O presidente Lula tinha um plano: depois de semear na primeira metade do mandato, ele finalmente iniciaria a colheita em 2025. Programas prioritários do governo deslanchariam e cairiam no gosto popular, principalmente na área da saúde. O pessimismo com os rumos da economia seria revertido com uma série de medidas, do prometido combate à inflação dos alimentos à injeção direta de recursos no bolso dos trabalhadores. Uma renovação de acordos políticos com partidos de centro fortaleceria a posição do mandatário no Congresso e, de quebra, a sua eventual candidatura à reeleição.
A combinação desses fatores garantiria o sucesso da safra, que seria coroada com a recuperação de uma popularidade que derreteu na virada do ano. O roteiro era claro e otimista, mas até agora quase nada saiu como planejado. Para piorar, o petista passou a lidar com um velho fantasma: a corrupção, que voltou à agenda nacional com o escândalo dos descontos ilegais de benefícios pagos a aposentados e pensionistas pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Por mais que se esforce, Lula ainda terá de remar muito contra a maré. As informações são da Revista Veja.
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O desafio mais imediato é o caso do INSS, que envolve roubo a pessoas consideradas vulneráveis, revela omissão e incompetência do governo e tem forte apelo popular. No último dia 23, a Polícia Federal (PF) e a Controladoria-Geral da União (CGU) deflagraram uma operação para combater um esquema nacional que descontava valores de aposentadorias e pensões sem a autorização dos segurados e repassava os recursos para sindicatos e entidades de classe que dizem representá-los.
De acordo com as investigações, 6,3 bilhões de reais foram descontados entre 2019 e 2024, mas ainda não se sabe quanto de forma ilegal — ou seja, sem concordância prévia. Uma pequena amostragem citada pelas autoridades dá uma noção do tamanho do problema: de 1 300 casos analisados, 97% registraram irregularidades, como assinaturas fraudadas. Os descontos são de pequenas quantias no caso individual de cada aposentado e pensionista, mas somados encheram os caixas de entidades de classe.
Tanto que houve uma ordem judicial para o sequestro de bens de cerca de 1 bilhão de reais como forma de garantir eventuais reparações. Conforme as investigações, só um operador do esquema repassou 7,5 milhões de reais a pessoas e empresas ligadas ao procurador-geral do INSS, Virgílio Antonio Ribeiro de Oliveira Filho, que foi afastado do cargo.
Pelas regras atuais, os sindicatos e associações assinam um acordo de cooperação com o INSS que permite o desconto de valores, desde que autorizado, em troca de alguns benefícios para aposentados e pensionistas, como auxílio jurídico e assistência médica. O modelo começou a funcionar no governo de Michel Temer, ganhou tração na gestão de Bolsonaro, quando a totalidade de descontos (legais ou não) superou 700 milhões de reais, e explodiu na gestão Lula, ultrapassando a casa de 2 bilhões de reais. Independentemente da origem, a bomba explodiu no colo do petista.
Não bastasse isso, uma das onze entidades que foram alvo de medidas judiciais na ação realizada por PF e CGU, o Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos, tem como diretor, desde 2008, e como vice-presidente, desde o ano passado, Frei Chico, irmão do presidente da República.
Ele não é investigado, mas o dado inflamou ainda mais o ânimo da oposição, que protocolou na quarta 30 o pedido para abertura de uma CPI sobre o caso. “Frei Chico está em evidência apenas por seu parentesco com o presidente Lula. Trata-se de pura politicagem eleitoral, que engana muita gente de boa-fé”, reagiram os presidentes de seis centrais sindicais em nota.
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