Do UOL
Embora contem com bons planos de saúde e atendimento em hospitais de alto padrão, deputados e senadores têm direito a reembolsos médicos quase ilimitados.
Levantamento do UOL aponta que deputados e senadores receberam R$ 100,5 milhões em reembolsos nos últimos seis anos. No caso dos deputados, a única ressalva é que cada nota apresentada não ultrapasse R$ 135,4 mil, mas não há limite de pedidos. A transparência sobre esses gastos também é um ponto crítico.
Leia maisA Câmara omite detalhes sobre os procedimentos realizados e os locais de tratamento, sob a justificativa de proteger dados pessoais e garantir sigilo médico. Já o Senado não informa quais parlamentares obtiveram o benefício, apenas o total pago.
Procurados, os dez deputados que mais receberam reembolso no período, segundo o levantamento do UOL, defenderam a legalidade dos gastos. Esses dez parlamentares receberam, ao todo, quase R$ 11 milhões em reembolsos.

Os reembolsos milionários na Câmara
Na Câmara dos Deputados, o desembolso atingiu R$ 39,7 milhões entre fevereiro de 2019 e abril de 2025, beneficiando 584 deputados de diferentes legislaturas. Os dados foram obtidos pelo UOL via LAI (Lei de Acesso à Informação).
O plano de saúde da Câmara cobre hospitais de excelência em todo o país, como Sírio-Libanês, Albert Einstein, Rede D’Or e DF Star — onde o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) ficou internado por três semanas em abril.
Deputados têm descontos variáveis em folha para bancar o convênio (o máximo fica em torno de R$ 800), e também pagam coparticipação de 25% a 30%, a depender do plano a que têm direito.
A ex-deputada Tereza Nelma (PSD-AL) foi a que mais recebeu pelos gastos médicos no período: o montante ultrapassou R$ 2 milhões. Ela afirma que foi diagnosticada com câncer há 12 anos e disse que não recebeu “nenhum centavo” das despesas. “A Câmara se entendeu diretamente com o hospital. Não havia nada ilegal. Se eu não tivesse o apoio que recebi, talvez não estivesse agora respondendo seu email”, escreveu à reportagem.
O segundo maior volume de reembolso (R$ 1,7 milhão) foi pago ao deputado Damião Feliciano (União-PB). Ele não respondeu aos contatos da reportagem.
A família de José Carlos Schiavinato (PP-PR), que morreu de covid-19 em 2021, recebeu R$ 1,6 milhão em reembolsos entre 2022 e 2024. Ele foi tratado no Sírio-Libanês de Brasília, que estava fora da rede conveniada na época — o hospital voltou a fazer parte da rede em novembro de 2022. Após sua morte, a família pediu o ressarcimento de um mês de internação à Câmara, que custeou 97% do tratamento.
A lista dos mais contemplados com o benefício inclui ainda Celio Moura (PT-TO), com o valor de R$ 875,9 mil, e João Campos de Araújo (Republicanos-GO), com R$ 767 mil. Moura disse ao UOL que o reembolso está ligado a “um gravíssimo acidente automobilístico” que matou seu irmão, em 2021.
O ex-deputado relatou ter sido transferido em UTI aérea de Araguaína (TO) para o hospital DF Star, que não aceitava o plano. “A bancada do PT pediu na época do acidente para que a Câmara arcasse com as despesas”, disse. “[Por causa da covid-19] Os hospitais públicos de Brasília não tinham vagas”, afirmou.
Ao ex-deputado Nilson Pinto (PSDB-PA) foram destinados R$ 735 mil, e à deputada Elcione Barbalho (MDB-PA), R$ 698 mil. A assessoria da deputada não se manifestou.
O ex-parlamentar disse ao UOL que pediu ressarcimentos não cobertos pelo seu plano, “conforme faculta a legislação”. Ele citou entre as despesas a internação de 35 dias na UTI no Hospital Sírio-Libanês em São Paulo, em razão de uma infecção que levou a “risco de morte iminente”.
Reembolso ilimitado
Em março de 2021, o limite por pedido de reembolso na Câmara saltou de R$ 50 mil para R$ 135,4 mil por decisão do então presidente Arthur Lira (PP-AL), que alegou “inflação médica” — o reajuste concedido foi de 170%. A correção inflacionária (IPCA) no período não chega a tanto: 32%.
Cabe ao segundo vice-presidente da Câmara, Elmar Nascimento (União-BA), aprovar os reembolsos. Em 2019, Lira foi ressarcido em R$ 26,5 mil. O agora presidente da Casa, Hugo Motta (Republicanos-PB), recebeu R$ 66,1 mil entre 2019 e 2024.
A assessoria de Motta não respondeu aos questionamentos da reportagem. Lira afirmou que o reembolso foi por uma cirurgia de catarata e que todas as despesas passaram por auditoria.
Em 2019, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi reembolsado em R$ 435,3 mil, referentes a tratamentos em consequência da facada sofrida em 2018, quando ainda era deputado. “Todas as minhas despesas foram decorrentes dessa facada. De 1991 até 2018, pelo que me lembro, nunca usei o serviço de saúde da Câmara”, disse o ex-presidente ao UOL.
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