Além da Contag e do Sindnapi, o instituto também optou por não acionar outras duas organizações: a Conafer (Confederação Nacional dos Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais) e a ABCB (Associação Brasileira de Consumidores e Beneficiários).
O Sindnapi tem como vice-presidente o sindicalista José Ferreira da Silva, o Frei Chico. Ele é irmão mais velho do presidente Lula (PT).
As quatro entidades poupadas das ações estão citadas diversas vezes no relatório da Controladoria-Geral da União (CGU) sobre o tema. Aparecem também nas investigações da Polícia Federal (PF), que resultaram na operação Sem Desconto, deflagrada em abril deste ano.
Na resposta ao pedido da oposição via LAI, o INSS também negou acesso ao processo administrativo que embasou a decisão de excluí-las das medidas judiciais.
As ações foram apresentadas pela Advocacia-Geral da União (AGU), mas a escolha de quem seria processado coube ao INSS. No mês passado, a Justiça determinou o bloqueio de bens de alguns dos investigados, totalizando R$ 2,8 bilhões.
Procurado, o INSS afirmou, em nota, que “as investigações (contra entidades e pessoas envolvidas) continuam” e que “não há impedimento para que novos processos de responsabilização sejam instaurados para outras entidades”, desde que “surjam elementos que justifiquem tal apuração” (leia mais abaixo).
O instituto, no entanto, não explicou por que não incluiu essas quatro organizações nas ações já em curso.
Contag e Sindnapi arrecadaram mais de R$ 500 milhões do INSS
Entre os investigados na “Farra do INSS”, Contag e Sindnapi estão entre os que mais se beneficiaram dos descontos aplicados aos aposentados. Uma das maiores entidades do setor, a Contag recebeu cerca de R$ 435 milhões até maio do ano passado — a maior arrecadação desse tipo entre os alvos da apuração.
Já o Sindnapi recebeu outros R$ 77,1 milhões. Segundo o relatório da CGU, a entidade não conseguiu apresentar a documentação completa de nenhum associado dentro de uma amostra aleatória selecionada pelo órgão.
Em processos e sites de reclamações, beneficiários relataram que os descontos começaram após tentarem contratar empréstimos nas lojas Help!, ligadas ao banco BMG.
O aumento dos repasses ao Sindnapi coincide com o enriquecimento do presidente da entidade, o sindicalista Milton Baptista de Souza, o Milton Cavalo.
Entre 2021 e 2023, ele construiu uma mansão de cerca de 360 metros quadrados, com piscina, em um sítio em Ibiúna, no interior de São Paulo. Procurado, o Sindnapi confirmou que o imóvel pertence a Cavalo, mas afirmou que a propriedade e suas benfeitorias foram feitas com recursos lícitos.
Apesar disso, o sítio — batizado de “Recanto Double Horse” — não está registrado em nome do sindicalista nem de seus familiares.
INSS: nada impede a abertura de novas ações
Em nova manifestação, o INSS disse que os processos foram abertos com base na Lei Anticorrupção e que as apurações continuam em andamento. O órgão reiterou que “o Governo Federal não tem qualquer restrição à abertura de Processos Administrativos de Responsabilização (PAR) contra nenhuma entidade”.
Leia abaixo a íntegra da nota do INSS:
“Foram abertos Processos Administrativos de Responsabilização (PAR) de pessoas jurídicas com base na Lei Anticorrupção contra associações que constaram na Operação Sem Desconto como pagadoras de propina a agentes do INSS, bem como, aquelas tidas como fantasmas e que não tinham condições mínimas para sua existência.
As investigações continuam para se detectar se outras instituições também se enquadram nos casos previstos na Lei Anticorrupção. Portanto, não há impedimento para que novos processos de responsabilização sejam instaurados para outras entidades desde que surjam elementos que justifiquem tal apuração.
O Governo Federal não tem qualquer restrição à abertura de Processos Administrativos de Responsabilização (PAR) contra nenhuma entidade”.
Leia abaixo a íntegra da nota da AGU:
“A Advocacia-Geral da União ajuizou 15 medidas cautelares, pleiteando o bloqueio de bens móveis e imóveis na ordem de R$ 2,8 bilhões contra 12 entidades associativas, seis consultorias, dois escritórios de advocacia e três outras empresas, além de sócios e dirigentes de todas as instituições investigadas por descontos irregulares realizados em benefícios de aposentados e pensionistas segurados do Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
Pesam sobre as entidades fortes indícios de terem sido criadas com o único propósito de praticar a fraude (entidade de fachada), com sua constituição utilizando “laranjas”, bem como de servirem como intermediárias ao pagamento de vantagem indevida a agentes públicos para autorizarem os descontos indevidos.
Em desfavor das entidades que compõem o polo passivo das medidas cautelares, houve a instauração de Processos Administrativos de Responsabilização (PARs), considerando a existência de material probatório robusto da prática de atos de corrupção como definido na Lei nº 12.846/2013, sendo este o recorte utilizado para o escopo da providência judicial. Os PARs foram instaurados pelo INSS e avocados pela Controladoria-Geral da União (CGU). Portanto, hoje a competência para apuração dos PARs é da CGU.
A representação judicial no que diz respeito ao ajuizamento de ações depende de provocação por parte da autarquia ou fundação pública federal que pretende ajuizar determinada ação judicial. No contexto da indagação que ora se responde, portanto, a atuação da PGF e da PGU se dá sob demanda do INSS e da CGU, quanto à adoção de medidas judiciais voltadas ao ajuizamento de ação civil pública por ofensa à Lei Anticorrupção.
A proposição de ação judicial pela AGU encontra-se nos limites de suas atribuições e se baseou nas informações enviadas até o presente momento pelo INSS, com os complementos indicados pela CGU. Novos elementos poderão ensejar o ajuizamento de novas ações judiciais”.
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