Por João Batista Rodrigues*
O Pleno do Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade do piso da enfermagem. Embora ainda não seja uma decisão de mérito, a publicação da decisão na segunda-feira (03/07), e da ata de julgamento (12.07), no bojo da ADI 7222, representa uma importante vitória para os profissionais da enfermagem.
No próprio voto médio que prevaleceu, os ministros Roberto Barroso e Gilmar Mendes anteciparam que, doravante, não será aceita a criação de despesas sem o devido apontamento das fontes de custeio e que novos pisos nacionais que venham a ser aprovados serão considerados inconstitucionais.
Leia maisNesse caso específico, o impacto anual é de mais de 10 bilhões de reais para os municípios, de acordo com os dados da CNM – Confederação Nacional de Municípios. No entanto, não está claro se os cálculos apresentados pela entidade levam em conta o impacto no aumento das contribuições previdenciárias patronais para o regime geral e regimes próprios de previdência, bem como os danos financeiros decorrentes do direito à paridade e integralidade dos profissionais da enfermagem já aposentados.
Na minha visão, e considerando a posição firme dos votos que não prevaleceram, o piso da enfermagem teria sido considerado inconstitucional se não se tratasse dos profissionais de enfermagem, que têm ampla simpatia popular. No entanto, algumas condicionantes foram estabelecidas para sua aplicação.
Para os servidores da União, o piso se aplica de imediato, de acordo com a Lei nº 14.434/2022, o que é justo, uma vez que foi a União, pode meio do seu parlamento, que criou essa despesa.
Para os servidores dos Municípios, Estados e profissionais contratados por entidades privadas que atendam, no mínimo, 60% de seus pacientes pelo SUS, ficou definido que
“a) a implementação da diferença remuneratória resultante do piso salarial nacional deve ocorrer na extensão do quanto disponibilizado, a título de assistência financeira complementar, pelo orçamento da União (art. 198, §§ 14 e 15, da CF, com redação dada pela EC nº 127/2022);
b) eventual insuficiência da assistência financeira complementar mencionada no item (ii.a) instaura o dever da União de providenciar crédito suplementar, cuja fonte de abertura serão recursos provenientes do cancelamento, total ou parcial, de dotações tais como aquelas destinadas ao pagamento de emendas parlamentares individuais ao projeto de lei orçamentária destinadas a ações e serviços públicos de saúde (art. 166, § 9º, da CF) ou direcionadas às demais emendas parlamentares (inclusive de Relator-Geral do Orçamento). Não sendo tomada tal providência, não será exigível o pagamento por parte dos entes referidos no item (ii)” (Decisão de Julgamento ADI 7222).
Assim, Estados e Municípios passam a ser obrigados a pagar o piso da enfermagem, levando em consideração os valores atualmente praticados por eles, acrescido dos valores complementados pela União. Desses últimos valores, devem ser descontados os acréscimos nas obrigações patronais resultantes da implementação do piso da enfermagem, considerando-os como despesas com os profissionais da enfermagem, assim como acontece com as contribuições patronais decorrentes da folha de professores que podem ser arcadas com recursos provenientes do FUNDEB.
Para os servidores dos hospitais e serviços de saúde particulares, a implementação do piso salarial nacional depende de acordo no prazo de 60 dias a partir da publicação da ata de julgamento (06/07). Caso não haja acordo nesse prazo, o piso deve ser pago conforme a lei.
Por fim, outra condicionante importante é que o pagamento do piso salarial deve ser proporcional nos casos de carga horária inferior a 8 horas por dia ou 44 horas semanais. Por exemplo, um enfermeiro cujo piso corresponda a R$ 4.750 (quatro mil e setecentos e cinquenta reais) e trabalhe 30 horas deverá receber o valor mínimo proporcional a essa carga horária, ou seja R$ 3.238,63 (três mil e duzentos e trinta e oito reais e sessenta e três centavos) ficando a União responsável por providenciar os repasses determinados nessas situações.
Dessa maneira, a fim de garantir o cumprimento da decisão judicial, os gestores municipais devem providenciar a organização do seu quadro de Enfermeiros, Técnicos e Auxiliares de Enfermagem, informando corretamente os dados desses profissionais ao Ministério da Saúde, inclusive os contratados e terceirizados. Isso permitirá que a União forneça os recursos necessários para o pagamento conforme determinado, ressaltando a importância de que Prefeitos, Profissionais de Enfermagem e Governadores busquem o apoio necessário para normatização de uma fonte de custeio permanente para essa despesa. Nesse sentido, o movimento municipalista defende a inclusão de um acréscimo de 1,5% no Fundo de Participação dos Municípios (FPM) como a melhor forma de garantir a sustentabilidade financeira dessa demanda.
*Advogado, ex-prefeito de Triunfo, ex-presidente da União dos Vereadores de Pernambuco – UVP, secretário da Comissão de Direito Municipal da OAB/PE.
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