conforme o Decreto – Lei Federal nº 4.238, de 8 de abril de 1942, em todo o território do Estado de Pernambuco, em eventos festivos ou de entretenimentos, em ambiente aberto, de caráter público ou privado.
A determinação abrange quaisquer fogos com estampido que contenham mais de 0,25 gramas (vinte e cinco centigramas) de pólvora e se aplica a todo o território estadual. Com base nessa legislação, algumas Promotorias de Justiça estão recomendando aos prefeitos a realização de campanhas de conscientização, com o objetivo de dar efetividade à norma estadual.
Embora entenda que tais recomendações deveriam ser direcionadas ao Governo do Estado — considerando que uma lei estadual não pode criar despesas para os municípios, conforme estabelece a Emenda Constitucional nº 128 — a Recomendação Ministerial traz dados preocupantes.
Segundo o Ministério da Saúde, nos últimos anos, mais de 7 mil pessoas sofreram lesões decorrentes do manuseio de fogos, com as seguintes consequências: 70% dos casos envolvem queimaduras, 20% lesões com lacerações e cortes e 10% resultaram em amputações de membros superiores, lesões de córnea, perda de visão, danos ao pavilhão auditivo e até perda total da audição.
Além desses riscos, há uma crescente preocupação com os impactos do barulho sobre grupos vulneráveis, como pessoas com autismo, idosos, enfermos e animais, todos altamente sensíveis aos estampidos.
Assim, embora a queima de fogos e seus estampidos tragam, para a maioria das pessoas, lembranças afetivas, muitas vezes associadas à infância, e despertem o espírito de aventura e contemplação, é de bom alvitre que as próprias legislações municipais busquem formas de conciliar a tradição com a necessária proteção aos grupos vulneráveis e aos animais.
Cabe à gestão municipal encontrar os meios adequados para dar efetividade à norma local, equilibrando cultura, segurança e bem-estar coletivo.
*Advogado, Ex-Prefeito de Triunfo, Ex-Presidente da União dos Vereadores de Pernambuco – UVP.
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