Legislativos dos municípios e estimativas populacionais 

Por Maurício Costa Romão*

Para atualizar os dados demográficos do Brasil no período intercensitário, o IBGE lança mão de estimativas populacionais anuais, faz uma contagem da população no meio da década e realiza projeções. 

A contagem populacional programada para 2015 não se concretizou, de maneira que a última projeção da população, realizada em 2018, se baseou em dados temporais defasados, do início da década, num contexto de grandes transformações na dinâmica demográfica do país, inclusive por influência da pandemia da covid-19 que, também, causou o adiamento do Censo 2020.

Diante desses problemas, especialistas da área asseguram que as estimativas populacionais para anos recentes estão superestimadas. Basta dizer que tais estimativas apontavam para uma população brasileira de 215 milhões em 2022, ao passo que as prévias do Censo Demográfico de 2022 registraram um contingente de 208 milhões. 

Nessa esteira, com fulcro nas estimativas de suas populações, alguns municípios, através de suas instâncias legislativas, têm aumentado o efetivo de seus vereadores sem aguardar a finalização do Censo 2022.

É o caso, por exemplo, do município de Goiânia, no Estado de Goiás. A Câmara Municipal aprovou, no dia 20 de dezembro próximo passado, o aumento do número de vereadores de 35 para 39, a partir da legislatura que se inicia em 2025.

Na justificativa ao Projeto de Emenda à Lei Orgânica do Município, os parlamentares argumentaram que se fazia necessária a atualização do quantitativo de vereadores, visto que, ad litteram: “…o último censo demográfico (sic) do IBGE aferiu que a população estimada do município de Goiânia em 2021 é de 1.555.626 habitantes…” p. 5 do Projeto.

De fato, entre as 24 faixas populacionais estabelecidas pela Emenda Constitucional 58/09, que determina o número máximo de vereadores dos municípios brasileiros por faixa, a de 1,5 milhão a 1,8 milhão de habitantes, na qual se circunscreve a estimativa da população de Goiânia, comporta até 39 vereadores. 

Acontece que as prévias do Censo Demográfico de 2022 detectaram que a população de Goiânia teria hoje 1.414.483 habitantes, quase 10% menor do que a projetada nas estimativas em que se assentou a decisão da edilidade local. Então, neste caso, a faixa populacional apropriada para Goiânia seria a de 1,35 milhão a 1,5 milhão, na qual o número máximo de vereadores é de 37.

Caso o Censo 2022 confirme a prévia, a Câmara goianiense precisará de nova Emenda à Lei Orgânica do Município, desta feita reduzindo de 39 para 37 o quantitativo de seus vereadores, visto que a inobservância do ajuste colide com a norma constitucional. Isso tem que ser feito até as convenções partidárias de 2024, para a alteração viger em 2025.  

Eventualmente, a Casa legislativa local pode manter o efetivo atual de 35 parlamentares, mesmo estando numa faixa populacional que lhe dê direito a ter 37 legisladores. 

Com efeito, ao contrário de que às vezes se propaga, a Emenda 58 não obriga nenhuma edilidade a aumentar o número de vereadores para o quantitativo fixado em cada faixa populacional. O texto constitucional apenas estabelece o limite máximo de vereadores por faixa, não exigindo que as Câmaras Municipais se adequem ao teto estipulado.

Resta ao legislativo goianiense, e aos demais que lhe emularam nessa “atualização”, almejar que os resultados finais do Censo 2022, previstos para abril deste ano, ratifiquem suas decisões tomadas com base nas estimativas populacionais, de sorte que não precisem emendar novamente suas leis orgânicas.   

*Ph.D. em economia pela Universidade de Illinois, nos Estados Unidos.

Por Magno Martins – exclusivo para a Folha de Pernambuco

A travação do processo de nomeação dos órgãos federais de segundo escalão em Pernambuco já tem um culpado: o senador Humberto Costa (PT), que ontem foi eleito presidente da CAS – Comissão de Ação Social do Senado. “Humberto quer tudo. Quer Sudene, Codevasf e até o Metrô”, disse, ontem, em reserva, um deputado da bancada federal pernambucana.

