Meus avós tiveram forte influência na minha formação. De todos, o que convivi mais de perto foi Severo Martins, pai da minha mãe Margarida Martins. Augusto, pai de meu pai Gastão Cerquinha, não conheci. Morreu antes do meu grito ao mundo, mas vovó Mariinha, sua esposa, me colocou no colo, contou Histórias de Trancoso e povoa a minha mente até hoje com doces recordações.
Foi longeva: morreu com mais de 90 anos num acidente de carro em Cabrobó, vindo de um passeio em São Paulo. Adorava viajar, fumava cachimbo, viciada no jogo do bicho. Todo dia me perguntava se havia sonhado com algum animal para fazer a sua aposta. Vovó Maria Cornélia de Souza, esposa do meu avô Severo, mãe de mamãe, morreu cedo, não a conheci.
Leia maisNamorador, vovô Severo cuidou de arranjar logo uma companheira, Abigail, que virou nossa avó por extensão. Vindo de Monteiro (PB), vovô era motorista de caminhão e duro no trato. Eu mesmo morria de medo dos seus gritos, da sua cara carrancuda. Ele só dava umas risadinhas quando tomava uma cervejinha antes do almoço. Sua morte foi sem dor: numa cadeira de balanço em meio ao cochilo pós-almoço.
Vez por outra, suas admoestações recheiam minha mente com doces recordações. Avós desempenham papel fundamental na vida familiar, transmitindo valores, sabedoria e amor incondicional. São fontes de histórias, experiências e um porto seguro para netos de todas as idades. A presença deles enriquece a vida familiar, proporcionando memórias preciosas e um senso de continuidade.
Mãe Quitéria (na foto que ilustra a crônica), como tratava minha Nayla a sua avó materna, teve papel preponderante na formação dela, uma raiz que alimenta a sua vida como uma árvore frutífera. Em Sertânia, foi um abrigo de sentimentos bons, um presente de Deus para minha Nayla. A todo instante, abraçava o coração dela, para superar a ausência de Ivete, a mãe, forçada a tentar um novo eldorado em São Paulo para dar uma vida digna à filha.
Na minha convivência diária com minha Nayla fico a matutar com as citações que faz sobre o aprendizado de vida com sua Mãe Quitéria. Diante de uma situação que alguém não consegue lidar com uma tarefa aparentemente mais fácil, recorre a velha máxima aprendida com a avó-mãe: “Quem não pode com o pote, não pega na rodilha”.
Para minha Nayla, Mãe Quitéria transformou o simples em especial com amor, sua ternura fez o mundo dela o lugar mais gentil. Foi a bússola que a guiou com sabedoria, dando muito amor, um amor que nunca envelheceu. Diante de tantas lições que Nayla me passa a cada dia, fico convencido de que avós são depositários dos valores fundamentais da vida.
Criança, ela ouviu muitas histórias de sua Mãe Quitéria que deram o prumo da vida dela. Afinal, ouvir as histórias dos nossos avós é aprender com a sabedoria do tempo. Mãe Quitéria deu duas vezes carinho e duas vezes amor à minha Nayla. Foi, sem dúvida, um anjo abençoado.
Traduzindo para os tempos atuais de globalização, Mãe Quitéria foi o Google da minha Nayla: teve respostas para todas as perguntas e compartilhou histórias incríveis. Foi aquele abraço quentinho em um dia frio, que aquece o coração, um tesouro precioso, guia e protetora, um exemplo de que o amor foi a resposta para todos os problemas e as dificuldades enfrentadas por ela, que, como eu, na infância venceu as adversidades do sertão de vidas secas.
Tem coisa melhor do que casa de avós? Não, porque é abrigo de sentimentos bons, comida quentinha, travessuras e muito amor. Local onde o amor se expande, onde há sorrisos a todos instante, onde Deus se faz Gigante. Orações de avós, dizia minha avó Mariinha, valem mais do que diamante.
Avós criam memórias, eternizam momentos, seus braços abrigam os melhores abraços. Seu amor é gigante que nem dá para medir, somente sentir. São pingos de esperança que Deus deposita nas nossas vidas. Mágicos, em qualquer momento trazem de volta os sabores da infância.
Recorrendo a Rachel de Queiroz, que frequentemente explorava o tema do tempo e da memória em suas obras, os avós, com suas histórias e lembranças, são guardiões dessas memórias familiares, conectando o passado ao presente. São, segundo a autora de O Quinze, a mistura perfeita de risadas, histórias e amor.
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