Por Romualda Mirdes de Figueiroa Vieira*
Um novo Projeto de Lei, em tramitação na Câmara dos Deputados, reacende um dos debates mais urgentes da educação brasileira: o equilíbrio entre progressão escolar e aprendizagem real. A proposta quer proibir a aprovação automática de estudantes que não atingirem o aprendizado mínimo esperado, reforçando a importância da avaliação, da recuperação e do desenvolvimento efetivo de competências.
A ideia é garantir que a progressão escolar seja baseada em critérios pedagógicos sólidos, evitando que os alunos avancem sem dominar os conteúdos essenciais. Embora não elimine completamente o modelo de progressão continuada, o projeto propõe ajustes importantes para assegurar que o avanço de série esteja sempre vinculado à aprendizagem – e não apenas à passagem automática de ano.
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O que diz o projeto?
Atualmente, o regime de progressão continuada permite que estudantes do ensino fundamental avancem por ciclos de aprendizagem mais longos, com foco na superação das dificuldades ao longo do tempo, sem necessidade de reprovação imediata. No entanto, o novo projeto de lei, já aprovado na Comissão de Educação da Câmara, visa restringir esse modelo ao proibir a organização da educação básica em ciclos superiores a um ano. A proposta também impede que alunos do ensino fundamental e médio sejam promovidos automaticamente caso não tenham obtido nota suficiente, exceto em casos justificados por questões de saúde.
O objetivo central da medida é interromper a cultura da aprovação sem mérito, que, segundo especialistas, tem contribuído para a deterioração da qualidade do ensino. A progressão automática leva à formação de deficiências acumuladas, dificultando o aprendizado nas séries seguintes e comprometendo o desenvolvimento integral do aluno.
A justificativa por trás do projeto é clara: a promoção automática cria lacunas de aprendizagem ao permitir que estudantes avancem de série sem o domínio mínimo dos conteúdos. Professores relatam frustração ao verem alunos sendo aprovados sem estarem preparados, o que desvaloriza o trabalho docente e desestimula os alunos que se esforçam.
Mais preocupante ainda é o comportamento que essa prática incentiva. Em muitas escolas, é comum ouvir de alunos frases como: “não preciso estudar, vou passar de qualquer jeito”. Essa mentalidade cria uma perigosa ilusão de que esforço e dedicação são desnecessários, gerando uma cultura escolar baseada na falta de compromisso com o próprio futuro.
A ausência de cobrança real reforça a desvalorização do conhecimento. Estudantes que deixam de aprender hoje enfrentarão limitações significativas no futuro, tanto no acesso a oportunidades quanto na construção de uma visão crítica sobre o mundo. A falta de base escolar torna as pessoas mais vulneráveis à desinformação, mais suscetíveis a manipulações e menos preparadas para o mercado de trabalho. Afinal, quem tem mais conhecimento tem mais chances de conquistar empregos melhores, com salários mais altos e maior estabilidade.
Além disso, quando todos são aprovados indiscriminadamente, mesmo sem esforço, isso desmotiva os alunos que se dedicam, criando uma sensação de injustiça e desvalorização do mérito. A longo prazo, essa distorção pode comprometer não só o desempenho individual, mas a confiança no sistema educacional como um todo.
Entende-se que a discussão vai muito além da simples reprovação ou aprovação. Está em jogo o modelo de educação que queremos para o país: uma educação que valoriza o conhecimento, o esforço e a responsabilidade, ou uma educação que promove resultados artificiais, à custa da aprendizagem real.
O projeto de lei propõe uma mudança importante ao defender a avaliação contínua, o acompanhamento pedagógico eficaz e a implementação de medidas de recuperação como pilares da progressão escolar. Ou seja, o aluno pode ter mais tempo para aprender, sim, mas não deve ser aprovado se não demonstrar domínio das habilidades necessárias.
Se for aprovado em definitivo e sancionado como lei, esse projeto pode marcar um ponto de virada no combate à aprovação automática e na valorização do aprendizado. A educação de qualidade exige compromisso, responsabilidade e uma estrutura que valorize o desenvolvimento real dos alunos.
Promover um aluno sem preparo não é um ato de inclusão, é um gesto de negligência. Para garantir um futuro mais justo e promissor para as próximas gerações, é preciso assegurar que o avanço escolar caminhe lado a lado com o conhecimento. Esse é o desafio que a nova lei pretende enfrentar — e que todos nós, como sociedade, precisamos encarar com seriedade.
*Professora em Caruaru e Santa Cruz do Capibaribe
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