Segundo ele, o senador já entregou ao ministro da Articulação Política, Alexandre Padilha, nomes de sua preferência para as três repartições. “Só gostaria de saber se o senador também vota na Câmara, se vem fazer aqui o papel dos deputados da base”, ironizou um outro parlamentar, que identificou no Planalto as digitais de Humberto para emperrar as nomeações.

A princípio, a Sudene iria para o Solidariedade, a pedido do presidente Paulinho da Força, que indicou o nome da ex-deputada Marília Arraes. Já a Codevasf chegou a ser incluída dentro da cota do Republicanos, legenda em Pernambuco comandada pelo deputado federal Sílvio Costa Filho. “Tudo estava bem encaminhado, Silvio já tem até o nome para a Superintendência em Petrolina, mas Padilha suspendeu as negociações”, disse outro parlamentar da base de Lula no Congresso.

Quanto ao Metrô do Recife, hoje na cota do PL, tendo à frente ainda um aliado do deputado André Ferreira, é alvo de disputa pelo MDB, União Brasil, PT e Republicanos também. André não briga pela permanência do aliado porque o seu partido, o mesmo de Bolsonaro, faz parte do bloco de oposição ao Governo Lula.

Outra fatia de poder igualmente importante é a Hemobrás – Empresa Brasileira de Hemoderivados e Biotecnologia. O que se diz é que Humberto também quer ter preponderância na indicação do seu diretor-presidente. Trata-se de uma estatal com 100% do Capital Social pertencente ao Governo Federal.

Empresa pública da administração indireta, vinculada ao Ministério da Saúde (MS), que tem como função social garantir aos pacientes do Sistema Único de Saúde (SUS) o fornecimento de medicamentos derivados do sangue ou obtidos por meio de engenharia genética, com produção nacional.

Seu trabalho é voltado para reduzir a dependência externa do Brasil no setor de derivados do sangue e biofármacos, ampliando o acesso da população a medicamentos essenciais à vida de milhares de pessoas com hemofilia, além de pacientes de imunodeficiências primárias ou erros inatos do sistema imune, queimaduras graves, Aids, câncer, entre outras doenças.

A fábrica em Goiana, quando estiver totalmente concluída, terá capacidade para processar até 500 mil litros de plasma ao ano. O investimento é da ordem de R$ 1,4 bilhão, com 17 prédios, distribuídos em 48 mil metros quadrados de área construída, em um terreno de 25 hectares. Em paralelo à construção da fábrica existe a implantação de uma fábrica de fator VIII recombinante, medicamento destinado ao tratamento da hemofilia A no Brasil.

Violência contra a mulher

As mulheres comemoraram, ontem, o seu dia, a data internacional do então classificado sexo frágil. No Brasil das taxas mais altas de violência contra a mulher fica difícil levantar uma taça de brinde à data. Segundo as últimas pesquisas sobre igualdade de gênero realizadas no Brasil, a realidade de ‘ser mulher’ no Brasil ainda é marcada pela desigualdade e a violência.

É o que aponta a pesquisa “Visível e Invisível”, produzida pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). De acordo com o levantamento, mais de 18 milhões de mulheres sofreram alguma forma de violência em 2022 no País, 5,88% a mais do que no ano anterior. Os dados revelam que existe uma verdadeira ‘epidemia de violência’ contra as mulheres – por meio de ofensas verbais, perseguição, ameaças, chutes e socos, 14 mulheres foram agredidas por minuto.

A violência não para por aí: o país registrou, em 2022, um caso de feminicídio por dia, atesta a pesquisa “Elas Vivem: dados que não se calam”, da Rede de Observatórios da Segurança. Isso significa que, por dia, uma mulher perdeu a vida simplesmente pelo fato de ser mulher. “Seja por causa de sua condição de gênero, por conta de relacionamentos abusivos ou por não seguirem normas tradicionais de gênero, centenas de mulheres são assassinadas, ou seja, sofrem feminicídio.

