Em menos de 100 dias no cargo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) exonerou dezenas de militares de postos-chave da Presidência e da Vice-Presidência da República, além de reduzir significativamente a presença dos fardados em empresas públicas e ministérios.
A intenção de diminuir a presença de militares na administração pública está ligada à “desbolsonarização”. O ministro da Casa Civil, Rui Costa, havia adiantado, no começo do governo, que a troca de assessores comissionados da administração federal iria ocorrer independentemente de serem quadros militares ou civis.
Antes mesmo de assumir o mandato, Lula decidiu retomar tradição que havia sido interrompida por Michel Temer (MDB), em 2018, e indicou um civil para comandar o Ministério da Defesa: José Múcio Monteiro. As informações são do Metrópoles.
Leia maisNo caso dos militares, o presidente estuda um conjunto de regras na tentativa de “despolitizar” as Forças Armadas. Essas mudanças estão sendo idealizadas pela Defesa em uma minuta de proposta de emenda à Constituição (PEC). Lula deverá avaliar a proposta e encaminhá-la ao Congresso Nacional. A PEC deve estipular que militares da ativa que optem por assumir funções públicas (como ministros e parlamentares) passem automaticamente para a reserva.
Atualmente, sargentos, capitães e majores podem disputar as eleições e assumir mandatos. Quando não se elegem, eles voltam normalmente aos quartéis-generais.
A lei atual, que não traz essa restrição, foi alvo de críticas durante o governo Bolsonaro. Isso porque representantes da caserna assumiram cargos na antiga gestão sem deixar a farda. São os casos, por exemplo, dos generais Walter Braga Netto e Eduardo Pazuello, que participaram de eventos eleitoreiros, em diversas ocasiões, ao lado de Bolsonaro.
Foi o que ocorreu com Pazuello, ex-ministro da Saúde. Em 2021, ele subiu em um carro de som e discursou em um ato político de Bolsonaro no Rio de Janeiro.
Um processo administrativo foi instaurado para apurar a conduta do general, uma vez que o Estatuto dos Militares e o Regulamento Disciplinar do Exército proíbem que militares da ativa participem de atos políticos. No entanto, o Exército resolveu não punir o militar.
Segurança pessoal
O número de militares na segurança presidencial também foi reduzido. O delegado da Polícia Federal (PF) Alexsander Castro de Oliveira, que atuou na coordenação da equipe de segurança durante a campanha eleitoral de Lula em 2022, foi nomeado secretário extraordinário de Segurança Imediata do Presidente da República do Gabinete Pessoal do Presidente da República.
Vinculada diretamente ao gabinete presidencial, essa secretaria foi criada por Lula em janeiro para planejar e executar a segurança presidencial. O titular do Palácio do Planalto já indicou ter perdido a confiança em parcela dos militares da ativa e rejeitou ter fardados como ajudantes de ordens.
Os ajudantes de ordens normalmente eram oficiais da ativa de carreira ascendente, que se tornavam muito próximos ao chefe do Executivo. Os ocupantes desses cargos possuem acesso direto ao mandatário, sendo responsáveis por itens pessoais, como o telefone celular e a mala, e compartilham o carro presidencial.
O posto ficou em evidência depois que foi revelado envolvimento do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, no caso das joias doadas pela Arábia Saudita ao ex-presidente.
Escolas cívico-militares
Em uma frente mais pragmática, o governo acabou com a diretoria no Ministério da Educação (MEC) responsável pelo Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (PECIM), criado no governo Bolsonaro.
Desde janeiro, membros do Exército que ocupavam cargos no âmbito do programa de escolas cívico-militares têm sido dispensados de suas funções.
Esses militares são designados para “prestação de tarefa por tempo certo”, modalidade usada pelas Forças Armadas para contratar militares da reserva ou reformados como auxiliares no Executivo. Isso significa que, mesmo que os oficiais estivessem lotados no MEC, cabia ao Exército realizar a dispensa deles do cargo.
Aproximação
Nos últimos meses, enquanto promove uma desmilitarização do governo, Lula tem dado gestos na direção dos fardados, na tentativa de se reaproximar. A principal frente trabalha com a priorização dos investimentos nas três Forças, algo que o atual chefe do Executivo federal alega ter promovido em seus dois primeiros mandatos.
Na quarta-feira (15/3), o presidente almoçou com o titular da Defesa e com o comandante da Marinha do Brasil, Marcos Sampaio Olsen, ocasião em que o almirantado apresentou os programas estratégicos da Marinha do Brasil, com ênfase no Programa Nuclear da Marinha (PNM) e no Programa de Submarinos (Prosub).
O almoço já rendeu um encaminhamento: na próxima semana, Lula visitará obras do Prosub em Itaguaí (RJ).
Já na quinta (16/3), o mandatário da República compareceu à posse do novo presidente do Superior Tribunal Militar (STM), o tenente-brigadeiro do Ar Joseli Parente Camelo. A ida dele ao evento foi um encaixe na agenda, visto que o petista cumpriu agenda em Foz do Iguaçu (PR) — que fica a duas horas de avião de Brasília — naquela manhã, para a posse de seu indicado ao comando da usina de Itaipu.
Segundo Victoria Abel, da coluna Igor Gadelha, no Metrópoles, chefes de tropas reconheceram os esforços de Lula e disseram que eles têm funcionado para melhorar a relação. De acordo com esses oficiais, o barulho político ainda existe na base das Forças Armadas, mas já está mais baixo.
Uma amostra dessa boa vontade está em comunicado interno da Marinha, divulgado no dia 8 de março, dias antes do almoço de Lula com o comandante da Força Naval, que deu 90 dias para que militares da ativa se desfiliem de partidos políticos, sob risco de punição.
A Constituição já prevê, em seu artigo 142, que o militar, enquanto em serviço ativo, não pode estar filiado a partidos políticos. No entanto, não há fiscalização constante em torno disso. Ainda não há indicação de que as outras duas Forças sigam o mesmo exemplo e intensifiquem esse controle.
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