A ordem é bater na tecla de que programas lançados recentemente, como os que preveem linhas de crédito mais baratas para a reforma de casa e para microempreendedores, também beneficiam a classe média.
Ministros têm sido orientados a destacar em entrevistas que o principal adversário do País é o sistema de desigualdade, montado para favorecer 1% da população contra 99%. Para exemplificar esse raciocínio, devem dizer que, enquanto a maior parte dos brasileiros enfrenta uma jornada pesada, fila de ônibus e trânsito, impostos que levam mais de 20% dos salários de professores e até de pequenos comerciantes aliviam a carga de quem nasceu cercado por privilégios.
O Palácio do Planalto encomendou pesquisas qualitativas, que medem as percepções dos eleitores, para definir o novo slogan do governo e as consultas ainda estão em andamento. Já se sabe, porém, que o lema vai misturar os conceitos de trabalho, justiça social e enfrentamento aos privilégios com a defesa do Brasil. O toque nacionalista ganhou força após a ofensiva do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, contra o País.
O ministro-chefe da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Sidônio Palmeira, tem conversado com os colegas sobre essa nova linha, que recebeu sinal verde de Lula. Nos bastidores, auxiliares do presidente afirmam que um governo de coalizão — no qual cada um puxa para um lado — acaba sem identidade. É por isso que, hoje, todas as iniciativas de ministros têm de passar pelo crivo da Secom.
Levantamentos do Planalto e do PT revelam que eleitores estão desencantados porque esperavam mais de Lula do que a reedição de programas como o Bolsa Família, o Farmácia Popular e o Minha Casa, Minha Vida. No diagnóstico dos entrevistados, essas ações já “fazem parte da paisagem” e é preciso ir muito além disso.
A troca do slogan “União e Reconstrução” por um mote que indique o rumo da segunda metade do governo e aponte para 2026, quando o presidente deve disputar novo mandato, já vinha sendo planejada por Sidônio.
Tudo foi acelerado, no entanto, após a crise entre o governo e o Congresso por causa do decreto que prevê o aumento de alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
Partidos que ocupam 14 ministérios e não pretendem apoiar o PT nas eleições de 2026 — a maioria deles do Centrão — ajudaram a derrubar o decreto de Lula, que, por sua vez, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF). O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, alega que a equipe econômica precisa dos R$ 10 bilhões previstos com as mudanças no IOF para fechar as contas públicas.
Uma audiência de conciliação entre as partes foi marcada pelo ministro do STF Alexandre de Moraes para terça-feira, 15. O magistrado suspendeu todas as decisões tomadas até agora. O imbróglio estremeceu a relação entre Lula e a cúpula do Congresso, principalmente com o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB).
Nessa queda de braço, uma campanha do PT nas redes sociais martelou que Lula quer cobrar mais tributos do “andar de cima”, chamado agora de BBB (Bilionários, Bancos e Bets), para levar adiante a proposta de isentar quem ganha até R$ 5 mil do Imposto de Renda. Monitoramentos feitos pelo Planalto indicaram que a tática foi bem-sucedida.
Na quarta-feira, 9, após Trump anunciar a taxação de 50% sobre produtos brasileiros e justificar a medida sob a alegação de que o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por tentativa de golpe não deveria ocorrer, Lula voltou a usar o boné com o slogan “O Brasil é dos brasileiros”.
Publicitário que comandou a campanha petista, em 2022, Sidônio completa seis meses à frente da Secom na segunda-feira, 14. Neste período, enfrentou uma crise atrás da outra, atuou como bombeiro, mas também comprou muitas brigas, até mesmo com Haddad.
O chefe da equipe econômica não queria, por exemplo, revogar a norma da Receita Federal que ampliava a fiscalização de transações financeiras, incluindo o Pix.
À época, um único vídeo do deputado Nikolas Ferreira (PL-MG), com informações distorcidas sobre a operação, ultrapassou 200 milhões de visualizações. Haddad resistiu muito antes de recuar, mas acabou vencido.
“Eu vim aqui para fazer um doutorado. Estou ministro hoje e amanhã posso não estar”, disse Sidônio ao Estadão. “Não tenho interesse político”.
Em janeiro, quando assumiu a Secom no lugar de Paulo Pimenta (PT) — que foi demitido por Lula e voltou para a Câmara dos Deputados —, o marqueteiro prometeu recuperar a aprovação de Lula e do governo em três meses. Não foi o que ocorreu.
Até agora, o chefe da Secom não conseguiu fazer com que Lula resgatasse a popularidade. Pior: o presidente perdeu apoio no Nordeste, região que sempre foi reduto eleitoral do PT, e entre os mais pobres.
Pesquisas em poder do Planalto indicam que Lula começou a se levantar, mas ainda de forma lenta. As sondagens também mostraram que, na opinião dos eleitores, ele precisa falar mais com a população.
Lula não quer aumentar o número de entrevistas, mas Sidônio insiste. “Sou uma pessoa determinada”, garante o ministro franzino, que não come doce, só toma café amargo, mas diz estar disposto a fazer do limão uma limonada.
Foram tantas as turbulências enfrentadas por Sidônio desde janeiro que seus auxiliares até fizeram uma planilha. Nela, contabilizaram 12 crises em seis meses: de boatos infundados sobre a taxação do Pix a descontos indevidos de aposentados do INSS, passando pelo preço dos alimentos e a queda do então ministro Juscelino Filho.
“Comunicação é sempre um desafio, mas o Sidônio tem experiência, sensibilidade e vai avançar mais ainda”, afirmou ao Estadão o vice-presidente Geraldo Alckmin, que também é ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
Se depender da oposição, no entanto, o ministro entregará os pontos. Irritados com postagens nas redes sociais que se referem ao Legislativo como “Congresso da mamata” e atacam Hugo Motta, deputados convocaram Sidônio para explicar as últimas campanhas da Secom.
O ministro garante que essas mensagens não têm a digital do Planalto e conseguiu adiar sua ida à Câmara para agosto, depois do recesso parlamentar. Até lá, o novo slogan do governo já deve estar na praça.
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