Por Flávio Chaves
Do Blog do Flávio Chaves
Marcos Vinicios Vilaça nos deixou ontem. Mas como aceitar que se vá alguém que sabia permanecer nos afetos, nas ideias e nos gestos? Como dizer adeus a um homem cuja presença iluminava com discrição e elegância os espaços mais diversos da vida brasileira?
Nascido em Nazaré da Mata, na Zona da Mata Norte de Pernambuco, Marcos foi um dos filhos mais ilustres da sua geração. Ministro do Tribunal de Contas da União, imortal da Academia Pernambucana de Letras e da Academia Brasileira de Letras, escritor, poeta, cronista, pensador. Um homem público de rara envergadura, que mesmo ocupando funções de grande relevo nacional, jamais se desvinculou de suas raízes. Suas palavras sempre voltavam ao chão da infância, aos coqueiros e canaviais, aos silêncios de Nazaré, onde tudo começou.
Marcos Vilaça era, acima de tudo, um homem de alma generosa. Uma figura rara, dessas que nos fazem acreditar que a inteligência pode, sim, andar de mãos dadas com a delicadeza. Sua presença nas causas da cultura era constante, solidária, comprometida. Tive a honra de tê-lo como amigo e confrade na Academia Pernambucana de Letras, de dividir com ele sonhos, lutas e esperanças. Nunca se ausentou quando precisei. Quando tentaram desconstruir os meus passos, lá estava ele, inteiro, ao meu lado, fraterno, firme, como um irmão maior que entendia o peso das batalhas travadas por quem não nasceu com privilégios.
Leia maisFomos conterrâneos de alma e chão. Ele, de Nazaré da Mata. Eu, de Carpina. Cidades irmãs, separadas por alguns quilômetros e unidas por uma mesma cultura vibrante, por um povo que resiste com fé e poesia.
Como escritor, Marcos deixou uma obra vasta e original. Livros como “Coronel, coronéis”, que traça um olhar crítico e irônico sobre os figurões do poder, e “Em torno da sociologia de caminhão”, onde a estrada vira espelho da alma nordestina, mostram sua verve afiada e sensível. Há também títulos como “Sargaços”, “O Coração do Brasil”, “Os Olhos do viajante”, “Nazaré das lembranças”, “Retábulo das confidências”, “No rastro da memória”, entre outros. Cada um desses livros é um relicário de observações sutis, de lirismo contido, de paixão pelas palavras e pelo Brasil profundo.
Marcos era um homem polido, elegante nos modos e na alma. Um intelectual múltiplo, que caminhava com naturalidade entre o saber jurídico, a crítica social e o encanto da literatura. Participou e foi homenageado em tantos momentos marcantes da vida cultural de Pernambuco, inclusive durante meu mandato à frente da União Brasileira de Escritores e da Associação da Imprensa de Pernambuco.
Guardo dele a memória viva de um amigo presente, afetuoso, que fazia da escuta um gesto nobre e do conselho, um ato de generosidade. Sinto sua ausência como se fosse o corte de uma árvore antiga no meio do campo. Fica o tronco, a sombra que ainda paira, os frutos que amadureceram por sua causa.
Agora, ele segue em direção à luz, ao encontro de sua amada Maria do Carmo, companheira de uma vida, e de seu filho querido, Marcoantonio. Que esse reencontro seja pleno de paz, envolto na mesma ternura que ele espalhou entre nós.
Meus sentimentos mais profundos à sua filha Taciana, a Mendonça Filho, a Rodrigo, aos netos, e a todos que o amaram. Pernambuco perde uma de suas vozes mais belas, mas ganha, para sempre, a permanência de uma alma encantada.
Marcos Vinicios Vilaça não se foi. Apenas mudou de plano. Agora, é memória viva, palavra eterna, saudade que floresce.
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