Desde 2015, a lei considera isso um crime hediondo. Além disso, conforme aponta a FBSP, 46,7% das mulheres brasileiras de 16 anos ou mais sofreram alguma forma de assédio no último ano – isso equivale a 30 milhões de pessoas que não tiveram seus corpos respeitados nas ruas, no trabalho, no transporte público ou até mesmo dentro de casa.

Domésticas sofrem mais – Relatos de violência doméstica que atravessam gerações não são incomuns dentro dos lares brasileiros. Para a advogada especialista em Direitos Humanos, Mayra Cardozo, uma das principais medidas que o estado deve adotar em relação ao combate à violência doméstica é trazer educação sobre esse tema desde a base educacional, para que essa cultura de violência seja interrompida e tratada em sua raiz. “Quando falamos de violência doméstica, nada mais é do que uma consequência de uma sociedade patriarcal e opressora. As políticas públicas têm de sempre ser pautadas no viés educativo. Porque não adianta apenas criminalizar e punir, senão teremos cada vez mais feminicídios, sem resolver de fato o problema”, alerta Cardozo.

Bandeiras de Marília – No pacote que lançou, ontem, em busca de avanços nas políticas em favor das mulheres, o presidente Lula incluiu duas grandes bandeiras da sua atuação parlamentar: a distribuição gratuita de absorventes no Sistema Único de Saúde e a regulamentação da cota de 8% da mão de obra para mulheres vítimas de violência em contratações públicas na administração federal direta, autarquias e fundações.

Barco abandonado – Sem financiamento do governo há oito anos, o barco Sinuelo, que fazia o monitoramento dos tubarões na costa de Pernambuco, está abandonado em Brasília Teimosa, na Zona Sul, segundo o portal G1PE.  A embarcação, que ajudou a reduzir a incidência de ataques na região, hoje abriga cachorros e entulhos. Em 15 dias, três pessoas foram atacadas em praias do Grande Recife. No primeiro caso, o surfista André Luiz Gomes da Silva, de 32 anos, levou uma mordida em Olinda.

O flagrante – O momento em que o sargento da Marinha Jairo Moreira da Silva tenta negociar a liberação das joias de R$ 16,5 milhões na Alfândega do Aeroporto de Guarulhos (SP) foi registrado em câmeras de segurança, segundo antecipou, ontem, o site Metrópole, de Brasília. Jairo recebeu do então presidente Jair Bolsonaro (PL) a missão de reaver as joias, que entraram ilegalmente no país após serem oferecidas como presente pelo governo da Arábia Saudita para Michelle Bolsonaro.

Humberto presidente – Se na Câmara Federal nenhum representante de Pernambuco emplacou até o momento o comando de uma comissão temática, no Senado Humberto Costa (PT) foi eleito, ontem, presidente da Comissão de Assuntos Sociais. “Fiquei muito feliz com o novo desafio. Este é um momento extremamente importante para o Brasil. É o início da reconstrução do País depois de quatro anos de abandono. Na CAS, iremos tratar de temas relevantes para este novo momento, sempre buscando o diálogo com todos os setores”, afirmou.

CURTAS

TRANSPARÊNCIA SALARIAL – No Dia Internacional das Mulheres, o presidente Lula enviou, ontem, ao Congresso, projeto que obriga empresas com mais de 20 funcionários a publicar relatórios de “transparência salarial e remuneratória” de homens e mulheres. Pela proposta, o Ministério do Trabalho e Emprego ficará responsável por regulamentar como deverão ser feitos esses relatórios, que devem seguir a legislação atual de proteção de dados pessoais.

CONSTRANGIMENTO – Na sessão da Câmara, ontem, em homenagem às mulheres, o deputado Nikolas Ferreira (PL-MG) usou a tribuna para fazer uma pregação contra o feminismo. Usando uma peruca loura, ele se apresentou como “deputada Nikole” para debochar do movimento de direitos das mulheres e defender que elas retomem feminilidade concebendo filhos e casando. A fala do deputado provocou constrangimento na sessão que, por conta da data especial, foi presidida pela deputada Maria do Rosário (PT-RS).

Perguntar não ofende: Quando as mulheres no Brasil terão de fato direitos iguais?